08
Elói congelou no movimento de se levantar. A tensão no ar ficou espessa como névoa pesada. Ele girou devagar, os olhos encontrando os meus com algo entre surpresa… e culpa.
— Eu não sei o porquê me escolheu. E eu quero que seja verdadeiro. Você estava me vigiando Elói? Por isso pediu ao meu pai para me levar a empresa? Me fez assinar um contrato que envolve sexo também, o que está me propondo ? Quer que eu seja sua submissa? Falo que não sou mulher de ninguém, antes que eu sinta que essa pessoa me passa confiança.
— Eu... — ele começou, mas a voz falhou. Passou a mão pelo cabelo e deu um passo à frente. — Não. Não foi vigilância. Foi curiosidade... no início. Depois, foi fascínio.
— Fascínio? — repeti com amargor. — Isso justifica manipular tudo ao meu redor? Me colocar nesse jogo sem sequer me dizer as regras?
— Eu não te manipulei. Eu criei uma chance de você se aproximar. E sim, eu pedi ao seu pai. Mas não porque queria te controlar. Porque queria te entender.
— E o contrato?
Ele respirou fundo, como quem se arma antes de atirar a verdade.
— O contrato foi um teste. Uma provocação. Eu precisava saber até onde você ia. Você me intrigou. E no meu mundo, tudo o que intriga... é colocado à prova.
Balancei a cabeça, sentindo o gosto amargo da desconfiança.
— E quanto à parte íntima? Está mesmo me propondo um relacionamento de controle, dominação? Você quer uma mulher moldável, é isso?
Ele se aproximou, os olhos fixos nos meus. Havia dor neles. E algo mais... orgulho ferido.
— Eu não quero uma mulher moldável, quero uma mulher que me desafie. Mas eu preciso de controle… não por prazer, Noah mas por sobrevivência.
— E eu não sobrevivo assim, Elói. Eu não sou extensão do seu poder. Eu sou inteira. Sozinha.
Ele assentiu, com um gesto lento.
— Eu sei. E talvez seja exatamente isso que me assuste.
— Então me deixe livre — falei, firme. — Eu só fico onde escolho ficar. E se um dia eu confiar em você… será por merecimento, não por contrato.
Por um segundo, vi vulnerabilidade nele. O homem blindado estava, por dentro, em guerra.
— E se eu disser que não quero que você vá embora?
— Então me prove que me vê como mulher. Não como peça.
Elói abaixou o olhar, derrotado apenas por um instante. Depois, encarou-me novamente, mais sério do que nunca.
— Amanhã, no projeto, você estará livre para escolher como conduzir. Jonathan vai te testar. Mas eu não vou interferir.
— Nem me vigiar?
— Só admirar. De longe. Se você deixar.
Assenti lentamente, as palavras pesando mais do que pareciam.
Naquela noite, dormi com a alma em alerta. Porque, pela primeira vez, eu tinha vencido o jogo dele. Mas parte de mim temia o que Elói faria... quando decidisse jogar de verdade.
《♤♡◇♧》
O dia seguinte chegou como uma avalanche. O céu de Seul estava cinza, o ar carregado com aquela eletricidade típica de mudanças importantes.
Vesti um blazer sóbrio, calça preta de alfaiataria e deixei o cabelo preso num coque firme. Eu precisava parecer o que já era por dentro: determinada, inabalável e pronta para não ceder — nem a Jonathan, nem a Elói, nem ao passado de nenhum dos dois.
Quando cheguei ao saguão do hotel, Elói já me esperava ao lado do carro. Estava elegante, como sempre, mas havia algo diferente em seu olhar. Ele não sorriu. Apenas assentiu com a cabeça — um gesto de respeito contido. E dessa vez, não tentou tocar.
No carro, silêncio. Mas não desconfortável. Era o silêncio de dois jogadores prestes a entrar no tabuleiro.
Ao chegarmos ao prédio da empresa parceira, já havia movimentação no salão de reuniões. Tradutores, investidores coreanos, e… Jonathan. De pé, conversando em inglês fluente com um grupo ao redor, como um lobo que se mistura entre cordeiros.
Assim que me viu, seu sorriso se alargou.
— Ela chegou. Agora o jogo começa de verdade.
Fingi não ouvir. Caminhei até a mesa central com a segurança de quem já havia decidido: eu não seria usada por nenhum deles.
A reunião começou. Apresentações formais. Slides. Diagramas. Tudo meticulosamente calculado. Até que Jonathan, com a lábia venenosa de sempre, lançou o primeiro golpe.
— E agora, para mostrar como pretendemos posicionar nossa campanha de expansão no setor asiático, passo a palavra para… Noah
Os olhares se voltaram para mim.
Elói me encarou, tenso. Ele não sabia que Jonathan faria isso. Mas, fiel à promessa da noite anterior, permaneceu calado.
Levantei-me devagar.
— Bom dia. Antes de tudo, gostaria de deixar claro que não represento nenhuma narrativa pronta. Estou aqui para construir com vocês — com transparência.
Os tradutores começaram a trabalhar freneticamente. Um leve murmúrio percorreu a mesa.
— O projeto de vocês é ambicioso — continuei —, mas o que falta nele é humanidade. Vocês miram lucros, gráficos, expansão. Mas esquecem que, na Ásia, o valor está na confiança e na conexão com o consumidor. E essa conexão não se força com poder... mas com verdade.
Jonathan me olhava como se eu tivesse acabado de desarmar uma bomba que ele havia preparado com cuidado.
— E é por isso — finalizei — que, se formos trabalhar juntos, minha exigência é simples: liberdade criativa e ética de mercado. Sem joguinhos. Sem máscaras.
O silêncio na sala foi absoluto por alguns segundos.
Até que um dos empresários coreanos falou em tom respeitoso:
— Honesta. Direta. Admirável.
E nesse momento, eu soube: havia virado a chave. Não era mais o peão no jogo de ninguém.
Jonathan me olhava com raiva disfarçada. Elói… com orgulho mal contido.
E eu? Estava finalmente onde queria estar.No centro do jogo. Mas com as minhas regras.
Mas quando saímos da sala, a verdadeira tempestade se formava nos bastidores.
Jonathan veio atrás de mim no corredor, passos rápidos, voz baixa, controlada demais.
— Brilhante, Noah. Você conseguiu virar o foco em segundos. Está orgulhosa?
Virei para encará-lo.