Luara
O sono me evitou durante boa parte do voo, a tristeza era um nó constante na garganta, e as lágrimas teimavam em rolar. Assim que o avião tocou o solo romeno, Lívia saltou da cadeira, impaciente. — Vamos, mãe. — Calma, filha. — Já é noite, pode ser perigoso. — Não se preocupe, estaremos com dois vampiros, eles nos acompanharão até a brigada. — Que irado! Lívia, a fã número um de vampiros, estava prestes a ter um colapso de emoção ao ver um de perto. Convivemos com a existência de vampiros há séculos, era um fato conhecido, mas raramente víamos algum no Brasil. Os poucos que cruzavam nosso país estavam apenas de passagem. — Olha mãe, um vampiro. Ali tem outro. A verdade é que o aeroporto fervilhava de vampiros, circulando entre nós com uma naturalidade surpreendente. Afinal, a Romênia era o lar deles, nós éramos as novidades, as atrações. — Para de apontar Lívia, eles podem não gostar — minha mãe a repreendeu. — Eles são demais! — São sanguessugas, podem conviver bem com humanos, mas seu instinto é sugar nosso precioso sangue — falei, e no mesmo instante um vampiro passou por mim e me encarou. Seus olhos vermelhos me assustaram, ele rosnou, mostrando suas presas afiadas, e eu congelei. Respirei fundo quando ele seguiu em frente. — Aquele vampiro rosnou para mim? — Só queria te assustar, ele deve ter ouvido você chamar os irmãos dele de sanguessugas — Lívia disse, e revirei os olhos. — Controle essa boca Luara, agora devemos obediência a eles. — Tá pra nascer vampiro que mande em mim. Na verdade, vampiros e lobos deveriam andar juntos, afinal, são todos sanguinários. — Espero que controle essa língua quando chegar à brigada, nem todos os vampiros gostam de ser chamados de sanguinários, e muito menos de sanguessugas. É ultrajante ser comparado a seres inferiores. — Uma voz fria surgiu ao meu lado, me dando um susto, era um vampiro. — E vivemos há séculos no mundo, então tivemos tempo para aprender todos os idiomas, inclusive o português — outro vampiro apareceu, e agora a situação ficou tensa. — Perdoe minha filha, ela ainda está confusa com essa mudança — minha mãe interveio, tentando apaziguar a situação. — Sou Stefan e este é Fellipo, fomos designados a acompanhá-las até a brigada. — No caminho, ditaremos as regras. Esperamos que cumpram e não nos causem problemas. — Obediência é essencial para manter a paz entre nós — ele falou, fixando seus olhos em mim. Ah, ótimo. Mal cheguei e já causei confusão com vampiros. — Sua filha já estaria morta se o conde a ouvisse comparar seus filhos a sanguessugas. — Isso não vai acontecer novamente — minha mãe garantiu, com um tom firme. — Para o bem de sua família, é bom mesmo que não volte acontecer — ele me encarou com fúria, e eu fingi não entender a gravidade da situação. — Estamos nos comunicando em seu idioma, mas assim que entrarmos na brigada, devem falar em inglês. Não exigimos que os estrangeiros saibam o romeno, então todos na brigada falam inglês. Espero que sejam fluentes. Era uma das exigências para aceitarmos novos moradores. — Somos todas fluentes em inglês — minha mãe respondeu prontamente. — Sigam-me — Stefan ordenou, e eles seguiram na frente, com nós correndo atrás. — Será que eles não sabem que humanos não têm super velocidade? — sussurrei para Lívia. — Não adianta cochichar, Lua. Eles têm super audição. — Parem as duas, eles vão ouvir — minha mãe nos repreendeu. Entramos em um carro, e pela primeira vez em vinte e cinco anos, estávamos na rua em plena noite. Era excitante e assustador ao mesmo tempo. — Não tenha medo, se aparecer um lobo, cuidaremos dele — o tal Fellipo falou. — Vocês lêem a mente? — Não, só o conde tem esse poder, mas pela sua cara de assustada, imaginei o que estivesse pensando. — É assustador pensar que podemos dar de cara com um bicho. — Chama os lobos de bicho? — Sim. — Humana! — Ele fez uma careta para mim. — Vampiro! — Retruquei. Ele me olhou irritado, e eu dei um sorriso sem graça. É Lua, você vai ter que aprender a controlar essa boca. ... A brigada era basicamente um condomínio fechado com muros de concreto enormes e casas bonitas. Vi um mercado, lojas de roupas, tudo que tem em uma cidade normal. — Incrível — falei chocada. — Procuramos dar o nosso melhor para atender aos desejos dos humanos — Stefan disse. — Isso é muita gentileza — minha mãe comentou, e eles trocaram um olhar estranho que não passou despercebido por mim. — Esta é a sua casa, doutora. As casas eram todas idênticas, no estilo geminado. — As casas são todas mobiliadas. Caso queiram mudar a decoração, existe uma loja na brigada. Podem comprar o que quiserem, basta ter as fichas. — Como funciona esse lance de fichas? — perguntei. — As fichas servem como o seu dinheiro. Vocês trabalham e ganham as fichas, que poderão usar da forma que quiserem. — Está tudo explicado no livro que vocês serão obrigadas a ler, com todas as regras e serviços prestados. Aqui também tem um mapa da brigada para não se perderem. — E quando começo a trabalhar? — minha mãe perguntou. — Se instalem primeiro, logo o conde avisará. Sem se despedirem, eles foram embora. — Vou escolher meu quarto — Lívia saiu correndo. — O que achou filha? — minha mãe perguntou. — Acho que vamos nos adaptar, tem de tudo aqui. — Seu pai ia gostar. — Sim, e o Adrian também. A decoração dos quartos era simples, tudo de madeira antiga, definitivamente eu usaria muitas fichas para mudar aquilo. Aproveitei para ligar para meu amor, mostrei um pouco do meu novo quarto e prometi que aquela cama ainda veria muitas safadezas nossas. Ele não parecia muito convencido de que eu conseguiria trazê-lo. Acho que ele está deprimido, e eu estou preocupada.