Capítulo 53LunaChiara estava ajoelhada no centro da sala principal da mansão, rodeada por mapas desdobrados, plantas da Fazenda Azul e fotografias tiradas por drones durante o reconhecimento. Seus dedos ágeis traçavam rotas com uma caneta vermelha, marcando pontos estratégicos de entrada e possíveis rotas de fuga. Rafael, ao lado dela, falava rápido com dois agentes infiltrados que haviam retornado com novas informações direto do campo.— Três entradas principais, mas duas são armadilhas óbvias — disse Rafael, apontando para os portões laterais com a ponta de um bastão metálico. — Cheias de sensores de movimento, câmeras com infravermelho e cobertura aérea com drones autônomos. Um erro e viramos alvo.Chiara assentiu, sem desviar o olhar dos mapas.— A única brecha é por trás. Uma antiga trilha de acesso à casa principal, quase apagada no meio da mata. Aparentemente esquecida, mal monitorada, com apenas uma câmera estática. Vai ser estreito. Vamos ter que ir a pé, silenciosos. E ráp
Capítulo 54LunaÀs 2h47 da madrugada, deixamos os portões da mansão de Dante em silêncio absoluto, como sombras deslizando pela noite. Não havia música. Não havia conversa. Apenas o som abafado dos motores e a respiração contida de cada um. Dois carros e um caminhão de apoio cortavam as ruas de São Paulo como fantasmas determinados. Os comunicadores foram testados três vezes antes da partida. Os mapas, verificados e memorizados. Cada rota alternativa desenhada com precisão cirúrgica. Cada função, repetida como um mantra.Rafael estava ao volante do carro da frente, os olhos fixos no caminho à frente como se cada segundo pudesse ser o último em segurança. Chiara ao lado dele, com o tablet nas mãos, monitorava os dados captados por um dos drones que havia sobrevoado a região da tal Fazenda Azul nas últimas vinte e quatro horas. Atrás deles, em outro carro discreto, seguiam os dois agentes de confiança que Rafael havia recrutado. E, por fim, o caminhão de apoio, com equipamentos, máscar
Capítulo 55LunaA entrada pela trilha foi rápida, quase silenciosa demais para os batimentos acelerados que preenchiam meu peito. Rafael ficou com Mariana num ponto alto da mata, estrategicamente posicionado para oferecer visão ampla de parte da estrutura, mas também para protegê-la de qualquer investida. Ela não discutiu. Havia maturidade em seus olhos agora, como se, depois de tudo, Mariana tivesse deixado de ser só uma sobrevivente para se tornar algo mais — alguém que sabia o peso do mundo e ainda assim decidia enfrentá-lo.Dante seguiu à frente, seus passos calculados, mas sem hesitação. Chiara vinha logo atrás, com o tablet nas mãos, pronta para interceptar qualquer sinal. Os dois agentes fechavam a retaguarda, atentos a cada som, a cada movimento entre os galhos. Eu, no meio, sentia o coração batendo nas costelas como um tambor de guerra.As sombras da madrugada eram densas, úmidas, quase palpáveis. A floresta sussurrava ao redor, mas mesmo a natureza parecia segurar a respira
Capítulo 56LunaCom os reféns libertos e as provas reunidas, fotos tiradas às pressas, vídeos capturados em câmeras pequenas e silenciosas, documentos empilhados nas mochilas, iniciamos o recuo. Em silêncio. Cada passo carregava o peso do que havíamos testemunhado e, mais do que isso, o que decidimos enfrentar. A escuridão da mata parecia mais espessa ao voltarmos, como se o mundo soubesse o que tínhamos arrancado daquelas paredes. Como se a própria terra estivesse prestes a rugir de volta.Rafael ficou para trás apenas por alguns minutos, garantindo que não deixássemos rastros. Chiara e os agentes iam à frente, atentos aos sinais. Dante cobria a retaguarda, os olhos atentos, a arma ainda firme nas mãos. E eu caminhava no meio do grupo, sem dizer nada, mas sentindo cada batida do coração como um grito abafado dentro do peito. A adrenalina ainda não tinha passado. Nem passaria tão cedo.Mariana nos esperava no ponto de encontro, no alto de uma clareira escondida pela mata espessa, ond
