Ao sair do consultório de Helena, Daniel respirou fundo. Pela primeira vez em dias — talvez em meses — sentiu o ar entrando nos pulmões sem parecer ácido. Era como se o corpo, tão acostumado ao modo sobrevivência, estranhasse aquele novo estado: o de não estar em guerra consigo mesmo.
Estava longe de estar bem. Mas, pela primeira vez, não precisava fingir que estava. E isso já era um alívio quase sagrado.
Caminhou pelas ruas da cidade com passos menos tensos, embora os ombros ainda carregassem um peso ancestral — culpa, abandono, autossabotagem. Tudo isso ainda estava lá. Mas havia um novo elemento: intenção.
Parou numa cafeteria pequena, escondida entre duas lojas antigas. O cheiro de café forte e bolo de fubá recém-assado trouxe uma lembrança involuntária: ele, criança, ouvindo o pai brigar ao telefone enquanto a mãe calava as mágoas na cozinha, assando bolos como quem tentava costurar o que já vinha rompido.
Pediu um espresso duplo. Quente. Amargo.
Precisava sentir alguma coisa rea