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capítulo 5 - A linha invisível entre o querer e o ceder.

Depois daquela conversa, algo mudou de forma irreversível entre Helena e Laura. Não foi uma mudança ruidosa, nem óbvia para quem observasse de fora. Mas, para elas, cada gesto passou a carregar um peso novo, uma intenção silenciosa que antes não existia — ou que, pelo menos, não era assumida.

Nos dias que se seguiram, Helena percebeu que já não conseguia fingir neutralidade. O simples som da porta da sala ao lado se abrindo era suficiente para que seu corpo reagisse. Não era apenas desejo físico — embora ele estivesse ali, latente, pulsando sob a pele —, mas uma necessidade crescente de proximidade, de entendimento, de algo que ultrapassava a atração inicial.

Laura, por sua vez, parecia ainda mais atenta. Não invadia, não cobrava, mas estava presente de um jeito constante. Um café deixado sobre a mesa de Helena sem aviso. Um bilhete curto, quase banal, desejando um bom dia produtivo. Pequenos gestos que, juntos, desmontavam as defesas de Helena com uma eficiência assustadora.

Na quinta-feira à noite, foi Laura quem quebrou a rotina.

— Você vai embora agora? — perguntou, encostada no batente da porta, observando Helena guardar os papéis.

— Estava pensando nisso — Helena respondeu. — Por quê?

Laura hesitou por um breve instante. Um detalhe que Helena passou a reconhecer com facilidade.

— Eu cozinhei demais — disse, por fim. — E odeio comer sozinha quando sei que tem alguém por perto.

O convite era simples. Quase inocente. E exatamente por isso, perigoso.

Helena sentiu o impulso imediato de recusar. Jantar na casa de Laura significava atravessar uma linha clara — sair do espaço neutro, profissional, e entrar em algo mais íntimo. Ainda assim, o cansaço de resistir falou mais alto.

— Tudo bem — respondeu, surpreendendo a si mesma. — Mas só se eu ajudar a comer esse exagero todo.

O sorriso de Laura foi aberto, sincero.

— Combinado.

A casa de Laura era aconchegante, organizada sem rigidez. Havia plantas próximas às janelas, livros espalhados em lugares estratégicos e uma iluminação suave que fazia o ambiente parecer ainda mais íntimo. Helena reparou nesses detalhes com atenção, como se estivesse tentando entender aquela mulher também pelo espaço que ocupava.

— Você mora aqui há muito tempo? — perguntou, enquanto Laura servia o jantar.

— Tempo suficiente para parar de tentar impressionar visitas — respondeu, com um meio sorriso. — E você?

— Eu ainda estou tentando me convencer de que pertenço aos lugares onde fico.

Laura a observou com cuidado antes de se sentar à sua frente.

— Talvez pertença mais do que imagina.

O jantar transcorreu entre conversas tranquilas e silêncios confortáveis. O vinho ajudava a relaxar, mas não era ele o responsável pela proximidade crescente. Havia algo mais forte ali — uma escolha consciente de estar presente.

Em determinado momento, Laura levantou-se para buscar sobremesa, e Helena ficou sozinha à mesa por alguns segundos. Foi então que percebeu o quanto estava vulnerável. Não de um jeito frágil, mas aberto. E aquilo era novo.

Quando Laura voltou, seus dedos se tocaram novamente ao colocar o prato sobre a mesa. Dessa vez, nenhuma das duas fingiu não perceber.

— Helena — Laura disse, em tom baixo. — Posso perguntar uma coisa que talvez mude o clima da noite?

Helena sustentou o olhar.

— Acho que o clima já mudou.

Laura sorriu de leve.

— Você confia em mim?

A pergunta veio direta, sem rodeios. Helena sentiu o peso dela se acomodar no peito.

— Estou aprendendo a confiar — respondeu. — Isso já é mais do que eu planejava.

Laura assentiu, aceitando aquilo como resposta suficiente. Aproximou-se um pouco mais, diminuindo o espaço entre elas até que o silêncio se tornasse quase palpável.

— Eu não quero apressar nada — disse. — Mas também não quero fingir que não sinto o que sinto.

Helena respirou fundo. Seu corpo inteiro parecia atento, alerta.

— E o que você sente?

Laura levou a mão até o rosto de Helena, tocando-lhe a bochecha com delicadeza, como se estivesse pedindo permissão mesmo depois de tê-la recebido.

— Vontade — respondeu. — E cuidado. Os dois juntos.

O toque foi o suficiente para que Helena sentisse a última resistência interna vacilar. Ela fechou os olhos por um instante, inclinando-se levemente em direção à mão de Laura.

— Então me beija — disse, quase num sussurro.

O beijo veio lento, contido, carregado de intenção. Não havia urgência, nem necessidade de provar nada. Era um encontro cuidadoso, exploratório, como se ambas estivessem aprendendo a tocar um território novo. Helena sentiu o mundo se reduzir àquele instante — ao calor, ao cheiro, à presença de Laura tão próxima.

Quando se afastaram, a respiração das duas estava alterada, mas os olhos permaneciam firmes, conectados.

— Eu preciso te dizer algo — Helena falou, antes que qualquer coisa avançasse além daquele limite.

Laura recuou apenas o suficiente para ouvi-la melhor.

— Diga.

Helena engoliu em seco.

— Há partes da minha vida que ainda doem. E coisas que você não sabe sobre mim. Se continuarmos… isso vai vir à tona.

Laura não pareceu surpresa.

— Eu sei — respondeu com suavidade. — E ainda assim, estou aqui.

As palavras se alojaram fundo. Helena sentiu algo se soltar dentro do peito — não completamente, mas o suficiente para permitir mais um passo.

Elas não passaram a noite juntas. Não daquela forma. A escolha foi consciente, respeitosa. Quando Helena foi embora, havia um acordo silencioso entre elas: aquilo não tinha volta.

No caminho para casa, Helena percebeu que o desejo agora vinha acompanhado de coragem. Não total, não perfeita — mas real. E sabia que, se quisesse seguir adiante, teria que enfrentar o que vinha evitando há anos.

O segredo já não estava apenas à espreita. Ele se aproximava do centro da história.

E no próximo encontro, talvez, não fosse mais possível adiá-lo.

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