William e Seraphine estavam sentados à mesa da cozinha, ainda em choque com o papel assinado e as alianças sobre a mesa de cabeceira. O silêncio entre eles era denso, mas não desconfortável. Ambos tentavam, em silêncio, juntar os pedaços da noite anterior.
— Precisamos lembrar... — disse Seraphine, encarando o papel.
William passou a mão pelos cabelos, ainda bagunçados.
— Depois do bar... o que aconteceu?
Seraphine fechou os olhos, tentando puxar as memórias. Aos poucos, as imagens começaram a surgir.
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Flashback – A noite em Stormnight
Eles saíram do bar rindo, cambaleando pelas ruas molhadas de Stormnight. A cidade estava silenciosa, envolta por uma brisa leve e o brilho suave da lua refletindo nas poças de chuva.
— Sabe o que seria divertido? — disse William, com um sorriso torto, segurando a mão de Seraphine.
— Comer pizza? — ela respondeu, rindo.
— Casar com você.
Seraphine parou de andar, surpresa.
— O quê?
— É sério. Não tem razão, não tem lógica..., mas tem sentimento. E eu gosto de você. Sempre gostei. — Ele se aproximou, ainda bêbado, mas com os olhos sinceros. — “É uma bela noite, estamos à procura de algo idiota para fazer. Hey, baby! Eu acho que quero me casar com você.” — disse, citando a tradução da música de Bruno Mars “Marry You” que tocava no bar minutos antes.
Seraphine riu, nervosa.
— Você está brincando, né?
William sorriu, ainda mais encantado.
— É esse seu olhar... ou eu que estou bêbado? Quem se importa, querida? Eu acho que quero me casar com você.
Ele começou a cantar a tradução da música que tocava no bar minutos antes, dançando com ela pela rua, sob a luz dos postes e o céu nublado.
— Bom, eu conheço uma capelinha na avenida... nós podemos ir. Ninguém vai saber. Oh, come on, girl.
— Will, você tá bêbado! — disse Seraphine, rindo enquanto ele a girava pela calçada.
— Quem liga se nós estamos bêbados? Eu tenho um bolso cheio de grana que podemos gastar. Doses de Patrón. E tá valendo, girl.
Seraphine ia dizer não, mas William continuou, com um brilho nos olhos e a voz embargada de emoção:
— Não diga não, não, não, não, não... Basta dizer sim, sim, sim, sim, sim. E nós iremos, iremos, iremos, iremos, iremos. Se você estiver pronta como eu estou pronto. — Ele apontou para uma pequena capela iluminada na esquina, como aparecia na letra da música.
Naquele momento, a música começou a tocar em um bar próximo. William a puxou para perto, dançando e cantando para ela como se o mundo tivesse parado.
— Eu vou arranjar um anel. Deixe os sinos do coro cantarem: ooh. Então, o que você vai fazer? Vamos só fugir, girl. E se nós acordarmos e você quiser terminar, tudo bem. Não, eu não vou te culpar. Foi divertido, girl.
Ele girou com ela mais uma vez, molhando os sapatos nas poças da calçada.
— Não diga não, não, não, não, não... Basta dizer sim, sim, sim, sim, sim. E nós iremos, iremos, iremos, iremos, iremos. Se você estiver pronta como eu estou pronto. Porque é uma bela noite. Estamos à procura de algo idiota para fazer. Hey, baby. Eu acho que quero me casar com você.
Seraphine parou, ofegante, o coração acelerado. O olhar de William era tão intenso, tão diferente do homem frio que ela conhecia, que tudo dentro dela pareceu se calar.
— Está aberta. — Ele falou se referindo a capela — Vamos fazer isso. Só por uma noite. Só por nós.
— Tá bom... — ela disse, quase num sussurro. — Eu aceito. Só por uma noite.
William sorriu como nunca antes. Eles correram e entraram na capela iluminada na esquina, rindo e tropeçando nos próprios passos como adolescentes. O pastor olhou para eles com um sorriso compreensivo — já tinha visto aquilo antes.
E ali, William segurou a mão de Seraphine com firmeza, e os dois disseram “sim” entre risos e olhares cúmplices.
Quando saíram, uma chuva leve começou a cair. William tirou o paletó e colocou sobre a cabeça dela, mas Seraphine o empurrou, correndo pela calçada molhada.
— Você está maluca! — ele gritou, rindo.
— Você que me casou bêbada! — ela respondeu, girando sob a chuva.
Eles se abraçaram no meio da rua, molhados, rindo como adolescentes. A cidade parecia ter parado só para eles.
