POV: Emily
Na manhã seguinte, fui guiada pelo cheiro de café recém-passado, como se meus sentidos soubessem exatamente o que eu precisava para acordar da confusão em que minha mente estava mergulhada. A cada passo, a luz do sol se filtrava pelas janelas da casa, revelando a poeira suspensa no ar e o desgaste dos móveis antigos. Tudo ali parecia parado no tempo, rudimentar, como um cenário esquecido. Mas, de algum modo, aquilo era reconfortante. Ou talvez fosse apenas a distância — a doce distância da realidade que eu deixei para trás. Quando alcancei a cozinha, parei na soleira da porta. Alexander estava ali, de costas para mim, mexendo uma frigideira com ovos enquanto segurava uma xícara de café preto na outra mão. Usava apenas uma calça de moletom cinza e o cabelo desgrenhado deixava claro que ele não havia dormido muito — ou talvez não tivesse dormido nada. A imagem dele, despretensiosa e crua, mexeu comigo de um jeito que me obrigou a desviar os olhos por um instante, tentando conter a onda de calor que me subia pela pele. — Bom dia — murmurei, ainda um pouco tímida. — Bom dia — ele respondeu, sem virar o rosto. — Café? Assenti com a cabeça. — Por favor. Ele serviu o café em uma caneca e me entregou com um olhar direto demais para ser só cortesia. Havia algo naquele gesto simples que me desarmava. Sentei-me à mesa e ele fez o mesmo pouco depois. Ficamos em silêncio por alguns minutos, apenas o som da frigideira e o tique-taque de um relógio antigo preenchiam o ambiente. Era um silêncio estranho, mas não desconfortável. Era como se estivéssemos nos estudando, nos ajustando um ao outro. — Pretende ficar quanto tempo? — ele perguntou de repente, sem rodeios. Ergui os olhos para ele. A pergunta parecia neutra, mas havia algo por trás — um aviso sutil, talvez. — Não sei… Só preciso de um tempo pra pensar. Me encontrar de novo. Alexander assentiu devagar, como se minha resposta não fosse uma surpresa. — Se vai ficar aqui, há regras. Franzi o cenho. — Regras? — Sim — ele respondeu, me encarando com firmeza. — Nada de entrar no sótão. Nada de sair à noite sozinha pelos arredores. E nunca, nunca tente descobrir o que eu faço quando estou trancado no meu escritório. Minha garganta secou com aquela última frase. — Você é sempre tão… direto? — É assim que as coisas funcionam comigo. Eu não dou espaço para interpretações erradas. Mordi o lábio, sentindo uma mistura perigosa de medo e fascínio. Ele era diferente de qualquer homem que eu já conheci — e isso era inquietante. — Você não é como os outros homens — deixei escapar, mais para mim do que para ele. Ele soltou um meio sorriso, sombrio. — Graças a Deus, não — disse. — Mas isso tem um preço. Apoiei os cotovelos na mesa, observando-o com mais atenção. Havia algo ali, por trás do controle, do poder. Algo escondido sob a fachada rígida. Uma dor antiga, talvez. Um lobo ferido. — E essas regras existem por quê? — perguntei, ousando ir um pouco além. Alexander pousou os talheres e me encarou com frieza. — Porque essa casa carrega mais segredos do que você imagina. E eu não estou aqui para protegê-la deles… estou aqui para impedir que você os descubra. Um arrepio subiu pela minha espinha. Ele não precisava levantar a voz para me fazer sentir que estava entrando num território perigoso. E, de algum modo, aquilo só me fazia querer saber mais. — E se eu quebrar uma dessas regras? — perguntei, talvez mais impulsiva do que deveria. O sorriso que ele deu não chegou aos olhos. — Então você vai descobrir o lado de mim que ninguém deveria conhecer. O silêncio que se instalou depois disso foi mais denso. Mais pesado. Eu não sabia se ele estava blefando ou sendo brutalmente honesto. Mas tinha certeza de uma coisa: Alexander não era o tipo de homem feito de metáforas. Terminamos o café em silêncio. Quando me levantei, senti o olhar dele me acompanhando como o de um predador observando sua presa — com fascínio e cálculo. E enquanto subia as escadas de volta ao quarto, um pensamento desconcertante me atravessou. Eu não estava com medo. Estava curiosa. E essa curiosidade, eu sabia, seria minha perdição.