Capítulo 1 - Chloe Brooks

Dias atuais

Estava encostada no batente da porta, que ficava nos fundos da boate, observando as meninas dançarem no palco. Minha mãe, garçonete do local, passava de um lado para o outro, servindo as mesas. Ela havia emagrecido consideravelmente, sabia que tinha algo de errado, mas ela não me falava nada, a depressão a consumiu, só ficava sóbria durante o trabalho, mas saía direto para fumar.

Com apenas 17 anos, eu ajudava minha mãe com as contas, trabalhando em uma cafeteria enquanto cursava administração na faculdade, graças a uma bolsa, que cobria boa parte das mensalidades. Nossa vida era simples, mas feliz, em um pequeno apartamento no subúrbio de Londres. Eu levava Elena à escola e ia direto para a faculdade; minha mãe a buscava mais tarde. Até que, um dia, meu celular vibrou no bolso. Um número desconhecido apareceu na tela e, por um instante, o medo me dominou. Mas, com certa hesitação, resolvi atender.

— Boa tarde, eu falo com Chloe Brooks? 

Uma voz feminina pergunta do outro lado.

— Quem está falando? — Questiono, já com medo do que possa ser.

— Falo da emergência do Hospital Geral St. Thomas. A senhora Scarlett Brooks foi trazida para cá, e sua irmã nos passou seu telefone para contato.

E essas palavras me deixaram sem chão. Senti meu corpo gelar, como se o tempo tivesse parado. A tensão me invadiu, e enfim, tive a certeza que minha mãe estava escondendo algo importante. Sentei-me no banco mais próximo, tentando processar o que estava acontecendo. Minha chefe veio correndo, preocupada, tirou o telefone de minhas mãos e começou a conversar com a pessoa do outro lado da linha.

— Sua mãe não está bem, Chloe. Vamos, eu te levo ao hospital.

Eu precisava ser forte para elas, então respirei fundo e contive as lágrimas. No hospital, vou direto à recepção e consigo permissão para entrar. Elena estava sentada em uma sala com uma enfermeira ao lado, seu olhar preocupado me dizendo que algo estava muito errado.

— Elena, o que houve?

— Eu e a mamãe saímos da escola, estávamos indo embora para casa, de repente ela se sentiu mal e pediu para sentar. Estava ajudando-a, quando desmaiou e caiu de uma vez. Tentei segurá-la mana, mas não consegui.

Elena começa a chorar, agacho-me em sua frente, dou-lhe um abraço e asseguro:

— Não foi culpa sua, minha linda! Você fez o que pôde e está tudo bem. A mana vai ver como a mamãe está, fica quietinha aqui, tá bom?

— Pode ir Chloe. Eu fico com ela.

— Obrigada, dona Vera!

Agradeço à minha patroa por ter se oferecido para cuidar da minha irmã. Sigo a enfermeira até uma sala onde o som de vários bips ecoa. Por um momento, eu paraliso à porta, não consigo entrar, mas respiro fundo e dou um passo à frente. Vejo um médico com uma prancheta nas mãos, fazendo anotações.

Ele percebe a minha presença e vem até o local onde estou, me indicando uma cadeira para sentar-me.

— Por favor, sente-se aqui. Sou o Doutor Jullian Muller, cirurgião e oncologista do hospital.

— Oncologista?? — paro de falar, aquela informação me pega desprevenida. — O que minha mãe tem, doutor?

— Percebo que ela não conversou com você. Bom... Chloe, sua mãe tem câncer hepático [1]em estágio avançado. Vínhamos tratando já algum tempo com medicamentos via oral, para quimioterapia. Mas como ela continuou a beber, infelizmente, tudo o que fizemos não teve o resultado esperado.

— Espera, o senhor está dizendo que minha mãe... — Minha voz falha, e sinto um aperto no peito. — Ela não tem salv.... — As palavras não saem, e eu sinto as lágrimas começando a se formar nos meus olhos.

— Sinto muito, Chloe. Manteremos ela aqui no hospital, apenas para o tratamento paliativo, garantindo que não sinta dor ou desconforto. Nesse estágio as visitas estão liberadas para a família, você pode vir a qualquer momento que desejar.

— Ela não vai mais voltar para casa, não... ― Balanço a cabeça em movimento de negação, o desespero, enfim tomando conta de mim. — Ela estava bem, ontem trabalhou o dia todo. Hoje mesmo, acordou e fez nosso café da manhã... O senhor deve estar enganado, doutor. Minha mãe não vai morrer… ela não pode nos deixar....

— Desculpe, por ter que dar essa notícia dessa forma. Mas não quero lhe dar falsas esperanças.

Me levanto dali e entro naquela sala fria, com aquele barulho irritante que não cessa. Vejo minha mãe deitada em uma cama estreita, com alguns fios conectados junto à sua pele amarelada. Lembro-me de sempre achar estranha ela ter aquela cor, mas por ser leiga demais no assunto, achava que era pelo motivo de não estar se alimentando corretamente.

Meu corpo parece ter vida própria, e eu não consigo mais controlá-lo. Encosto-me na parede branca e, lentamente, vou deslizando até me encolher em posição fetal. Abraço minhas pernas e, ali, deixo que as lágrimas fluam livremente. A dor é avassaladora. Éramos só nós três, minha mãe, minha irmã e eu, lutando juntas, nos apoiando mutuamente. Agora, sinto que tudo está desmoronando. Seremos apenas eu e Elena, minha irmã, uma criança que já sofreu tanto... Como lidaremos com isso?

Sinto uma mão acariciar meus cabelos. A pessoa se inclina e coloca a mão sobre a minha:

— Você precisa ser forte agora, Chloe. Tem uma garotinha que precisará muito do seu apoio.

— E eu, quem vai me apoiar? Minha mãe era tudo o que eu tinha… — fungo, ainda chorando. — Como continuarei sem ela?

— Eu entendo o seu desespero e medo, sei também que não será fácil. Mas sua mãe tentou, isso já foi um grande passo. Infelizmente, agora ela precisa descansar.

Levanto a cabeça e olho para o doutor, que está à minha frente, me dando forças e tentando me fazer entender o quanto minha mãe precisava de descanso. Mesmo que a dor fosse enorme, eu precisava respeitar, por mais difícil que seja, teria que ser forte. Enxugo as lágrimas e me levanto. Olho novamente para a minha mãe, que continua estática, pego em sua mão fina e digo:

— Mamãe, desculpa não perceber antes. Eu prometo que cuidarei bem da Elena, darei todo o amor e cuidado que ela precisa. — Minha voz treme enquanto as lágrimas voltam a inundar meus olhos, pisco para tentar afugentá-las, mas elas não me obedecem e teimam em cair pelo meu rosto. O que posso prometer naquele momento, é que tentarei ser forte, igual ela sempre foi, e cuidar da pequena Ele, como ela sempre cuidou de nós.

[1] Câncer hepático, também conhecido como câncer de fígado, é um tumor maligno que se desenvolve nas células do fígado. Pode ser primário, quando se inicia no próprio fígado, ou secundário, quando se espalha de outro órgão para o fígado. O tipo primário mais comum é o carcinoma hepatocelular (hepatocarcinoma).

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