NARRADO POR MURALHA
(o homem que carrega a cidade nas costas, mas só se ajoelha por uma mulher)
A cidade ficou pra trás.
Luz demais, gente demais, história demais.
No retrovisor, só a poeira subindo.
Na frente, estrada.
Do lado, ela.
Alana.
Fagulha com pavio curto e orgulho comprido.
A gente não trocou mais que duas palavras desde que entrou na BR.
Mas não precisava.
Cada silêncio entre nós era um grito preso na garganta.
O rádio tocava alguma coisa lenta, grave.
Tipo nós dois: em ponto morto por fora, engatado no inferno por dentro.
Ela ajeitou o vestido mais uma vez, cruzou as pernas, virou o rosto pro vidro.
Mas eu sabia: cada movimento dela era pra testar minha paciência.
— “Vai rodar muito ainda?” — ela perguntou, finalmente.
— “Quase lá.” — respondi, sem tirar os olhos da estrada.
Ela bufou. Aquele bufar que só ela sabia dar: metade desprezo, metade provocação.
Dei seta, entrei numa estradinha de chão batido e, dois minutos depois, virei no estacionamento de um motel escondido e