O sol da manhã entrava em listras douradas pela janela do quarto, mas Carla não conseguia sentir seu calor. Ela perambulava pelo quarto como uma alma penada, as mãos trêmulas, o coração um peso morto no peito.
Ignorar. É só ignorar para sempre, pensou, passando os dedos pelo cabelo desalinhado.
Chorar? Não. Já chorei demais por homens.
Fugir. Ligar para Olívia, pedir para sumir desta cidade, desta vida.
Mas o orgulho era uma couraça mais forte. Mais forte que a dor latejante, mais forte que a esperança ridícula que teimava em brotar, mesmo agora, como um verde teimoso sob as cinzas.
Os passos na calçada da sua casa fizeram-na parar. Firmes, pesados, decididos. Conhecidos. Seu corpo inteiro enrijeceu antes mesmo de a porta se abrir. Ela sabia quem era. Conhecia o ritmo da caminhada, a postura, a energia que emanava dele e que sempre a deixava em estado de alerta e de antecipação.
Matheus surgiu na moldura da porta. O cabelo, escuro e bagunçado, ainda gotejava água da chuva fina que caí