capítulo 30

NARRADO POR MURALHA

(o homem que carrega a cidade nas costas, mas só se ajoelha por uma mulher)

A cidade ficou pra trás.

Luz demais, gente demais, história demais.

No retrovisor, só a poeira subindo.

Na frente, estrada.

Do lado, ela.

Alana.

Fagulha com pavio curto e orgulho comprido.

A gente não trocou mais que duas palavras desde que entrou na BR.

Mas não precisava.

Cada silêncio entre nós era um grito preso na garganta.

O rádio tocava alguma coisa lenta, grave.

Tipo nós dois: em ponto morto por fora, engatado no inferno por dentro.

Ela ajeitou o vestido mais uma vez, cruzou as pernas, virou o rosto pro vidro.

Mas eu sabia: cada movimento dela era pra testar minha paciência.

— “Vai rodar muito ainda?” — ela perguntou, finalmente.

— “Quase lá.” — respondi, sem tirar os olhos da estrada.

Ela bufou. Aquele bufar que só ela sabia dar: metade desprezo, metade provocação.

Dei seta, entrei numa estradinha de chão batido e, dois minutos depois, virei no estacionamento de um motel escondido e
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