Lívia passou a noite em claro, com o eco das vozes de Kael, Silas e Daniel a ecoarem na sua mente. A proposta de Daniel de se mudar para a cidade parecia agora uma ameaça, um ultimato para que ela abandonasse a essência de quem ela era. O uivo que a havia chamado para a floresta parecia mais distante, mas o peso da escolha permaneceu.
Na manhã seguinte, Lívia foi trabalhar na biblioteca, sentindo o peso da sua indecisão. As páginas dos livros sobre lendas, que antes lhe davam consolo, agora pareciam zombeteiras. As lendas, que ela pensava serem fantasias, haviam se tornado uma realidade que a assombrava. Enquanto organizava os livros, ela sentiu a sua nuca arrepiar. Ela sabia que não estava sozinha. Ela se virou, e lá estava Kael, de pé na porta, com uma aura de autoridade que parecia preencher o espaço. O seu cabelo estava desgrenhado, e os seus olhos âmbar pareciam cansados, mas ainda assim intensos. "Eu sabia que te encontraria aqui," ele disse, com a voz baixa. "O teu cheiro... ele é como um farol para o meu lobo." Lívia, com medo de que a senhorita Thompson, a bibliotecária chefe, os interrompesse, sussurrou: "Kael, o que está a fazer aqui? Você não pode estar aqui. Alguém pode te ver." "Eu preciso falar com você," ele disse, aproximando-se. "A tua alma me chama. Eu sinto isso, Lívia. E eu sei que você também sente algo." Antes que ela pudesse responder, a porta se abriu novamente, e Silas apareceu. Ele olhou para Kael, e a rivalidade entre os dois acendeu-se novamente, um fogo silencioso que queimava na biblioteca. Os olhos de Silas eram de um cinzento tempestuoso, e a sua expressão era de um cansaço amargo. "Eu sabia que ele estaria aqui," Silas disse, com um tom de voz rouco. "Sempre a seguir os meus passos, Kael. Mas não desta vez. A nossa companheira tem que saber a verdade." Kael se colocou na frente de Lívia. "Saia daqui, Silas. Você não tem nada a lhe oferecer. Ela é a minha companheira." Silas riu. "A sua companheira? A nossa companheira, Kael. Ela é a chave para o nosso bando, mas também é a chave para a nossa redenção. Não a afaste de mim." Lívia estava no meio dos dois novamente, sentindo a mesma tensão da noite anterior. Os dois lobos pareciam lutar por ela, e ela se sentia como uma peça de xadrez em um jogo que ela não entendia. Ela sabia que precisava fazer algo, ou a situação fugiria do seu controle. "Parem, por favor!" ela exclamou, a sua voz ecoando no silêncio da biblioteca. "Eu não sei o que está a acontecer! Eu não sou uma peça de xadrez que vocês podem usar para a vossa rivalidade. Eu não posso escolher entre vocês, porque eu nem os conheço!" As palavras dela, cheias de dor e confusão, pareciam ter um efeito nos dois. Kael e Silas se acalmaram, e olharam para ela com um olhar de compreensão. "Lívia, eu te entendo," Kael disse, com uma voz mais suave. "Mas o nosso mundo não pode ser ignorado. A tua alma está ligada à nossa. Você é a nossa companheira, a nossa lenda, a nossa esperança. Eu não posso deixar que você vá embora." Silas se aproximou, e o seu toque na mão dela foi frio, mas reconfortante. "Ele está a dizer a verdade. Você é a nossa companheira. E a lenda diz que a companheira pode curar o lobo que a lua escolheu para ela. Mas, a lenda também diz que o lobo pode curar a sua companheira. O nosso destino está ligado, Lívia." Lívia sentiu uma pontada no coração. Ela estava a ser puxada por duas forças, por duas almas que a queriam, a precisavam. E a voz de Daniel, com os seus planos para o futuro e os seus pedidos de amor, parecia cada vez mais distante. Ela sentia que estava em um ponto de viragem. E a escolha que ela faria mudaria a sua vida para sempre. Ela olhou para Kael, depois para Silas, e a única coisa que ela sabia é que a sua vida não era mais a mesma. E a única coisa que ela precisava de fazer era decidir qual caminho seguir. Qual caminho era o certo?