Bem longe de todo aquele drama empresarial, um homem de família, cuidadoso e determinado a fazer de tudo pela mãe doente, estava assinando pela quarta vez uma petição de aumento afim de enviá-la ao RH. Já estava na janela de acesso do setor, assinando seu nome ao fim da folha. Era isso, ou começar a trabalhar de noite em algum bar ou boate — coisa que sentia medo de fazer, pois teria que deixar a mãe sozinha. Aquela era sua última tentativa. Se desse em nada, novamente, então os bares e boates que o aguardassem.
Mas pela mãe, valia à pena todas as tentativas de conseguir pagar um tratamento caríssimo de hemofilia B, no qual dificultava perigosamente a coagulação do sangue. Perdera as contas das vezes em que os médicos ressaltavam sobre repentinas e fatais hemorragias — por essa razão, evitava deixa-la sozinha. Ouvir tais diagnósticos o destruía por dentro... Depois de concluir a petição, o caipira vindo diretamente do interior do Nebraska, deixou o papel no RH da multinacional que trabalhava como faxineiro e se virou. Sentiu o amigo e colega de serviço dar apoio através de um tapa no ombro. Ele mirou seus olhos azuis-celeste no colega, começando a andar. Precisavam limpar os banheiros do segundo andar até dar a hora do almoço. Então soltou, cabisbaixo: — Acho que é perda de tempo... a madame nunca deu nem uma resposta sequer em todas as vezes que pedi o aumento — ele bagunçou os cabelos dourados antes de colocar o boné azul marinho que fazia conjunto com o macacão do uniforme. — Diachos! — Calma, cara. Você pelo menos está tentando — Disse Mike, o outro faxineiro. — Quer dizer, essa gente rica não liga para nós, desde que estejamos trabalhando pra eles. Principalmente a bruaca da nossa chefe. O caipira concordou com a cabeça. — Aposto que ela jogou todas as minhas outras petições no lixo e nem leu. E eu aqui, desesperado! — Ou usou pra limpar o coco dos sapatos... — Mike divagou. — Ou o coco da cara sebosa dela. — Logo eu, que faço tantas horas extras... — Ou talvez ela esteja rindo da sua cara, te chamando de pobre! — Diachos! Me sinto explorado, Mike! A dupla de faxineiros fizeram a curva em um dos largos e lustrosos corredores, avistando adiante deles uma figura feminina impetuosa e elegante demais para sustentar feições tão abatidas. O caipira pensou que ela não dormia há dias: os olhos tão claros e cinzentos contrastando com a escuridão das olheiras que, nem a maquiagem conseguiu despistar. Ao lado dela, quem eles sabiam ser o irmão — até porque eram idênticos. Assistiram os gêmeos passar por eles, como se não estivessem ali. Como se fossem dois dos vasos enfeitando o andar. Ou pior, como se fossem os insetos vivendo nas plantas! Mike rosnou. — Mauricinhos metidos à besta... — Disse alguma coisa? — Evan se virou, olhando para os dois faxineiros. Se vendo com problemas, o moreno de cabelo arrepiado decidiu ajudar o amigo ao invés que jogar na cada dos riquinhos algumas verdades, que só faziam sentido na cabeça dele. Mike se frustrava com os ricos e milionários, mas não tentava fazer nada para mudar sua situação. Ao menos, se parasse de apostar metade do salário em aplicativos de cassinos, teria como investir em um curso ou algo assim. Mas não, ele invejava e reclamava dos bem sucedidos. Com um tapa nas costas, Mike lançou o colega para frente. — Ele precisa falar com vocês. Quer dizer, com a bruaca. Quer dizer... Com a senhorita Kutcher — terminou, sorrindo amarelo. Lennon, seriamente, avaliou-os. — Seja o que for, podem enviar pelo RH. Com a menção da mulher voltar a andar, Jhon adiantou um passo, falando alto demais: — Eu já mandei! — encarou-a. Mike ainda iria pagar por aquela situação constrangedora, no entanto, por hora, aproveitaria a oportunidade. — Enviei três petições, não, quatro com a última desta manhã, pedindo um aumento. Mas nunca tive um retorno. A risada de Evan a seguir pareceu ser um ato de zombaria à ele, mas quando o viu se virar e debochar do RH porcaria que Lennon tinha na filial que presidia, pôde respirar aliviado. Não estavam zombando-o por ser pobre e nem limpando coco com as petições. Só tinham um Recursos Humanos imprestável. — Por que não demite esses inúteis do RH, Lennon? Está claro que não estão fazendo o trabalho deles — Evan se curvou até a irmã, com as mãos nos bolsos. — Ninguém mais te respeita aqui, Lennon. — Por que não vai defecar, Evan? — Nossa, como ela tem etiqueta — debochou de novo. — É cagar que fala. Jhon e Mike trocaram olhares. — Não ligue pra ele — de forma infantil, Lennon ergueu a mão aberta na direção do gêmeo, como uma parede. Sua atenção direcionada ao faxineiro de boné e cabelos loiros escapando. — Irei averiguar suas petições agora mesmo. Me fale seu nome? — Jhon Joseph. — Ok, senhor Joseph. Aguarde meu e-mail — ela estava pronta a se virar, mas a voz insistente do faxineiro voltou a para-la. — Por favor, não ignore meu pedido! — Jhon deu mais um passo, tirando o boné e o contorcendo. Estava desesperado... — Eu faço qualquer coisa. Chego mais cedo, trabalho sem fazer hora de almoço, mas... eu preciso muito ajudar a minha mãe. Ela está doente. Por favor... eu faço qualquer coisa. — Olha, eu não posso permitir que meus funcionários trabalhem sem almoço. O RH poderiam me processar e- — Seu RH nem trabalha, Lennon— Evan se intrometeu, olhando diretamente para o loiro. — Vem cá, você é comprometido? Tem alguma fantasia sexual bizarra ou dst? Não que eu estivesse te julgando, pode acontecer com qualquer um. — Tipo você! — Lennon deu um tapa no braço do gêmeo, entendendo as intenções dele. Ultimamente, Evan só sabia falar em pagar alguém para doar o sêmen. Jhon não conseguiu responder, apenas negou com a cabeça àquela pergunta estranha. — Mas que ótimo! — Evan sorriu, batendo uma palma vitoriosa. — Venha até a sala dela — apontou a irmã. — em uma hora. Novamente, o caipira foi incapaz de responder, concordando com a cabeça enquanto Evan, praticamente, arrastava sua chefe até o elevador do andar. Então coçou a cabeça. — Diachos...