O avião cortou as nuvens com a suavidade de um segredo bem guardado. Lá embaixo, o azul do Lago de Como cintilava como se tivesse sido polido à mão por alguma divindade italiana entediada. Era difícil acreditar que, em algum lugar entre aquelas montanhas e espelhos d’água, estava a palavra que eu vinha evitando há meses: lar.
Santino dormia com a cabeça encostada no meu ombro, o carrinho de ferro seguro na mão, amuleto inseparável. Enzo, ao meu lado, observava a paisagem pela janela, o maxilar relaxado pela primeira vez em muito tempo. Quando o avião começou a descer, ele virou o rosto para mim e disse, baixo, quase num sussurro que parecia uma promessa:
— Bem-vinda a Bellagio.
A frase ficou flutuando no ar, como se o próprio lago tivesse parado para ouvir.
O carro serpenteou por uma estrada de paralelepípedos que parecia saída de um cartão-postal. As flores desciam pelas varandas em cascatas de vermelho e amarelo. Sinos soavam de uma igreja distante, e o ar tinha cheiro de pão rec