Mundo de ficçãoIniciar sessãoEu não sabia exatamente o que era mais irritante: o fato de ter passado três dias inteiros evitando Noah… ou o fato de que ele parecia perceber cada milímetro dessa minha fuga.
E perceber demais.Três dias de silêncio.
Três dias desviando do mesmo corredor. Três dias fingindo que não notei quando ele olhou direto pra mim na biblioteca — e eu virei o rosto tão rápido que quase quebrei o pescoço.Ridículo. Eu estava ridícula.
Mas ainda assim… continuei.
A cena da menina com ele do lado de fora do campus ainda queimava atrás das minhas pálpebras quando eu piscava. Não era ciúme. NÃO era. Era só irritação. Ele podia ser arrogante, bruto, implicante, mas… tinha limites. E vê-lo encostado numa garota qualquer me deixou desconfortável. Só isso. Constrangimento, vai. Nada além disso.
— Você tá fugindo dele — Val constatou, sem nem olhar pra mim. A gente estava sentada num banco do campus, numa tarde ensolarada demais pro meu humor.
— Eu não tô fugindo de ninguém — rebati.
Ela arqueou a sobrancelha, do jeito que só a Val faz quando sabe que pegou você no pulo.
— Aham. E eu odeio café. — Ela revirou os olhos. — Vai, continua mentindo pra gente, é divertido.
Bianca, esparramada do meu outro lado, soltou um suspiro dramático.
— Não é óbvio? Ela e o Noah tiveram algum rolo secreto. Ele deve ter feito alguma coisa. Ou ela. Ou os dois. — Ela estreitou os olhos. — Talvez eles—
— Para — interrompi, apertando a ponte do nariz. — Não tem rolo nenhum.
Bianca deu uma risada curta.
— Claro. Você fica vermelha toda vez que alguém fala o nome dele por pura coincidência genética.
Lia, calma como sempre, apenas observava. Ela era o tipo de pessoa que absorvia tudo e falava pouco, mas quando abria a boca… acertava.
— Éris. — Ela disse meu nome com simplicidade. — Você não olha na direção dele há dias. E isso não é normal pra você.
Travei.
Elas estavam me irritando. O que significava que estavam certas.Mordi o lábio, inquieta.
— Eu só… preciso de espaço — murmurei.
Val bufou.
— Espaço de quê? De um cara com quem você briga desde a primeira semana de aula?
— Sim, Val. De exatamente isso.
Bianca se inclinou pra frente, arregalando os olhos como se estivesse prestes a anunciar um segredo nacional.
— Gente. Será que… — ela diminuiu a voz — …ela viu ele com outra?
Eu quase engasguei com o ar.
— QUÊ? Não! Bianca, pelo amor de Deus—
Mas Val arregalou os olhos e deu aquele sorriso malicioso.
— Então viu.
— Não vi nada! — respondi rápido demais.
Elas me encararam. As três. Aquele silêncio irritante que só os amigos conseguem fazer.
Meu rosto queimou. Eu sabia que queimou.
E elas sabiam também.Bianca bateu palma, como se tivesse resolvido um crime.
— Eu sabia! Vi nos seus olhos! Ele tava com alguém e te deu um treco.
— Não me deu treco nenhum — rosnei, mas minha voz saiu fraca.
Val cruzou os braços.
— E o pior é que você tá negando como se a gente fosse burra.
Eu abri a boca pra responder — mas não deu tempo.
Porque alguém parou bem atrás da gente.
E o ar ao meu redor mudou. Ficou mais denso.
Mais quente. Mais… irritante.Meu estômago afundou.
Não.
Não agora.
Eu não precisava olhar pra saber quem era. Meu corpo reconheceu antes da minha cabeça admitir.
A voz veio baixa, áspera, carregada de uma paciência inexistente:
— Você tem algum motivo pra estar me ignorando?
Me virei devagar.
Noah estava parado ali. Com a camiseta preta colada no peito, o cabelo bagunçado, aquele olhar irritado… e ainda assim tão afiado que parecia atravessar minha pele.As amigas ficaram em silêncio.
Três estátuas observando uma bomba prestes a explodir.Respirei fundo.
Me preparei pra não tremer. E respondi:— Não estou te ignorando.
