Ponto de Vista de Elora
O cheiro forte de suor e madeira molhada impregnava o ar enquanto eu esfregava o chão de pedra da cozinha principal. As palmas das minhas mãos já estavam ásperas, calejadas pelas tarefas incessantes que me eram impostas. Mesmo assim, era melhor manter a cabeça baixa do que provocar os olhares famintos dos guardas que às vezes cruzavam o corredor.
Lilith, agachada ao meu lado, soltou um risinho abafado, me cutucando com o cotovelo.
— Você viu Aldric hoje cedo? — ela sussurrou, como se estivesse conspirando.
Assenti levemente, focada em minha tarefa. Aldric era impossível de ignorar — alto, de ombros largos, com olhos tão cinzentos que pareciam tempestades condensadas. Era o general dos lycans, braço direito do rei... e completamente intimidador.
— Tenho medo dele — Lilith admitiu, mordendo o lábio inferior com nervosismo. — Mas... também acho ele bonito. Muito bonito. Você não acha?
Respirei fundo, sentindo o calor subindo pela minha nuca. Como eu poderia negar? Aldric exalava uma aura crua, animalesca. Mas não era ele quem me tirava o sono ultimamente.
— E Darian? — Lilith prosseguiu, com um sorriso maroto nos lábios. — Você percebeu como ele te olha? — Ela riu baixinho. — Parece que quer devorar você inteira.
Meu coração falhou uma batida. Droga, eu tinha percebido. E era impossível ignorar. A presença de Darian me consumia, me perturbava de uma forma que não era apenas medo... era algo mais perigoso.
Antes que eu pudesse responder, a porta da cozinha foi praticamente arrancada das dobradiças.
Darian.
Seu corpo imenso preencheu o batente da porta, os olhos dourados faiscando com uma fúria tão palpável que quase recuei instintivamente.
— Elora. — Sua voz era uma ordem rouca, carregada de algo sombrio e possessivo.
Lilith congelou ao meu lado, e eu também. O silêncio foi cortante, como uma lâmina recém-afiada.
Engoli em seco, meu estômago revirando. Me obriguei a erguer o olhar para ele. Para aqueles olhos que prometiam coisas que eu não ousava sequer nomear.
Ponto de Vista de Darian
O cheiro dela era um veneno. Um perfume doce e proibido que impregnava cada maldita fibra do meu ser. Quando passei pela cozinha e ouvi Lilith falando dela, rindo, desejando Aldric — e insinuando que Elora também —, algo dentro de mim quebrou.
Ela era minha.
Mesmo que ela ainda não soubesse.
Meu punho doía de tão forte que eu o cerrava. Cada batida do meu coração era um grito silencioso que ecoava pelo meu peito. Eu precisava tirá-la dali. Precisava afastá-la de todos aqueles bastardos que a olhavam como se pudessem tocá-la.
— Venha comigo. Agora. — rosnei.
Os olhos dela se arregalaram, brilhando em desafio. Aquela centelha... maldição, ela me desarmava e me incendiava ao mesmo tempo.
Ponto de Vista de Elora
O sangue pulsava alto nos meus ouvidos. Cada célula do meu corpo parecia gritar para que eu fugisse. Mas outra parte... uma parte sombria e insana... queria obedecer.
Sem esperar resposta, Darian caminhou até mim. Seu corpo bloqueava toda a luz da cozinha, me envolvia em uma sombra densa e quente.
Seu cheiro de terra, sangue e algo unicamente dele me atingiu como um soco.
Com o coração batendo feito um tambor, desviei o olhar, recobrando um pouco o controle.
Mas ele era uma presença esmagadora, impossível de ignorar.
— Agora, Elora. — Sua voz saiu mais baixa, um rosnado gutural que me fez estremecer.
Eu deveria resistir. Deveria lembrar quem eu era, a missão que eu tinha.
Mas quando ele roçou sua mão quente na minha nuca, como se fosse me guiar — ou me reivindicar —, minha pele incendiou.
Ponto de Vista de Darian
Quando meus dedos tocaram a pele delicada da sua nuca, uma corrente elétrica percorreu meu braço. Ela era quente, macia... frágil e forte ao mesmo tempo.
Queria puxá-la para mim, esmagá-la contra o meu corpo e acabar com essa tortura silenciosa.
Mas não. Ainda não.
Eu precisava ter certeza de que, quando ela fosse minha, seria porque ela queria.
Me inclinei, até sentir o calor da sua respiração contra minha boca. A distância entre nós era mínima, quase inexistente.
— Se quiser continuar conversando sobre outros homens... — murmurei, com uma ameaça velada na voz — faça isso longe dos meus ouvidos, Elora.
Seus olhos arregalados se perderam nos meus, brilhando como joias negras sob a luz fraca.
Ela queria me desafiar. Eu podia ver isso. Sentir isso.
Maldita garota. Maldita e irresistível.
Ponto de Vista de Elora
O mundo inteiro parecia ter desaparecido. Só existíamos nós dois — o calor, a tensão, o desejo sufocante.
Por um momento, achei que ele fosse me beijar. Meu corpo inteiro se inclinou para frente, traindo qualquer comando de bom senso.
Mas Darian parou, respirando fundo, como se estivesse lutando contra demônios internos.
Então, sem uma palavra a mais, ele se virou e saiu da cozinha, deixando um rastro de fúria e promessas não ditas no ar.
Eu fiquei ali, de joelhos no chão frio, tremendo.
Desejando coisas que jamais deveria desejar.