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Capítulo 3 - O Peso da Herança

O ronco do motor cortou o silêncio da estrada de terra. A poeira subiu atrás da viatura enquanto o sol morria atrás das colinas douradas de Riverwood.

Jackson estacionou diante da casa grande e desligou o carro. O casarão Grimwood, com suas janelas antigas e madeira marcada pelo tempo, parecia observá-lo de volta — imóvel, orgulhoso e cansado.

Na varanda, o pai o esperava.

Elijah Grimwood estava de pé, apoiado na bengala, o chapéu de palha sombreando o rosto firme e envelhecido.

— Então o xerife voltou pra casa — disse ele, a voz seca como o pó da estrada.

Ele saiu do carro e ajeitou o chapéu no banco do passageiro e foi em direção ao seu pai. Era um homem alto, de postura firme, ombros largos e pele bronzeada pelo sol do sul. O cabelo loiro-escuro caía levemente sobre a testa, e os olhos azuis refletiam o mesmo céu alaranjado que se apagava no horizonte. Havia algo de contido nele — a serenidade de quem carrega mais peso do que mostra.

Jackson respirou fundo percebendo o tom do pai, fechou a porta da viatura e subiu os degraus da varanda.

— Boa noite, pai. Estou atrasado?

— Pro jantar, não. Pro resto da vida, já chega tarde há anos. – diz o pai de forma ríspida e cortante.

_“Eu só queria ter um jantar normal”_ Jackson pensa enquanto encara o pai, os lábios uma linha fina de contenção.

O tom bastou pra reacender o incômodo entre os dois.

Jackson ajeitou o cinto e respondeu, o maxilar travado.

— Ainda com esse assunto, pai? Já discutimos isso. Eu tô fazendo o que gosto, e o assunto está encerrado.

O silêncio entre os dois se estendeu por longos segundos, interrompido apenas pelo som do vento passando pelas cercas. Elijah desviou o olhar primeiro, batendo a ponta da bengala no assoalho.

— Vamos entrar — disse, seco. — Sua mãe preparou o jantar.

Jackson suspirou e o acompanhou. O assoalho da varanda rangeu sob os passos dos dois, e a porta velha se abriu soltando um estalo.

O cheiro de pão recém-assado e carne ao forno tomou o ar. A sala de jantar era ampla, iluminada pelo tom dourado da lareira. As cortinas claras balançavam com a brisa que vinha da janela aberta. A casa parecia viva, guardando dentro de si o peso de todos os anos e das memórias que insistiam em não partir.

Eleanor Grimwood, a mãe, estava de pé junto à mesa. Os cabelos loiros começavam a ganhar fios prateados, e o avental florido trazia o cheiro de temperos e fumaça. Ela virou-se assim que os viu e sorriu — um sorriso doce, mas cansado, o tipo de sorriso que uma mãe usa pra esconder preocupação.

— Finalmente em casa, meu filho. — A voz dela soou suave, acolhedora, diferente da rigidez do marido.

Jackson tirou o chapéu e encostou-o na parede.

— Boa noite, mãe. — Aproximou-se e beijou-lhe a testa. — Estava com saudade.

Eleanor pousou a mão no rosto dele, os olhos marejando por um instante.

— Você anda magro demais. Trabalhando demais.

Jackson sorriu de leve.

— E o senhor continua mandando demais — respondeu, lançando um olhar breve para o pai, que fingiu não ouvir.

Elijah se sentou à cabeceira da mesa, o corpo ereto e o olhar distante. Eleanor acomodou-se ao lado oposto, e Jackson tomou o lugar à direita, o mesmo de quando era menino.

A comida fumegava em travessas de porcelana. O cheiro era familiar — carne assada, pão quente e ervas frescas —, o tipo de jantar que um dia significou lar. Agora, só lembrança.

Durante alguns minutos, ninguém falou. O único som era o dos talheres, o crepitar do fogo e o relógio antigo marcando o tempo na parede.

