Laís
Santa Amora parecia outra cidade à noite. Luzes coloridas tremeluziam em fios cruzando a praça, as barracas soltavam cheiros irresistíveis de milho cozido, pamonha, quentão e bolo de fubá. Crianças corriam com balões, casais andavam de mãos dadas, e no palco montado na calçada da igreja, a sanfona já ensaiava a primeira música.
Laís observava tudo da lateral da barraca da ONG. Seu vestido florido era leve, com as alças finas cruzadas nas costas, e o cabelo solto dançava nas costas com o vento morno da noite. Tia Zuleica havia borrifado o perfume de jasmim no seu pescoço antes de sair de casa. “Homem nenhum resiste a cheiro de flor de noite”, disse, com ar cúmplice.
Mas Laís não se arrumara por causa de homem nenhum. Pelo menos era o que tentava acreditar.
Ela sorria para os visitantes, entregava panfletos e ajudava na pescaria ecológica com Rafaela. Mas sentia — como quem sente o calor de uma fogueira — os olhos de Eduardo nela. O tempo todo. A cada movimento, a cada risada, ela sabia. Ele a observava de longe. E isso deixava sua pele viva demais.
— Menina, se ele olhar mais um pouco, vai começar a pegar fogo. — Rafa murmurou no seu ouvido. — Olha disfarçadamente… ou não. Porque a essa altura, disfarce é perda de tempo.
Laís deu uma risada curta e ajeitou o cabelo, fingindo inocência.
Eduardo
Ele a viu chegar de longe.
Não que estivesse esperando por ela… mas talvez estivesse.
Laís surgiu entre as pessoas como se fizesse parte da própria festa. O vestido leve movia-se com o vento, o cabelo solto refletia as luzes coloridas, e o perfume de jasmim, mesmo à distância, parecia alcançá-lo como uma lembrança boa demais pra ser esquecida.
Ela estava linda. E não era só no sentido estético. Era o tipo de beleza que vinha de dentro — da leveza do riso, da segurança em cada gesto, da naturalidade em pertencer àquele lugar.
E foi aí que bateu de novo: ela pertencia àquela cidade tanto quanto ele. E mesmo tendo ido embora, nunca deixou de ser parte dele.
Eduardo se pegou parado por alguns segundos, observando. Laís rindo com Rafaela. Ajudando uma criança a pescar tampinhas recicláveis na barraca da ONG. Cumprimentando um idoso com respeito. Brincando com Tia Zuleica. Ela cabia ali com a mesma naturalidade com que cabia em suas memórias — só que agora, mais intensa, mais mulher.
Seu peito apertava de um jeito incômodo. Quente. Real.
Ele tentou ocupar-se: ajustar os cartazes, verificar o som da pescaria, puxar conversa com Leandro. Mas os olhos… os olhos voltavam pra ela o tempo inteiro.
Foi quando o locutor da praça anunciou:
— Agora sim, minha gente! Tá formada a quadrilha! Quem não dançar, paga prenda!
A música subiu, as pessoas começaram a se reunir. Eduardo ficou ao lado da barraca da ONG, observando Laís hesitar.
— Vambora, mulher! — Rafa empurrou. — Você é a noiva, olha o vestido florido!
— Eu não sei dançar isso!
— Improvisada, lembra? É só deixar o corpo ir. E tem Eduardo na roda. Vai mesmo perder essa?
Laís bufou, rindo, e foi.
A roda se formou, animada. Eduardo entrou também, meio sem pensar. O ar estava leve, divertido. Mas ele não conseguia prestar atenção em mais nada além dela.
Laís usava um vestido leve, cabelo solto, cheiro de jasmim. Sentiu os olhos de Eduardo a seguindo a noite toda. Quando dançaram uma quadrilha improvisada, ele a puxou com força controlada. O toque dele era firme e quente. Sua pele reagiu antes mesmo da consciência permitir.
Eduardo
Eduardo a viu dançar com outros caras e sentiu algo apertar dentro do peito. Quando foi sua vez, fez questão de segurá-la pela cintura. O cheiro dela, a respiração próxima… ele quase esqueceu a coreografia. E quando os olhos se encontraram, teve certeza: não era só nostalgia. Era desejo mesmo.