Capítulo 4

Assim que Ian falou, Olívia assinou o seu nome no contrato.

A imagem da assinatura naquele documento, ainda queimava na memória dela como uma cicatriz recente; feia, dolorida, necessária.

Levantou-se devagar, tentando ignorar o gosto metálico na boca, nó que apertava o peito e suas pernas trêmulas.  Mas não havia tempo para vaidade ou para se lamentar. Ela pegou a bolsa, e saiu sem sequer olhar para trás.

Leo. Era a única coisa em sua mente. Ela precisava vê-lo. Precisava ver com os próprios olhos que ele estava vivo. Que tudo aquilo não tinha sido em vão.

Quando chega ao hospital, ela vai até o saguão da pediatria. Correu até o balcão, quase tropeçando nos próprios pés, a respiração ofegante. A ansiedade e medo a dominavam.

— Olá, meu nome é Olívia Belmonte. Meu filho, Leonardo Belmonte foi internado na UTI pediátrica. Eu preciso saber como ele está, quais o estado do quadro dele. E também gostaria de mais informações sobre o pagamento do tratamento dele, por favor.

—  Ok, senhorita Belmonte. . Me dê apenas um instante. — a mulher diz com um sorriso gentil no rosto antes de desviar os olhos para tela do computador.

A recepcionista digitava com rapidez, os dedos secos clicando no teclado. Enquanto isso, Olívia mordia o polegar, o coração acelerado demais para o tamanho do corpo. Cada segundo que se passava soava como uma tortura diferente no seu peito de mãe.

— Bom, em nosso sistema consta que a conta do tratamento de Leonardo Belmonte foi quitada — disse a mulher, sem sequer levantar os olhos, ainda observando a tela. — A criança está sob medicação e observação. O médico fará nova avaliação ao meio-dia.

Olívia piscou, atordoada. Completamente paralisada.

— Paga? Tem certeza?

— Você pode confirmar. — A funcionária virou o monitor para ela, apontando o comprovante no sistema.

Olivia afundou na cadeira ao lado como se tivesse levado um golpe no peito. O ar entrou rasgado. Por um momento, o som da recepção desapareceu. Tudo ficou em silêncio.

Ian Moretti tinha cumprido a palavra.

O hospital, o tratamento, o dinheiro. Tudo já estava em movimento.

Olívia passou a mão pelo rosto, engolindo o choro. Não era gratidão. Era um tipo de alívio torto, sujo, pesado. O tipo de alívio que vinha com um gosto amargo: ela havia vendido algo de si, algo que talvez nunca recuperasse. Mas de todo mundo, ela sabia que valeria a pena. Por ele.

Olivia agradeceu a recepcionista com um aceno fraco e se sentou na sala de espera, sem se importar com o horário da visita. Esperaria. Poderia ficar ali o dia inteiro, se fosse preciso.

Quando finalmente liberaram a visita, ela entrou no quarto com passos miúdos.

Leo dormia.

Tão pequeno naquela cama enorme. Um ursinho desgastado agarrado contra o peito. A respiração mais ritmada. A pele ainda pálida, mas tranquila. Sem febre. Sem gemidos.

Olívia se sentou ao lado da cama e segurou sua mãozinha quente com as duas mãos, como se pudesse protegê-lo do mundo inteiro com aquele gesto.

— Mamãe está aqui, meu amor... — sussurrou, encostando os lábios em seus dedos. — Vai ficar tudo bem. Eu prometo. Mesmo que eu tenha que engolir o mundo inteiro.

Ela ficou ali por quase uma hora, observando o movimento do peito dele subindo e descendo. Conferia os monitores a cada dois minutos, observando seu coração que ainda batia com muita vontade. O horário de visita já estava acabando, mas ele não acordou.

Quando o médico entrou e avisou que a medicação começava a surtir efeito, Olívia apenas assentiu, muda. As palavras ficaram presas na garganta.

E então, ela quebrou.

As lágrimas caíram em silêncio, sem controle. O corpo tremia. Era como se, por um momento, tudo tivesse deixado de doer, só para dar espaço a um cansaço mais fundo ainda. Pela primeira vez, ela desmoronou na frente de alguém. Sem máscaras. Sem forças.

Medo. Culpa. Alívio. Tudo junto, bagunçado, esmagando o peito.

Ainda tentando respirar direito, sentiu o celular vibrar no bolso. O toque a trouxe de volta como um choque.

Ela limpou o rosto com a manga da blusa e pegou o aparelho com mãos trêmulas.

IAN MORETTI.

A notificação brilhou na tela:

“A festa é em quatro dias. Você vai.”

Ela leu devagar. Uma vez. Duas. Três.

Aquelas palavras não pareciam uma simples mensagem — eram um lembrete do preço. Do pacto que assinara sem alma.

Quatro dias. Quatro dias para se vestir como outra pessoa. Sorrir, mentir, fingir estabilidade. Tudo por uma promessa de tratamento. Tudo por Leo.

Ela olhou para o filho, dormindo, os cílios colados, o peito subindo e descendo devagar.

Se inclinou. Beijou sua testa.

E murmurou, com a voz embargada, mas firme:

— É por você, meu amor. Tudo por você.

Sabendo que só poderia visitar Leo no dia seguinte, ela se despediu em silêncio, prometendo voltar cedo.

Ao sair do hospital, o mundo pareceu mais barulhento. Buzinas, passos apressados, vozes altas. Como se a cidade não se importasse com ninguém.

Ela parou por um instante na calçada e olhou o céu, que ameaçava chuva. O telefone ainda em sua mão.

A mensagem de Ian. A cobrança. A função dela naquele teatro.

“Festa. Quatro dias. Você vai.”

Sabia o que isso significava. Sabia o papel que teria que desempenhar. Sabia o quanto custaria.

Mas, agora... Leo estava melhor. O tratamento havia começado. O pesadelo estava, mesmo que por um fio, sendo empurrado para trás.

Tudo por causa daquele contrato. Daquele homem frio. Daquele acordo que ela nunca teria aceitado por si mesma.

Ela fechou os olhos e apertou o celular contra o peito. As palavras vieram como uma oração desesperada:

— Pelo meu filho... talvez eu consiga.

Ela encarou a tela por mais um tempo, depois escreveu com os lábios comprimidos:

"Sim, senhor Moretti. Sua noiva estará pronta para o espetáculo."

E ao apertar “enviar”, sentiu uma parte de si murchar. Mas pelo menos, Leo estava respirando

E então começou a caminhar. Sem pressa. Sem volta.

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