Eleanor foi a primeira a tentar amenizar o clima.

— E a cidade, filho? Como estão as coisas por lá?

Jackson ergueu o olhar do prato.

— Tranquilas, mãe. Uns bêbados, umas brigas de bar… nada demais.

Elijah limpou a garganta, o som seco preenchendo o ar.

— Nada demais — repetiu com sarcasmo. — Um xerife satisfeito com o nada. Que orgulho.

Jackson pousou o garfo com calma, mas os dedos estavam tensos.

— Prefere que eu volte pra cá e passe o resto da vida cuidando de vaca e plantação?

— Prefiro que viva como um Grimwood. — Elijah cruzou os braços. — O nome dessa família valia alguma coisa antes de você trocar a terra pela lei dos outros.

Eleanor lançou um olhar repreensivo ao marido.

— Elijah, por favor…

Mas ele continuou, sem alterar o tom.

— Teu irmão morreu lutando por essa terra. E você? Vive servindo homens que nunca pisaram nela.

Jackson respirou fundo, tentando manter a calma.

— Eu sirvo às pessoas, pai. Protejo o que é certo.

Elijah soltou um riso curto, amargo.

— Certo. — Balançou a cabeça. — Certo é sustentar o chão onde você nasceu. Certo é não deixar o nome Grimwood virar piada.

O silêncio voltou, pesado. Eleanor mexeu o guardanapo entre os dedos, os olhos marejados. Jackson olhou para o prato, mas o apetite havia desaparecido.

— A fazenda está falida — disse Elijah, de repente.

A frase caiu sobre a mesa como uma pedra no poço.

Eleanor fechou os olhos, tensa. Jackson ergueu o olhar, surpreso.

— O quê?

— Fiz um acordo com o Barão William Blackwolf. Ele vai quitar nossas dívidas e salvar nossas terras.

Jackson arqueou as sobrancelhas.

— E o que o senhor deu em troca?

Elijah o encarou, firme.

— Dei você. Vai se casar com uma das filhas dele.

O garfo escapou dos dedos de Jackson e bateu no prato, o som metálico ecoando.

Ele se levantou devagar, a voz incrédula.

— Eu já tenho compromisso, pai! Tenho minha noiva, Daiana! Não vou me casar com qualquer uma!

Eleanor levou a mão à boca. Elijah continuou impassível.

Jackson falou mais alto, o rosto vermelho:

— Daiana é a mulher com que eu vou me casar!

Jackson estava com Daiana a tanto tempo que não se lembrava mais quando começou , estudaram juntos desde a infância , ela foi sua primeira mulher , sua primeira e única namorada , porém a paixão da adolescência que ele sentia antes por ela não tinha mais, oque restou foi apenas a lealdade.

As palavras saíam em disparo, cheias de dor e orgulho.

Mas no fundo, ele sabia que o amor entre eles havia mudado. Ainda havia carinho, lealdade, respeito — mas não mais fogo.

Mesmo assim, Jackson era um homem de palavra, fiel aos votos que fizera.

Elijah recostou-se na cadeira, indiferente.

— Esse relacionamento com essa garota que não vai pra frente nem pra trás não , e não vai salvar nossa família. — A voz dele era firme, cortante. — Você precisa nos ajudar. Só temos você agora.

Jackson cerrou os punhos.

— E se eu me recusar?

— Então vai carregar o peso de deixar o nome Grimwood morrer. — Elijah bateu a bengala no chão. — Não faça com que a morte do seu irmão tenha sido em vão.

O nome Joshua ecoou na sala como uma sentença.

Jackson respirou fundo, o olhar nublado.

— Joshua morreu por essa nação, pai. — A voz dele saiu baixa. — E você quer que eu morra por esta terra.

O silêncio engoliu o resto. Eleanor chorava baixinho. Elijah apenas o encarava, inquebrável.

Jackson se levantou, pegou uma garrafa de cerveja da mesa e saiu, batendo a porta.

