VITTORIO NARRANDO
A fumaça do charuto desenhava espirais lentas no ar enquanto eu observava a cidade do alto do meu escritório. O vidro refletia a minha imagem distorcida, e por um instante, era como se eu me visse criança de novo, sentado num canto da sala, ouvindo meu pai bater com o punho na mesa e falar sobre sangue, poder e legado.
Eu aprendi cedo que amor e lealdade não pertencem ao mesmo lugar. Amor cega. Lealdade mantém o reino de pé.
Talvez por isso, até hoje, eu nunca tenha perdoado meu irmão.
— O senhor está ouvindo, Morelli? — a voz de Salvatore, um dos conselheiros mais antigos da Famiglia, me tirou dos devaneios. Ele estava sentado na outra ponta da mesa de reunião. Os olhos pequenos e atentos, como os de um rato.
— Ouvir é tudo o que eu faço — respondi, tirando o charuto da boca com lentidão. — Falar demais é que mata.
Os outros homens riram, com aquele riso contido de quem sabe que um comentário fora do lugar pode custar a língua. Mas Salvatore não riu. Apenas p