Saulo Prado
Mal deitamos, e ela apagou. O corpo relaxado, entregue. E o rosto... Deus, o rosto dela parecia carregar o mundo inteiro nos ombros. Angelina dormia como quem desabava, como quem precisava daquilo mais que qualquer outra coisa. Eu fiquei ali, deitado, observando, sentindo o calor dela ao meu lado e pensando em tudo o que ela se recusava a dividir comigo.
Havia tanto silêncio entre nós quando o assunto era o dia dela. Os filhos, o ex, as dívidas, Francesca... sempre que eu tentava me aproximar, ela desviava o olhar ou mudava de assunto. Nunca me deixava entrar por completo.
Será que eram contas atrasadas? O salário que não dava? O medo de não conseguir sustentar os filhos sozinha? Ou era só o orgulho? Eu tentei, juro que tentei entender. Mas era difícil dormir com esse nó no peito. Difícil demais desejar tanto uma mulher que se escondia até mesmo quando se entregava.
Revirei na cama, inquieto, ouvindo sua respiração leve, até que o celular vibrou. Era a filha. Ana Júlia.
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