Jackson atravessou o alpendre e desceu os degraus da varanda sem olhar para trás. O ar noturno o atingiu como um soco frio.

O vento vinha do norte, carregando o cheiro de chuva e terra molhada. O campo se estendia diante dele — uma imensidão dourada agora tingida pelo luar.

Seguiu por entre as cercas, o som das botas afundando na poeira úmida.

Conhecia aquele caminho de olhos fechados.

Atrás do celeiro, sob a velha figueira, ficava o pequeno cemitério da família Grimwood — um retângulo cercado por pedras cobertas de musgo, onde o tempo parecia andar mais devagar.

As folhas balançavam preguiçosas no alto, sussurrando segredos antigos.

Ali, debaixo daquela árvore, o irmão dele dormia.

Jackson parou diante da lápide simples de pedra clara.

“Joshua Grimwood — Filho, irmão, herói.”

Leu as palavras em silêncio, como quem repete uma oração antiga.

Ajoelhou-se e apoiou uma das mãos sobre a pedra fria.

Pegou a garrafa de cerveja que trouxera e abriu com um estalo seco.

O som pareceu ecoar por toda a fazenda adormecida.

Tomou um gole, longo, amargo, deixando o álcool queimar a garganta antes de falar.

— Parece que eu vou ser o primeiro a se casar então, irmão… — murmurou, a voz rouca, com um sorriso triste. — Aposto que você estaria rindo disso, não é?

Deu outro gole e olhou para o céu, onde a lua despontava entre as nuvens.

O silêncio ao redor era pesado, só quebrado pelo farfalhar do trigo distante.

— Sabe, às vezes eu ainda escuto você rindo no celeiro… — Ele passou a mão pelos cabelos loiros, cansado. — A mãe sempre diz que você era o orgulho da família. E eu… eu fui o que sobrou.

Apoiou os cotovelos sobre os joelhos e abaixou a cabeça.

— Sinto sua falta, irmão. — A voz saiu baixa, quase um sussurro. — Você morreu e me deixou aqui pra cuidar de tudo.

O vento soprou, balançando as folhas da figueira, como se o morto o ouvisse.

Por um instante, Jackson ficou imóvel, apenas escutando o som da natureza — o lamento distante de um grilo, o gemido da madeira do celeiro, o farfalhar do vento entre as espigas de trigo.

Ele abriu outra cerveja, colocou-a encostada na base da lápide e passou a mão pela cruz de madeira, limpando o pó.

— Isso é por você, Josh. — respirou fundo. — Por tudo o que sobrou da gente.

Permaneceu ali por longos minutos, o rosto voltado para o chão.

Quando finalmente se levantou, sentiu o peso do dever no corpo.

A cada passo de volta, o som das folhas e da areia parecia mais lento, mais distante, como se a própria terra entendesse o que ele estava prestes a fazer.

Ao chegar à varanda, viu as luzes acesas na sala.

O fogo ainda ardia na lareira.

Eleanor chorava baixinho, sentada à mesa, o olhar perdido no prato intocado.

Elijah continuava na cabeceira, imóvel, com a bengala apoiada entre as pernas.

Jackson parou por um instante, o coração acelerado, o gosto amargo da cerveja ainda na boca.

Então respirou fundo e entrou.

O barulho das botas sobre o chão de madeira ecoou pela casa, chamando a atenção dos pais.

Ele se aproximou, o rosto firme, mas o olhar derrotado.

— Tudo bem… — disse, com a voz rouca. — Farei isso então.

Eleanor ergueu os olhos, incrédula.

Uma lágrima desceu silenciosa por sua bochecha.

Elijah não disse nada — apenas fechou os olhos e assentiu, como quem vence, mas perde ao mesmo tempo.

O fogo estalou na lareira, cuspindo faíscas.

O vento entrou pela janela aberta e fez a chama vacilar.

Sob o mesmo céu, milhas adiante, o casarão dos Blackwolf repousava em silêncio — e o futuro começava a se mover.

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