DORIAN
Ela está linda.
Mas claro que está. Lara sempre soube entrar em uma sala como se fosse dona dela — mesmo quando tudo que tinha era o silêncio entre uma palavra e outra. Agora, sentada do outro lado da limusine, com um vestido preto colado ao corpo, maquiagem discreta e expressão indecifrável, ela parece mais perigosa do que nunca. Não para mim. Mas para ela mesma. Porque eu ainda me lembro de tudo. E ela finge que esqueceu. Cruzo as pernas com calma. O terno me veste como uma armadura, e cada botão abotoado é mais uma camada entre o que eu sou e o que o mundo vê. — Você não vai dizer nada? — ela pergunta, finalmente. — Estou observando. Ela arqueia uma sobrancelha. — Você observa como quem avalia. — Porque é exatamente o que estou fazendo. Ela solta um suspiro, vira o rosto para a janela. Não está acostumada a ser examinada — e menos ainda por mim. Mas essa é a vantagem de conhecer alguém tão bem: você enxerga até o que ela não quer mostrar. — Vamos a um evento com investidores internacionais — digo. — Preciso que você esteja à altura. Ela volta a me encarar, devagar. — Acha que não estarei? — Acho que você tem um talento inato para sabotagem. — Só quando estou entediada. — Espero que eu consiga mantê-la ocupada, então. Ela sorri, mas não é um sorriso doce. É cortante. E familiar. — Vai me dar uma lista de regras, Dorian? — Claro. Ela se vira completamente, cruzando as pernas com um movimento que sabe chamar atenção. É teatral, ensaiado. Funciona. — Estou ouvindo. — Primeira regra — começo, com os olhos nela. — Você vai sorrir. Sempre que for apresentada, cumprimentar alguém ou for abordada por jornalistas. Sorrisos calculados. Nada espontâneo demais. Ela finge anotar mentalmente, balançando a cabeça. — Segunda? — Você vai me tocar. De leve. No braço, no ombro, no peito, se for o caso. Vai parecer íntima. Mas não desesperada. Você é minha esposa. Não uma fã. — Entendido. Sutileza possessiva. Mais alguma diretriz marital? — Vai ficar do meu lado. O tempo todo. Sem desaparecer no coquetel, sem fugir para o banheiro por vinte minutos como fazia antes. Ela engole em seco. Ponto para mim. — Próxima regra? — Quando alguém perguntar sobre nosso casamento, você vai sorrir e dizer que foi inesperado, mas inevitável. — E isso é uma frase sua ou do contrato? — Ambas. Ela se inclina levemente para frente, como se estivesse prestes a dizer algo perigoso. E está. — Você está se divertindo? — Muito. — Isso aqui é sobre negócios, Dorian. Mas está transformando tudo em um circo particular. — Porque você é o espetáculo perfeito. Ela ri. Curta. Irônica. Mas há algo nos olhos dela que não era visível até agora. Ela está sentindo. — Última regra — digo, com a voz mais baixa, a entonação mais lenta. — Vai me olhar nos olhos. Sempre que alguém nos observar. E vai parecer que está apaixonada. Ela me encara, desafiadora. — Fácil. É só lembrar do quanto você me enlouqueceu. — Acha mesmo que pode me provocar sem consequências? — Não estou provocando. — Está, sim. Ela se encosta no banco, os braços cruzados. Mas não desvia o olhar. Nunca desvia. — E se eu quiser mudar as regras? — Não vai querer. — Talvez eu queira ditar algumas também. — Lara… — Me inclino. Estamos perto demais. — Esse jogo foi criado por mim. Você está apenas sendo convidada a jogar. — E se eu quiser ganhar? — Já perdeu no momento em que entrou naquele escritório com os olhos suplicantes e a voz falha. Ela endurece. Por fora, continua altiva. Mas por dentro… eu a vejo tremer. — Eu entrei porque não tinha escolha. — Entrou porque sabia que, no fundo, ainda existia algo aqui — toco o peito, devagar — que reconhecia isso aqui. Ela ri com desdém, mas os olhos a traem. Estão escuros. Brilhantes. Quase… úmidos. Eu me aproximo mais um pouco. A distância entre nossos rostos é quase inexistente. Posso sentir o perfume suave dela. Canela e flor de laranjeira. O mesmo de antes. Filha da mãe. Ela usa o mesmo perfume de quando me deixou. — Se você continuar me desafiando — murmuro, com os olhos cravados nos dela — vai acabar implorando por mim. Ela se mantém firme. Por fora. Mas o pescoço entrega. Um leve arrepio. A pele erguida como quem foi tocada por eletricidade. E então, sem aviso, ela se afasta. Volta para o canto da limusine, como se a distância pudesse protegê-la. — Você gosta disso, não é? — Gosto do controle — admito. — E se perder? — Eu nunca perco. A limusine desacelera. As luzes do evento refletem nas janelas. Os flashes já estão ali fora. Uma multidão nos espera. Ela ajeita o vestido com calma. Cruza as pernas com delicadeza. Respira fundo. E então diz, sem me olhar: — Vamos ver quem sobrevive primeiro, Dorian. O seu controle ou a minha resistência. A porta se abre. Ela estende a mão para mim. E eu sorrio. Porque esse jogo… está só começando.