Narrado por Ares MarinoEla entrou no meu escritório devagar, com os olhos vermelhos e o queixo erguido, como se quisesse fingir que não estava destruída por dentro. Aquele vestido vermelho grudado no corpo parecia mais um símbolo do que ela tinha acabado de viver: humilhação, medo, vergonha.Mas o que ela ainda não sabia... era que tinha acabado de entrar num jogo muito maior. Um jogo onde ou você aprende a sobreviver, ou é engolido vivo.Cruzei as pernas na poltrona de couro, encostei o cotovelo no braço da cadeira e a observei por longos segundos antes de falar. Ela não desviou os olhos. Tinha coragem. Uma coragem desesperada, talvez. Mas ainda assim, coragem.— Você sabe quem eu sou? — perguntei, direto.Ela hesitou por um momento. Mas depois assentiu com a cabeça, firme.— Sei sim. Você é Ares Marino. Um dos três irmãos do inferno. O Dom da máfia italiana.Sorri de lado. Pelo menos eu não teria que explicar nada.— Ótimo. Isso me poupa tempo. Então também deve saber que eu não br
Narrado por IsabellaO quarto era bonito.Amplo. Bem decorado. Lençóis brancos, cortinas de linho, um banheiro com mármore escuro.Luxo. Conforto.Tudo que qualquer mulher gostaria de ter.Mas eu me sentia uma prisioneira.Assim que a porta se fechou, desabei.Me joguei na cama e chorei como uma criança perdida.O travesseiro abafava meus soluços, mas nada podia conter a dor que queimava por dentro.Meus dedos agarravam os lençóis com força.A respiração falhava.Minha garganta doía.— Por quê...? — sussurrei. — Por que isso está acontecendo comigo...?Olhei para o teto, buscando algo, qualquer coisa que me respondesse.— O que eu fiz, Deus...?— Eu amei... eu confiei... eu deixei tudo para viver um amor... e agora...Agora eu sou tratada como um objeto.Leiloada. Vendida.Fui fiel. Fui dedicada. Fui esposa.E mesmo assim... fui entregue como moeda de troca.— Por quê...? — sussurrei novamente, já sem forças.As lágrimas escorriam, silenciosas.O travesseiro encharcado.O peito, esmag
Narrado por Ares MarinoEla cantava.E o mundo parou.Eu estava parado na porta do quarto, observando, sem ser notado, com os punhos fechados e o coração numa corda bamba entre o passado e o presente.Isabella.A mulher que eu comprei.A mulher que parecia ter saído das cinzas da minha esposa morta.Ela segurava minha filha nos braços... e cantava a mesma canção que Leandra cantava para Luna dormir.As mesmas palavras.A mesma melodia em italiano.A mesma doçura na voz.Meus pés congelaram no chão.Minha respiração ficou presa na garganta.“Ninna nanna, dormi piccina...”Cada sílaba da música era como uma faca.Cortava devagar.Abria feridas que eu tinha enterrado sob toneladas de frieza e silêncio.Leandra.A minha Leandra.Ela cantava essa canção toda noite pra Luna.Mesmo grávida, mesmo cansada... ela sentava naquela mesma poltrona, com a mão na barriga, e cantava baixinho.Dizia que queria que nossa filha soubesse que o mundo podia ser cruel, mas que no colo dela sempre haveria ab
Narrado por MarcosBati a porta do meu apartamento com força. O cheiro de mofo misturado a cigarro impregnava tudo, mas eu já tinha me acostumado. Era o cheiro da derrota. O rastro podre que ficou da vida de luxo que eu perdi — por culpa dela, da Isabella.Aquela ingrata.Veio da Itália me jurando amor, se dizendo apaixonada, toda puritana, e depois começou a querer dar opinião em tudo. Como se ela tivesse o direito. Como se eu fosse um qualquer.Não sou.Eu sou Marcos Almeida.Homem de palavra. Jogador de risco. Apostador de coragem.Azar que perdi tudo.Azar que vendi tudo.A culpa foi da sorte, não minha.E, no fim, ela até me ajudou.De um jeito ou de outro.Quando vi que não tinha mais pra onde correr, que os cobradores estavam batendo na minha porta querendo arrancar pedaço, a solução caiu no meu colo: a Isabella.Linda, jovem, italiana... valia ouro.Valia mais no leilão do que comigo.Então vendi.Simples assim.Vendi a mulher como se vende um relógio de luxo no fundo de um ba
Narrado por Ares Marino O sol ainda não havia terminado de nascer quando Domenico entrou no meu escritório com o rosto tenso e um envelope na mão. Isso, por si só, já era sinal de problema. Domenico nunca mostrava tensão. A não ser quando o inferno estava prestes a se abrir. — Fala. — pedi, sem tirar os olhos dos papéis da minha mesa. Ele hesitou por dois segundos. — O advogado acabou de voltar da casa do ex-marido da Isabella. Levantei os olhos. — E? Domenico jogou o envelope na mesa. Dentro, os documentos de divórcio que deveriam estar assinados. — O desgraçado recusou. Fechei a pasta devagar, o maxilar travado. A raiva não vinha como explosão em mim. Ela vinha em silêncio, gélida, como uma onda que devora aos poucos. — Por quê? — Disse que não vai assinar sem receber dinheiro. Disse que se quiserem a liberdade legal da Isabella, vai ter que ser comprada. De novo. — Ele sabe com quem está lidando? — Sabe. O advogado informou que foi um dos irmãos da família Marino que
Narrado por IsabellaEu acreditava em finais felizes.Por mais clichê que pareça, eu realmente achava que o amor era suficiente. Que quando duas pessoas se amavam de verdade, elas conseguiam superar tudo.Tolos são aqueles que acreditam em contos de fadas...Tolos como eu.Me chamo Isabella. Tenho vinte e dois anos e me casei aos dezoito com o homem que achei ser o amor da minha vida: Marcos.Larguei tudo na Itália por ele. Minha cidade natal, minha família, meu idioma, minha cultura... vim para um país estranho com uma mala cheia de sonhos e um anel de noivado que pesava como promessa.E, por um tempo, ele realmente foi tudo que eu precisava. Carinhoso, atencioso, protetor.Eu era a mulher mais feliz do mundo.Até que tudo começou a desmoronar.No início, foram pequenas mudanças.Os beijos demoravam a vir. As palavras doces se tornaram mais raras.Depois, as noites em claro. Os olhares perdidos.E, finalmente... a verdade.Marcos tinha perdido tudo.Tudo.Jogos ilegais. Apostas. Dívi