5 - No Escuro, Tudo Arde

Eu precisava sair do quarto antes que enlouquecesse.

A cena do banheiro ainda estava presa na minha cabeça como um espinho: a porta batendo, a respiração dele quente demais na minha nuca, o jeito que ele me segurou, firme, decidido, errado… mas tão certo que meu corpo não teve tempo de discordar.

Ridículo.

Eu não devia estar pensando nisso.

Eu odeio o Noah.

Ou deveria odiar.

Enfiei as mãos no bolso do moletom e fui caminhar pelo campus. À noite, aquele lugar parecia outro: silencioso, iluminado por postes que não iluminavam nada de verdade, só criavam sombras maiores. Eu gostava disso. Gosto de esconderijos.

Mas hoje eu não estava ali por gostar.

Eu estava fugindo.

Fugindo daquela sensação quente e estúpida que ele deixou em mim.

Chutei uma pedrinha e respirei fundo, tentando expulsar o cheiro, o toque, a memória. Nada funcionava. A noite estava parada, e mesmo assim parecia que o mundo inteiro estava me empurrando de volta para aquela porta fechada.

“Respira, Éris,” murmurei pra mim mesma.

Não ajudou.

Caminhei mais alguns minutos, seguindo um caminho aleatório só pra não voltar pro quarto. Eu sabia que, quando chegasse lá, o silêncio ia engolir meus pensamentos e… sinceramente, eu tinha medo de ouvi-los.

Virei para a área do estacionamento dos dormitórios. Não tinha ninguém ali a essa hora. Era perfeito para me esconder de mim mesma por uns minutos.

Mas aí eu ouvi.

Risos.

Femininos.

E uma voz masculina que eu reconheceria até no meio de uma multidão caótica.

Noah.

Travei no lugar.

Ele estava encostado no capô de um carro preto, braços cruzados, expressão relaxada — tão relaxada que chegava a me irritar. A garota na frente dele fazia charme com o cabelo, rindo de qualquer coisa idiota que ele soltasse. Ela parecia… feliz. Solta. Enfeitiçada.

Meu estômago embrulhou.

Não por ciúmes.

Não era isso.

Não podia ser isso.

Era só… raiva.

Só isso.

Raiva dele. Raiva dela. Raiva de mim.

Eu devia ter virado as costas imediatamente, mas meu corpo ficou ali, me traindo. Olhando.

Até que a garota tocou o braço dele.

Aquilo foi um tapa sem mão.

Meu peito apertou de um jeito específico, irritante.

Engoli seco.

Ridículo, Éris. Ridículo.

Eu não sinto ciúmes.

Eu nem gosto dele.

Eu nem suporto ele.

Endireitei o pescoço, virei e comecei a andar — rápido demais, provavelmente fazendo barulho demais também, porque ouvi a voz dele às minhas costas:

— Éris?

Fechei os olhos por um segundo.

Claro. Óbvio. A noite nunca me dá paz.

Não virei. Continuei andando.

— Ei — ele chamou de novo, agora mais perto. — Ignorando?

Eu queria mandar ele explodir.

Queria gritar.

Ou beijar.

Ou bater.

Ou fugir.

Não sabia.

Então eu parei. Não porque ele pediu — mas porque meu peito estava tão apertado que eu precisava de ar.

Virei devagar.

— O que você quer, Noah?

Ele estava ali, a poucos passos, mãos no bolso da jaqueta, expressão meio confusa… ou fingindo estar. Ele sempre parece meio fingido.

— Só falei seu nome — ele disse.

— E eu preferi fingir que não ouvi.

A garota atrás dele olhava a cena como quem assiste a um reality show ao vivo. Isso só me irritou mais.

Noah deu um meio sorriso, daqueles irritantes, preguiçosos.

— Relaxa — ele disse, com a voz baixa que passa direto pela pele. — Não precisa ficar assim.

— Assim como? — perguntei, cruzando os braços, mesmo que isso fizesse meu coração bater mais rápido.

— Tensa. — Ele deu um passo. — A cena do banheiro mexeu com você?

Filho da…

Senti o sangue ferver tão rápido que ouvi o próprio pulso.

— Não fala disso na frente dela — rebati, seca.

Ele arqueou a sobrancelha.

— Por quê? Não foi nada demais.

Essas quatro palavras me atravessaram como se ele tivesse enfiado a mão no meu peito.

Eu ri. Um riso curto, amargo.

— Ótimo. Bom pra você então.

Ele franziu o cenho, finalmente desconfortável.

Eu queria que ele queimasse com esse desconforto.

— Éris…

Ergui a mão.

— Boa noite, Noah.

Virei e saí antes que o mundo me visse quebrar.

Dessa vez, ele não tentou me parar.

E isso doeu mais do que qualquer coisa que ele disse.

Meu quarto me recebeu quente, abafado, sufocante. Joguei a chave na mesa, arranquei o moletom, as meias, amarrei o cabelo num coque torto. Nada disso ajudou. Meu corpo ainda estava preso naquela cena. Na risada daquela garota. No sorriso dele.

Aquele sorriso que ele nunca me dá.

Deitei. Levantei. Deitei de novo.

Virei pro lado esquerdo. Depois pro direito.

Puxei cobertor. Empurrei cobertor.

Nada.

O silêncio do dormitório era uma tortura.

Minha mente, pior ainda.

Pensei no diário.

Ele estava ali, em cima da mesa.

Me esperando.

Podia abrir.

Mas não hoje.

Não agora.

Fechei os olhos, tentando dormir.

Mas a verdade é que ninguém dorme com tanta coisa ardendo por dentro.

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