Capítulo 57LunaO portão da mansão se fechou atrás de nós com um estalo surdo, pesado. Era o som de um abrigo temporário, de um porto seguro onde podíamos, ao menos por algumas horas, respirar sem olhar por cima do ombro.A noite ainda nos envolvia, mas o céu começava a clarear no horizonte. Um tom violeta se misturava às sombras, como se o próprio mundo estivesse exalando o fôlego que segurou junto conosco durante toda a operação. Lá fora, o caos ainda nos rondava, mas aqui dentro, tudo parecia em suspensão. Silêncio. Alívio. Exaustão.Mariana saiu do carro primeiro. Seus passos estavam lentos, como se cada músculo ainda estivesse preso aos corredores úmidos da Fazenda Azul. Chiara a seguiu de perto, levando uma mochila com os poucos pertences que ela havia trazido.— Vou levar ela pro quarto — Chiara disse baixinho, e eu assenti.Mariana não disse nada. Me lançou um olhar breve, mas profundo, e nele havia tanta coisa... dor, gratidão, e algo que eu ainda não conseguia nomear. Talve
Capítulo 58DanteQuando me levantei Luna ainda dormia. E pela primeira vez em muito tempo, hesitei antes de sair da cama. Meu mundo sempre foi feito de acordos sujos, balas silenciosas e lealdades compradas a preço de sangue. Nunca houve espaço para algo puro ali dentro.Mas ela era.Pura no modo como enfrentava os próprios demônios. Pura no olhar que lançava até mesmo quando tudo ao redor era podridão. Pura... mesmo depois de sujar as mãos. Ou talvez por isso mesmo.Observei seu rosto por um instante. Os cabelos bagunçados sobre o travesseiro, a boca entreaberta, a expressão serena de quem finalmente dormia sem medo. Quis guardar aquilo. Engarrafar. Levar comigo quando o mundo voltasse a ser cinza.Porque voltaria.E mais rápido do que eu gostaria.Desci para a sala principal e encontrei Rafael revisando alguns relatórios, com olheiras profundas e uma xícara de café tão forte que parecia capaz de ressuscitar os mortos.— Alguma novidade? — perguntei, me aproximando.Ele balançou a c
Capítulo 59LunaO céu estava cinza, mesmo com o sol alto. Uma bruma fina cobria a cidade como se soubesse o que estava por vir. Era uma tarde silenciosa demais. Chiara tinha me dito que, quando tudo parece calmo demais nesse mundo, é porque algo grande está prestes a explodir.E ela estava certa.O silêncio estava prestes a ser substituído por gritos, tiros e fumaça.Estávamos em uma sala pequena, no subsolo da mansão, onde reuniões mais restritas aconteciam. Eu, Dante, Chiara e Rafael analisávamos os pontos de movimentação recentes de Rivas quando o telefone dele tocou. Dante atendeu de imediato, e em segundos seu rosto mudou.Aquela expressão dura, fria, quase inabalável, se partiu em mil fragmentos de tensão. Ele não falou muito. Apenas escutou. Seus olhos, tão afiados, agora pareciam correr por pensamentos que só ele entendia. Quando desligou, ainda com o celular colado à mão, ergueu-se com a gravidade de quem sabia que o inferno tinha acabado de ser aberto.— Recebemos um alerta
Capítulo 60LunaA fumaça do Armazém Três ainda parecia presa nos meus cabelos, mesmo depois de três banhos. O cheiro da guerra tem uma forma estranha de se agarrar à pele. É como se o corpo soubesse que agora pertence a outro mundo, e tentasse avisar que nunca mais será o mesmo.Voltar para a mansão naquela noite foi como atravessar um espelho. Uma parte de mim ficou naquele chão coberto de estilhaços e sangue seco. A parte que hesitava, que fingia que era possível estar entre eles sem ser deles.Não era mais.A mulher que calculava planilhas agora calculava mortes.O ataque ao armazém foi mais do que uma ofensiva. Foi um recado de Rivas: ele sabia onde atingir, sabia o que nos importava. E, principalmente, sabia que Dante estava vulnerável. Comigo ao lado dele, ele não podia se esconder tanto quanto antes.Mas ele não recuou. Nem por um segundo.Na manhã seguinte, enquanto a cidade despertava indiferente à guerra que explodia em suas sombras, Dante já havia montado o plano de contra