Quase um mês se passou sem que Leonardo entrasse em contato comigo.
Parecia ter reservado todo o seu tempo apenas para Amanda.
Aquela conta de Facebook que ele nunca atualizava começou, de repente, a se encher de registros dos dois.
Como um casal comum, iam à ópera, viajavam para ilhas privadas, faziam todas aquelas coisas que ele, um dia, considerava sem sentido.
A última postagem foi uma foto dele em um terno sob medida, ao lado de Amanda em um vestido de noiva.
A legenda dizia: "Quero ver, pelo menos uma vez, a mulher que amo vestida de noiva."
Dei um sorriso irônico, quase amargo, e deixei um "curtir".
Depois desliguei o celular.
No dia seguinte, Leonardo me ligou.
— Juliana, traga os seus documentos. —A voz dele estava carregada de irritação e desagrado. — Esteja na igreja daqui a uma hora.
Ele desligou sem sequer esperar minha resposta.
Em cinco anos, era a primeira vez que ele mesmo tomava a iniciativa de marcar um encontro na igreja.
Eu já estava prestes a digitar uma mensagem de recusa, mas então eu lembrei do anel de metal que meu pai deixou com ele antes de morrer. Tinha que recuperar a única lembrança da minha família antes de partir.
Fui até a antiga capela da família, por aquelas ruas tão conhecidas, que percorri incontáveis vezes ao longo de cinco anos.
Dessa vez, surpreendentemente, nenhum acidente aconteceu.
Estava de pé sob a coluna de pedra marcadas por bala enquanto esperava por Leonardo até que, finalmente, avistei sua silhueta.
As olheiras fundas em seus olhos denunciavam noites em claro, e o cheiro forte de tabaco impregnava as suas roupas.
Depois de tantos anos ao seu lado, aprendi a reconhecer seus sinais: ele só acendia um cigarro quando a dor o consumia por dentro.
Um mês sem nos vermos, e, ao me encarar, ele se surpreendeu:
— O que aconteceu com você?
A doença, somada aos efeitos da quimioterapia, me devorou sem piedade. Em poucas semanas, restava apenas um corpo frágil, reduzido a pele e ossos.
Não precisava que ele dissesse, eu sabia que devia estar horrível.
Leonardo franziu ainda mais a testa diante do meu silêncio:
— Hoje é o dia de assinarmos o registro de casamento. Tem certeza de que quer tirar a foto da certidão com essa aparência?
— Não vim aqui para jurar nada. — Respondi com calma, estendendo-lhe a mão. — Só quero de volta o anel do meu pai.
Ele arregalou os olhos, como se acreditasse que eu estivesse sendo irracional.
Logo depois, soltou um riso frio e, de repente, agarrou meu pulso, puxando-me para dentro da igreja sem me dar chance de resistir.
— Pare com esse joguinho de me provocar para depois fingir resistência. Acha mesmo que eu não teria alternativa senão me render a essa dívida e me casar com você? Pois bem… você venceu. Vamos assinar os papéis e, depois, marcamos a cerimônia. — A voz de Leonardo soou como um desabafo desesperado de um homem que se rendia não por amor, mas por não ter outra alternativa.
O padre, já acostumado com aquelas cenas repetidas, nos recebeu com naturalidade e começou a preparar os documentos e os símbolos necessários para o juramento.
— Peço que os dois apresentem seus documentos de identidade e assinem o requerimento de casamento.
Leonardo retirou o anel com o brasão da família Rodrigues e o entregou ao padre.
No instante em que estendeu a mão, a manga do paletó recuou levemente, revelando  uma nova tatuagem na parte interna de seu pulso.
Era a abreviação do nome Amanda Oliveira, enlaçada por uma rosa vermelha.
Sem entender a gravidade daquilo, o padre tentou animar o ambiente:
— Que lindo! Vocês realmente se amam… Até tatuaram o nome um do outro. É a prova de uma felicidade verdadeira.
Leonardo estagnou por um instante e, um tanto constrangido, apressou-se em puxar a manga para cobrir o desenho.
Instintivamente, lançou um olhar na minha direção, ao ver que eu permanecia imóvel.
— O que foi? — A voz dele assumiu um tom de zombaria. — Por acaso, estava com medo de sofrer mais um acidente no caminho  que esqueceu até os documentos de identidade?
Diante daquele escárnio, respirei fundo.
— Já disse que não vim aqui para me casar. Só quero de volta o anel do meu pai…
Antes que pudesse terminar a frase, o telefone via satélite de Leonardo apitou com um som agudo.
Ele atendeu, e a voz aflita de um de seus homens ecoou pela linha:
— Chefão! Aconteceu uma tragédia! A Srta. Amanda ingeriu uma grande quantidade de calmantes… Talvez, ela não sobreviva! E… Encontramos uma carta de despedida. Está escrito que a Srta. Juliana, quem a forçou a fazer isso!