O maxilar dele travou.
— Três dias, Éris.
— Coincidência — dei de ombros.
Val soltou uma risadinha.
Noah lançou um olhar mortal pra ela, mas voltou imediatamente pra mim.— Eu não sou idiota.
— Eu também não — rebati.
Ele deu um passo à frente.
Eu dei um pra trás.Merda.
Péssima ideia. Ele notou.Um sorriso curto apareceu no canto da boca dele — irritante, provocador, quase… quente.
— Então por que tá fugindo? — ele perguntou baixo demais. — Me fala.
— Não tenho nada pra te dizer.
— Tem, sim.
Eu senti algo estremecer dentro de mim.
Não era raiva. Ou talvez fosse. Mas tinha outra coisa misturada. Algo que eu não queria nomear.Lia, obviamente percebendo tudo, decidiu intervir antes que a gente se matasse ali mesmo.
— Noah — ela chamou, com delicadeza. — Você quer conversar com ela a sós?
Bianca deu um pequeno gritinho:
— SIM! ELE QUER!
Val revirou os olhos, mas levantou do banco.
— A gente dá uns cinco minutos. — Ela olhou pra mim. — Só cinco. Se ele te irritar demais, grita.
As três deram passos pra trás, devagar, observando como se estivessem deixando dois animais selvagens se encararem.
Quando nos deixaram sozinhos, Noah soltou um suspiro pesado.
— Elas são… intensas.
— Bem-vindo ao meu mundo.
— Prefiro quando elas não ficam inventando coisas.
Minha garganta apertou.
— Elas só… observam.
Por um segundo, ele me analisou.
Como se estivesse montando um quebra-cabeça do qual eu não fazia ideia.— Então elas observaram que você tava me evitando. — Ele aproximou um pouco. — E por quê?
— Já falei que não—
— Não mente pra mim — ele cortou, a voz baixa, firme.
Meu corpo esquentou.
O jeito que ele falou mexeu comigo de um jeito que eu não queria admitir. E ele percebeu.Os olhos dele desceram pro meu pescoço, depois voltaram pros meus.
— Éris — ele murmurou. — Fala comigo.
— Eu… — engoli em seco — …não gostei do que vi.
Silêncio.
Pesado. Tenso.— Do que você viu? — ele perguntou lentamente.
Pronto. Agora era a parte em que eu dava com a cara no asfalto por ter aberto a boca.
— Nada demais — tentei encerrar.
Mas Noah… ah, ele não deixava nada passar.
Ele inclinou a cabeça, aproximou um pouco mais — perto demais — e falou:
— Você ficou com ciúme?
Meu coração bateu tão forte que eu quase perdi o ar.
— Não — sussurrei.
Ele riu, baixo.
E foi a risada mais provocadora que já ouvi.— Ah, ficou.
— Não fiquei — repeti, sentindo o rosto queimar.
Ele deu mais um passo.
Eu senti o calor dele. O cheiro dele. A proximidade dele.— Então por que tá tremendo?
Eu estremeci de verdade, como se meu corpo tivesse traído minha boca.
Ele levantou a mão devagar.
Não encostou. Mas chegou perto demais do meu rosto.— Posso…? — ele perguntou, a voz rouca.
Minha respiração falhou.
O tempo parou.Eu ia dizer sim.
Eu sentia isso na minha boca.Mas Bianca gritou ao longe:
— A GENTE TÁ CONTANDO OS MINUTOS, HEIN!
Noah fechou os olhos, frustrado.
Eu queria xingar.Quando ele abriu os olhos de novo, estava… diferente.
Mais sério. Mais contido.— A gente precisa conversar — ele disse.
— Não sei se quero.
Ele chegou mais perto, o rosto quase encostado no meu.
— Então eu vou esperar até você querer.
E com isso… ele simplesmente virou e foi embora.
Me deixando ali, com o coração batendo descompassado, as pernas bambas e a sensação de que alguma coisa enorme acabava de mudar.
Atrás de mim, Val sussurrou:
— Eu shippo.
Bianca completou:
— Eles vão se pegar muito.
E Lia apenas murmurou:
— Isso vai dar problema.
Eu respirei fundo.
Ia.
Com certeza ia.






