A rejeição me rasga em duas.

Pego distância dele, com Rania gritando e se contorcendo dentro de mim. Deixo as lágrimas rolarem; estou chorando pela minha loba, que esperava tanto pelo seu companheiro, acreditando que ele nos amaria com todo o seu ser, que nos aceitaria da forma que somos. Só que ele fez tudo ao contrário do que sonhávamos, só porque acredita que somos uma loba fraca, como disse em palavras cruéis.

— Calma, Rania, vamos conseguir passar por isso de cabeça erguida. Eu preciso de você para enfrentarmos isso juntas. Lembre-se do que nossa mãe sempre falou: juntas somos mais fortes.

Tento acalmá-la, mas ela só chora, apenas chora. Queria poder abraçá-la, transmitir carinho e consolá-la. Sei que a ligação dela com o lobo de Theo é ainda mais forte do que a minha com o próprio Theo.

— Dói tanto, Helena, como dói. Ele não poderia ter feito isso conosco. Foi cruel. Suas palavras foram devastadoras. Ele foi contra o próprio lobo, contra a vontade da Deusa Luna — Rania murmura, choramingando e fungando. Estou tentando ser forte por ela, mas a minha dor também é difícil de suportar; é como se meu coração estivesse repleto de agulhas de crochê perfurando-o sem piedade.

Sinto uma fraqueza e, quando tudo começa a girar, uma mão me segura. Ao levantar a cabeça, vejo Henry. Seu olhar de pena parece pedir desculpas pelo Alfa a quem serve ser um completo idiota. Aceno e tento lhe oferecer um sorriso frágil, que não alcança os olhos. Peço desculpas e me afasto. Quando estou longe o bastante, deixo-me entregar a uma escuridão sem fim.

Vejo Rania deitada à margem de um penhasco, fungando e tremendo de dor. Sento ao seu lado, acaricio seu pelo e ela repousa a cabeça em minhas pernas. Ficamos assim, unidas em silêncio, até eu ser arrancada daquele vazio.

— Helena, por favor, acorde. Fala comigo. Estou angustiado com esse teu desmaio! — escuto a voz do meu amigo.

Abro os olhos e vejo Tony. Percebo que estamos no carro dele, estacionado em frente à minha casa.

— Como vim parar aqui? — pergunto, ainda confusa.

— Você demorou para voltar da conversa com aquele idiota do Theo. Resolvi ir atrás e te vi caindo; quase não deu tempo de te segurar. Você ia se estatelar no chão — ele explica.

— Obrigada, Tony.

Abraço-o para agradecer o cuidado e começo a chorar, sem conseguir conter as lágrimas que caem como uma enxurrada. Eu não queria mostrar esse lado frágil, mas quem estou tentando enganar? Tony significa muito para mim, é o irmão que nunca tive.

— Ele te rejeitou? — Tony pergunta, ainda me consolando.

Afasto-me, olho nos olhos dele.

— Como você sabe disso? Falei alguma coisa enquanto estava desmaiada?

— Não. Mas você está com o olhar vazio e perdido, igual ao meu na primeira semana depois que Vanessa me rejeitou. Sei o quanto uma rejeição dói. Rasga a alma em pedaços, ainda mais quando o companheiro é um Alfa — ele responde, acariciando meus cabelos. Apoio a cabeça em seu ombro e aceito o carinho. Entre nós só existe irmandade, e isso basta.

— Mas você parecia ser tão forte… parecia que não sentiu tanto assim — confesso, lembrando da forma como ele lidou com Vanessa.

— É aí que você se engana. Eu sinto até hoje. Quando a vejo, ainda dói, só que não como antes. Com o tempo, a dor diminui… ou a gente aprende a viver com ela, como se fosse parte do nosso ser.

Sempre admirei Tony pela pessoa que ele é. Agora, sabendo disso, passo a admirá-lo ainda mais. Ele merece alguém que o ame incondicionalmente, que o aceite como é. Tomara que um dia encontre essa pessoa.

O silêncio nos envolve. Desço do carro e Tony vem me ajudar. Caminhamos até a porta, ficamos alguns segundos apenas encarando o vazio. Ele me olha, e naquele olhar silencioso consigo compreender tudo. Sem precisar de palavras, sinto que ele me diz: “Sempre estarei ao seu lado para o que der e vier.”

Abraço-o e choro mais uma vez, até os soluços se acalmarem.

— Obrigada, Tony. Você é tão especial para mim. Espero que um dia encontre alguém que te ame e cuide de você, porque você merece o melhor do mundo. Eu serei sua amiga para sempre.

Ele me aperta contra o peito de novo, e só me afasto quando sinto um incômodo, como se estivéssemos sendo observados. Olho para a floresta e meus olhos se fixam num lobo de pelo negro enorme, que nos observa em silêncio.

Afasto-me de Tony e peço que ele seja cuidadoso no caminho de volta. Dou-lhe um beijo na bochecha e logo entro em casa, levando comigo a imagem daquele lobo gigantesco.

— Era ele, Helena. Eu senti a presença dele. O lobo dele veio atrás de nós logo depois da transformação! — Rania murmura dentro de mim.

— Mas por quê? Não foi suficiente ele ter nos rejeitado, nos machucado? Será que veio confirmar se estamos sofrendo? Veio pisar ainda mais na nossa dor?

Estou cheia de perguntas que ninguém pode responder, exceto aquele infeliz do Theo. Como teve coragem de aparecer ali como se nada tivesse acontecido? Como se a dor que nos causou não tivesse importância? Claro, para ele nunca teve. Talvez até tenha se divertido ao ver nosso sofrimento.

— Não sei, Helena. Não tenho resposta para as nossas dúvidas. Vamos deixá-lo de lado por agora. Estou tão triste que não sei se consigo passar pela transformação. Podemos deixar para outro dia? Desculpa, mas estou muito abalada — Rania pede, com a voz manhosa.

— Tudo bem, Rania. Vamos dormir. Também estou sem energia. Só quero esquecer que esse dia existiu.

Vou para o quarto. Estou tão cansada que não tenho forças nem para me banhar. Deixo que o sono envolva meu corpo exausto. Só assim posso, ao menos por algumas horas, esquecer a dor que ele me fez sentir.

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