MIA
A noite derramava sua luz pálida pelo quarto, filtrada pelas cortinas semiabertas, envolvendo tudo em um brilho prateado e suspenso, como se o mundo inteiro prendesse a respiração junto comigo.
A brisa morna fazia as cortinas ondularem suavemente, e cada movimento parecia um sussurro antigo, um aviso invisível carregado pelo vento.
Apoiava-me no parapeito da janela, o rosto levemente inclinado para o céu, os olhos vagando por entre as estrelas dispersas.
A fina camisola de seda moldava-se ao meu corpo, deixando minha pele exposta à carícia fantasma da noite, tornando-me vulnerável, como uma oferenda sob o testemunho silencioso da lua.
Entre meus dedos trêmulos, o relic
MIATomasio avançou até que não houvesse mais ar entre nós.Seu calor me envolveu como uma armadilha invisível, seu cheiro — uma mistura cortante de couro, fumaça e algo escandalosamente masculino — invadiu meus sentidos, me deixando tonta.Seus olhos eram uma sentença.Cinza como aço temperado, frio como a lâmina de uma faca.E eu, encurralada em seu território, já sentia as algemas invisíveis se fechando ao meu redor.Meu corpo enrijeceu sob suas mãos, mas eu lutei para manter o controle, mesmo sentindo o chão ceder sob meus pés. MIAEu sabia que um beijo não era o fim. Era o começo de algo muito pior.E, mesmo assim, para salvar Cecilia. Para salvar Vittorio, eu poderia me sacrificar mais uma vez.Abaixei os olhos, respirando com dificuldade.Um beijo. Um beijo para salvar quem eu amava.Ergui o olhar para Tomasio, sentindo o gosto da derrota na língua.— Então me beije — sussurrei, a voz embargada de ódio e submissão forçada.O sorriso dele se alargou, sombrio e vitorioso, antes de suas mãos segurarem meu rosto, firmes demais, e sua boca tomar a minha num beijo brutal, cruel, devastador.125: O Beijo Envenenado
VITTORIOO carro deslizava pelas ruas escuras como um corvo em voo silencioso. Cada metro percorrido parecia pesar mais no meu peito. Eu sabia que aquela noite mudaria tudo — para mim, para Mia, para toda a dinastia da Cosa Nostra.Don Mauricio me aguardava, e nas mãos eu carregava o destino de uma linhagem.Segurei a pasta — com as imagens do diário impressas — contra o peito durante toda a viagem, como se fosse um relicário precioso. As palavras ali contidas — verdades arrancadas do passado — pesavam mais do que qualquer arma que já carreguei.Quando os portões da propriedade se abriram, rangendo sob o peso dos anos e das promessas antigas, respirei fundo. O ar cortante da madrugada bateu no meu rosto como uma lâmina afi
VITTORIOComo capo da Cosa Nostra, minha tarefa era simples: cobrar dívidas de drogas, viciados em jogos e prostitutas. E hoje, eu estava no meu escritório, aguardando que meus homens trouxessem mais um desses fracassados: Charles Foster, o tipo de pessoa que me enojava. Viciado em jogos, sem um pingo de autocontrole. E, claro, devia uma boa quantia para a Cosa Nostra.Na Família, eu era conhecido como o Diabo. Minha regra era clara: ninguém deixava de pagar os italianos. E ninguém ousava desafiar essa regra.Eu não permitia que dívidas ficassem pendentes no meu território. Por isso, sempre fazia questão de resolver isso pessoalmente. Eu me encontrava com os devedores no meu escritório, um lugar aconchegante e bem iluminado, localizado no andar de cima de um prédio que abrigava nossos jogos ilegais. A polícia? Eles sabiam, mas fingiam que não viam. Ainda assim, eu sabia que havia muitos esperando minha queda. Um erro, um deslize, e minha cabeça estaria na mira.Verifiquei o relógio Bu
