Victor apareceu na minha porta à noite. Terno ainda impecável, expressão tensa, olhos indecifráveis. Ele não me avisou que viria, mas meu corpo pareceu saber — como se tivesse esperado aquela batida discreta o dia inteiro.
— Posso entrar? — perguntou, como se pedisse mais do que espaço.
Assenti. Ele entrou devagar, analisando cada detalhe do meu apartamento modesto. Sentou no sofá, largando a pasta de couro ao lado. Respirou fundo.
— Tem algo que você precisa ver — disse, abrindo a pasta.
De lá, tirou um documento de várias páginas. Cabeçalho elegante. Letras pequenas. Parágrafos organizados demais para algo casual.
— O que é isso?
— O verdadeiro contrato — respondeu, me entregando. — O que meu pai queria que você assinasse. O que seria nosso acordo oficial.
Abri a primeira página. Título: "Contrato de Relacionamento Pessoal e Conduta Pública – Aguiar & Filho Holdings."
— Isso parece um manual de comportamento em um relacionamento controlado.
— É exatamente isso. Meu pai adaptou de um documento usado por empresas americanas. Ele acredita em controle emocional como instrumento de poder. E queria que eu usasse isso com você.
Lembrei imediatamente dos rumores sobre “Cinquenta Tons de Cinza”, e senti meu estômago revirar. Era menos explícito, mas igualmente frio. O contrato especificava ações públicas permitidas, exigências físicas opcionais e níveis de envolvimento emocional “controlado”.
Havia uma cláusula que dizia:
“A parte contratada (Isabela Martins) se compromete a manter gestos de afeto físico em eventos públicos, mediante consentimento e com o objetivo de preservar a imagem romântica do contratante (Victor Aguiar).”
Outra dizia:
“Qualquer envolvimento íntimo deverá ser negociado previamente e mantido com discrição absoluta. O uso de sentimentos genuínos compromete o controle do vínculo e, portanto, deve ser evitado.”
— Isso é doentio — falei, jogando o contrato sobre a mesa.
Victor me olhou. Sério. Dolorido.
— Por isso não aceitei. Por isso não te dei antes. O acordo que temos agora... é nosso. Verbal. Real. Mas você precisava ver até onde ele iria. Até onde as pessoas ao meu redor conseguem manipular — disse ele.
O silêncio entre nós era denso. Cheio de tensão. O documento estava ali, como uma lembrança de que o que começamos podia ter sido uma prisão — mas virou algo que nenhum contrato controlava.
— Então, por que veio aqui hoje?
Victor se levantou. Caminhou até mim. Parou bem próximo, com os olhos brilhando de raiva e desejo.
— Porque desde que te beijei... não consigo mais manter distância. Porque você está sob minha pele. E porque hoje eu quero quebrar regras — mesmo aquelas que eu mesmo criei.
— Você quer...?
— Quero te tocar sem permissão corporativa. Quero ouvir sua voz sem estar “nos termos do acordo”. Quero sentir você — sem filtros.
Ele encostou a mão na minha cintura. Me puxou com calma. Não houve urgência. Havia desejo lento, carregado de decisões.
O toque era leve. Mas o olhar... dizia tudo.
— Ainda está dentro do contrato? — perguntei, provocando.
— Agora só existe um artigo: consentimento real.
O beijo veio quente, profundo, cheio de palavras não ditas. Minhas mãos seguraram a camisa dele, puxando com mais força do que imaginei ter. A tensão acumulada explodia entre suspiros, dedos inquietos e gemidos discretos. Ele me deitou no sofá, sem pressa. Como se cada segundo fosse parte de uma negociação emocional.
Mas antes que tudo escalasse, ele parou. A testa encostada na minha.
— Isso não é apenas físico. E isso me assusta — confessou, com a voz rouca.
— E o que você vai fazer com esse medo?
— Lutar contra ele. E contra meu pai. Porque se ele acha que pode controlar o que sinto, está prestes a descobrir o quanto se enganou.