Depois, pegaram um táxi, ainda rindo, ainda bêbados, ainda casados. Chegaram ao apartamento dela e desabaram na cama, sem pensar nas consequências.
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De volta ao presente...
— Foi isso... — disse Seraphine, com a voz baixa.
William olhou para ela, ainda segurando o papel.
— Eu realmente te pedi em casamento.
— E eu aceitei.
Eles se encararam por um longo tempo. A chuva batia suavemente na janela, como se Stormnight estivesse lembrando junto com eles.
— E agora? — perguntou Seraphine.
William sorriu, ainda confuso, ainda encantado.
— Agora... estamos casados.
Seraphine encarava as alianças sobre a mesa como se fossem dinamite prestes a explodir. A expressão em seu rosto oscilava entre pânico e incredulidade.
— Jesus... como você pode estar tão calmo, Will? — ela disparou, levantando-se de repente. — Literalmente nos casamos bêbados! Pior ainda! Como o padre nos casou? Ele não viu que estávamos bêbados? O que eu vou dizer pra Nyx? Oh, meu Deus... e ainda tem seus pais? Eu vou surtar.
Ela começou a andar de um lado para o outro na cozinha, os passos apressados ecoando no piso de madeira. William se levantou devagar, caminhou até ela e segurou seus braços com firmeza, mas com delicadeza.
— Hey, calma. Tecnicamente, pra minha família, você já era minha esposa. Lembra? A mentira. E a Nyx já seria minha filha.
Seraphine o encarou, os olhos arregalados.
— Isso não é brincadeira, William. Uma coisa era uma mentira..., mas agora... agora é real. Legalmente, eu sou sua esposa. Acabamos casados por acidente.
Ela respirou fundo, tentando se acalmar. William manteve o olhar firme.
— Eu sei. Mas, ei... podemos separar se você quiser. Só... lembra do que eu te pedi ontem à noite? Sobre fingir ser minha esposa? Para minha família?
— Você vai insistir nisso?
— Seraphine, por favor. E agora que estamos mesmo casados... não seria de tudo uma mentira quando eu disser que nos separamos.
Ela mordeu o lábio inferior, pensativa. O silêncio entre eles era carregado de tensão e lembranças.
— Hum...
William se aproximou mais um pouco, os olhos suplicantes.
— Por favor. Me ajuda, vai.
Seraphine desviou o olhar para a janela, onde a chuva começava a engrossar. Stormnight parecia conspirar com o destino, como se a cidade soubesse que algo havia mudado para sempre.
Ela voltou a encará-lo, ainda sem saber o que dizer. Mas no fundo, uma parte dela sabia: aquele casamento acidental talvez não fosse tão errado assim.
Seraphine voltou a fixar os olhos nas alianças quando William se aproximou novamente, com um sorriso leve nos lábios.
— Você sabia que nossa cidade tem uma lenda local? — ele disse, com a voz baixa, quase como se estivesse contando um segredo. — Que quem se casa em Stormnight sob a chuva... nunca se separa.
Ela o olhou, surpresa.
— Você está brincando.
— Não estou. É uma daquelas histórias que os velhos contam nos cafés do centro. Dizem que Stormnight escolhe os casais que devem ficar juntos. E quando a chuva cai no dia do casamento... é como se a cidade estivesse abençoando.
Seraphine cruzou os braços, tentando manter a racionalidade.
— Isso é só uma superstição.
— Talvez. Mas... nós nos casamos. E choveu. — William deu um passo à frente. — E agora estamos aqui. Juntos.
Ela desviou o olhar, sentindo o coração acelerar.
— Isso não muda o fato de que foi um acidente. Um impulso. Nós estávamos bêbados.
— Sim. Mas e se... só por um segundo... a gente parar de pensar no que foi errado e olhar para o que pode dar certo?
Seraphine mordeu o lábio inferior, pensativa. A chuva continuava a cair lá fora, suave, constante, como se Stormnight estivesse ouvindo cada palavra.
— Você está dizendo que deveríamos... tentar?
William deu de ombros, mas seus olhos diziam mais do que ele deixava transparecer.
— Estou dizendo que talvez a cidade saiba mais do que a gente. E que, mesmo que tenha sido um acidente... talvez não tenha sido um erro.
Seraphine respirou fundo. A lenda, a chuva, o olhar dele... tudo parecia conspirar para que ela dissesse sim. Mas ela ainda não estava pronta.
— Eu preciso pensar.
— Eu sei. Só queria que você soubesse... que eu não me arrependo.
Ela o encarou por um longo tempo. E pela primeira vez, viu no olhar de William algo que nunca tinha visto antes: sinceridade sem defesas.