VITTORIO— Por que a trouxeram? — perguntei, a voz gelada e implacável, interrompendo qualquer provocação que Mia pudesse estar prestes a soltar. Nos seus olhos perturbadores, um brilho de raiva faiscou, refletindo a tensão que pairava no ar.— Vim para convencê-lo a esquecer a dívida do meu pai. Ele é...— Deixei bem claro que era para trazerem apenas o Charles — interrompi, sem a mínima paciência. Vi suas mãos se fecharem em punhos, o rosto tenso, transbordando frustração.Benício coçou a testa, visivelmente desconfortável.— Compreendo, Vittorio, mas ela foi insistente.Neguei com a cabeça, impaciente.— Matasse ambos e o problema estaria resolvido. Vocês sabem que tenho assuntos mais importantes para tratar do que perder tempo com um viciado e sua filhinha.Aquilo foi a gota d'água para Mia.— Olha só, seu canalha! — ela disparou. Me virei lentamente para encará-la. Seu rosto, antes aparentemente calmo, agora estava vermelho de pura irritação. — Você tem assuntos mais importantes
VITTORIODe repente, o medo que preenchia o olhar de Mia desapareceu. Ela mordeu o canto do polegar, pensativa, e um brilho de astúcia surgiu em seus olhos.— Você não vai querer sujar suas mãos nos matando — ela disse, fazendo-me erguer as sobrancelhas.— Ah, não? — provoquei, curioso.— Claro que não. Devemos parecer como ratos para você, tenho certeza de que não vai querer se sujar com o nosso sangue — respondeu, com uma sagacidade inesperada.Um sorriso de desdém se formou nos meus lábios.— De fato, vocês são piores do que ratos. São vermes. Mas não se preocupe, querida, não serão minhas mãos que se mancharão. Meus homens cuidarão disso — falei, acenando para Benício, Giuseppe e outros dos meus soldados.Mia levantou-se, olhando para os homens que se aproximavam, prontos para arrastá-los para fora do meu escritório, como se fossem uma praga.— Você é um homem muito rico. Dez mil dólares devem ser como troco de bala para você — disse ela, com a voz trêmula de nervosismo. — Não pod
MIADe todas as coisas que idealizei para a minha vida, ser jogada em um clube para me prostituir estava em último lugar na lista. Ouso dizer que sequer estava na lista. Limpar cocô de pombo estaria acima disso.— O que vai acontecer comigo? — perguntei a Vittorio, o demônio que apareceu na minha vida e a destruiu por completo. — Vou morar nesse cassino?Vittorio negou com a cabeça, enquanto assinava alguns papéis de uma pasta azul.— De forma alguma — ele disse. — Você não teria serventia em um cassino, mas com uma saia de couro e um top brilhante, conseguiria muito dinheiro.Estremeci só de me imaginar com aquelas roupas.— Como quiser — murmurei. Olhei para o homem cujo rosto eu havia arranhado e franzi a testa para ele. — Algum problema?Um sorriso sinistro surgiu em seu rosto.— Nenhum — ele respondeu.Vittorio guardou os papeis na pasta e a deixou em cima da mesa. Seus olhos passaram por mim e ele soltou um suspiro.— Bom, meu trabalho aqui terminou. Preciso me encontrar com Mau
MIATentei abrir os olhos, mas a luz forte me atingiu de imediato, me forçando a fechar as pálpebras novamente. Pisquei, tentando me ajustar à claridade. Cada piscada aumentava a dor na cabeça, mas eu precisava saber onde estava. Respirei fundo e, finalmente, consegui focar o olhar ao meu redor.O lugar era pequeno e sufocante, com paredes de um bege antigo, descascadas em alguns pontos, revelando manchas de mofo e umidade. O cheiro era horrível, uma mistura de perfume barato e suor que me fez querer vomitar. As cortinas de veludo vermelho, gastas e sujas, pendiam das janelas minúsculas, bloqueando qualquer chance de luz natural. A única iluminação vinha de uma lâmpada no teto, piscando como se estivesse prestes a apagar a qualquer momento. Isso só deixava tudo mais sombrio e assustador.Olhei ao redor e vi camas de metal espalhadas pela sala, os colchões eram finos e nojentos, como se nunca tivessem sido limpos. Roupas estavam jogadas por todo lado — lingeries e sapatos de salto alto