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Capítulo 1: Corte os laços

Estávamos todos reunidos na casa principal do Alfa Tyron Benedict, chefe supremo da alcatéia Garra Dourada.

O salão era amplo, imponente, com paredes de pedra escura e tochas acesas que lançavam sombras dançantes sobre os rostos sérios dos presentes. O ar estava carregado de tensão. Eu sentia cada olhar sobre mim como se fossem garras invisíveis prontas para julgar.

Hoje, o vínculo que eu e Lucius selamos quatro anos atrás seria desfeito.

Na nossa matilha, tudo gira em torno da hierarquia imposta pela Deusa da Lua. Desde o nascimento, cada filhote é submetido ao ritual lunar — um momento sagrado que define seu lugar na sociedade.

Ômegas, Betas, Alfas. Três castas. Três destinos. E nenhuma escolha.

Filhos de Ômegas quase sempre são Ômegas. Filhos de Betas, Betas. E os raros herdeiros Alfa... bem, esses são escolhidos a dedo. Mas apenas os machos.

Fêmeas Alfa são consideradas aberrações, erros do ritual. Lendas dizem que algumas nasceram, mas foram eliminadas antes mesmo de aprenderem a uivar.

Eu sempre odiei esse sistema. Essa ideia de que uma deusa decide quem vale mais. Que sangue define valor. Que destino é sentença.

Meus pais eram Ômegas. Eu e meu irmão, Aiden, também. Nosso futuro foi selado antes mesmo de abrirmos os olhos.

Como se não bastasse, meu pai nos abandonou. Virou um desertor. Deixou minha mãe grávida e fugiu da alcateia como o covarde que sempre foi.

Minha mãe, marcada pela dor, nos ensinou a desconfiar de tudo. A não contar com ninguém. A sobreviver sozinhos.

Ela também se fechou. Sempre foi uma Ômega muito respeitada por sua postura orgulhosa e poderosa, sem se curvar para ninguém.

Aiden sempre foi um garoto sensível, por isso foi o que mais sofreu com as duras lições da nossa mãe. Cada dia éramos moldados de forma a esconder fraqueza, sentimentos, demonstrando apenas frieza, impassibilidade e ameaça no olhar.

Máquinas. Construídas para sobreviver com certa dignidade num sistema que foi feito para nos humilhar e rebaixar.

E foi assim que eu vivi.

Até Lucius aparecer.

Eu tinha quinze anos quando despertei Freya, minha loba. É um marco para qualquer jovem da matilha. O dia em que nos tornamos completos. O dia em que deixamos de ser apenas humanos.

Conhecer seu lobo, uma entidade lupina ancestral que nos acompanhará por toda nossa vida, nos permitindo assumir nossas formas de lobo, é um evento carregado de simbolismo ancestral.

Por tradição, é celebrado com uma grande festa — mesmo para os Ômegas.

Foi a primeira vez que me senti parte de algo. Que me permiti sorrir sem medo.

Toda a matilha reunida como uma só, celebrando nossas raízes e tradições. Celebrando cada indivíduo que passaria pelo maior rito de suas vidas.

E foi ali, em meio da festividade e alegria, que o vi: Lucius Lounge. Um Beta de olhos verdes como esmeraldas e cabelos negros como os meus.

Seu sorriso parecia refletir a própria luz da lua. Rindo entre outros lobos na festa.

Ele já havia despertado seu lobo, e parecia tão seguro, tão... livre.

Conversamos a noite inteira. Corremos juntos pela floresta nos dias seguintes. E nos anos seguintes.

Ele dizia que sentia algo profundo entre nós, que éramos feitos um para o outro. Que, quando eu completasse dezoito anos, idade em que os lobisomens podem identificar seus parceiros, tinha a certeza de que o vínculo predestinado se revelaria.

Mas não se revelou.

No meu aniversário, nada aconteceu. Nenhum sinal. Nenhuma conexão divina.

Mesmo assim, Lucius insistiu. Disse que o que sentia era mais forte que qualquer laço imposto. Que me escolheria, mesmo sem o aval da deusa.

E eu acreditei. Porque eu também o escolhi.

Vivemos lindos quatro anos juntos. Que agora, parecem um sonho esquecido.

Tudo que construímos juntos com nossas próprias mãos. Todos os planos criados.

Hoje, tudo isso virou pó.

— Vocês dois estão aqui para desfazer o vínculo de casamento, estou certo? — a voz do Alfa líder ecoa pelo auditório, firme como pedra.

— Sim, Alfa Líder. — Lucius responde ao meu lado.

Ele ainda não olhou nos meus olhos. Nem uma vez.

Não consigo conceber o quão covarde ele se tornou.

— Pelo que entendi, você, Lucius Lounge, escolheu Artemísia Goldryn como sua companheira há quatro anos, selando o vínculo diante da Deusa da Lua e da matilha Garra Dourada. Com que justificativa solicita o rompimento desse laço sagrado?

A pergunta paira no ar como uma sentença.

Eu permaneço calada, os punhos cerrados, o coração em guerra.

— Eu encontrei minha parceira predestinada, Alfa Líder. E desde então, percebi que o vínculo de companheiros é mais forte do que tudo que já senti. Romântica e espiritualmente falando.

A voz dele é firme. Convicta.

A mesma que um dia me disse “eu te amo” com lágrimas nos olhos.

Enquanto Lucius falava, flashes de memória invadiam minha mente.

A primeira vez que ele segurou minha mão, prometendo que nunca me deixaria.

As noites em que ele me consolou, dizendo que eu era mais forte do que qualquer ômega que ele já conhecera.

As corridas na floresta. O toque mais íntimo de nossas almas entrelaçadas.

Agora, sua voz soa como uma lâmina fria.

O Alfa Líder pondera, os olhos semicerrados.

— Quem é sua companheira predestinada?

— Elise Benedict, senhor.

O nome cai como uma bomba.

A filha mais nova do Alfa. Uma Beta de prestígio. A favorita da matilha. A perfeita.

Linda como uma joia bruta.

A surpresa do Alfa é sutil, mas perceptível.

A minha, impossível de esconder.

Assim como a dos membros presentes.

Elise. Claro que era ela.

— Com sua licença, Alfa Líder, expresso diante de todos meus sentimentos genuínos por Elise. Ela é uma fêmea incrível, gentil e brilhante. Sei que o laço nos atraiu, mas sua personalidade única me arrebatou.

— Eu a amo incondicionalmente. — ele finaliza.

Cada palavra dele é um golpe.

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