A nova edição da Luxury Times estava sobre minha mesa, entregue mais cedo por Sophie com um olhar apreensivo. Não precisei abrir. A capa dizia tudo.
“Redenção” — A nova coleção da Walker & Co. Lentamente, folheei a revista, cada página exalando a assinatura fria e calculada de Nathaniel Walker. Diamantes em cortes ousados, uma paleta sóbria, modelos com traços familiares demais. Eu reconhecia aquelas estratégias. O que ele estava vendendo… era dor envernizada de arrependimento. Fechei a revista com calma e a empurrei para a lateral da mesa, como quem descarta um objeto irrelevante. Então era isso. Um pedido de desculpas disfarçado de publicidade. Voltei meus olhos ao notebook, à nova proposta de expansão da Bennet Crown para o mercado europeu. Meu tempo valia mais que uma campanha vazia da concorrência. A porta se abriu sem anúncio. Não precisei levantar os olhos. — O que você está fazendo aqui? — minha voz saiu firme. — Sua presença nesse prédio é estritamente proibida. Pretendo demitir cada um dos seguranças que falharam em impedir isso. Nathaniel Walker parou no meio da sala, como se só então percebesse que invadir meu mundo de novo seria mais difícil do que esperava. — Eliza, eu… — Não me chame assim. Você não tem intimidade para isso, sou a CEO da Bennet Crown. E você… não é nada além de um invasor. Ele respirou fundo, tentando manter a compostura. A mesma que costumava me desarmar e que agora só me entediava. — Eu precisava te ver. — disse. — Uma ligação, então. Um e-mail. Um agendamento, como qualquer outro fornecedor ou rival. — dei de ombros. — Mas isso? Isso é um ato de desespero. Quase patético. — Eu vi sua nova campanha. — E eu vi a sua. — caminhei até a lateral da mesa, os saltos ecoando pelo piso de mármore. — “Redenção”. Um nome apropriado, considerando o que você fez. E o que perdeu. — Eu errei, Eliza. E estou aqui pra reconhecer isso. — Reconhecer? — arqueei uma sobrancelha. — Você me ignorou durante dois anos. E agora aparece aqui porque viu meu rosto na capa de uma revista? — Eu te procurei. Fui atrás de você, tentei te rastrear, mas você sumiu do mapa. — Claro que sumi. — rebati com frieza. — Foi exatamente isso que eu quis: desaparecer da sua vida da mesma forma que você desapareceu da minha dentro daquele maldito apartamento. Nathan recuou um passo, e eu percebi. Pela primeira vez, o CEO da Walker & Co. vacilava. — Eliza, eu me arrependi. Eu não sabia o que sentia… — Não sabia? — minha risada foi seca. — Você me usou, Nathaniel. Casou comigo pra destruir o legado da minha família. E quando achou que tinha vencido, me descartou como se eu fosse mais uma joia falsa no meio da sua vitrine de poder. Ele fechou os olhos por um instante, pressionando os dedos contra a ponte do nariz. — Eu pensei que me casando com você estaria vencendo uma guerra. Mas, no fim, perdi tudo. Inclusive você. — Engano seu. — rebati. — Você nunca me teve. Me aproximei, olhando nos olhos dele. — Tudo que você teve foi uma mulher apaixonada, cega, disposta a abrir mão de um império por amor. E você desperdiçou. Ele balançou a cabeça, os olhos brilhando como se as palavras o ferissem mais do que qualquer guerra corporativa. — Eu quero recomeçar. Mesmo que leve anos. Eu quero reconquistar você. Dei um passo atrás, como se criasse um espaço simbólico entre nós. — Nathan, isso não é um jogo de recuperação de ativos. Eu não sou uma fusão estratégica. E o amor que um dia eu senti por você… foi enterrado com cada noite em que você me ignorou. — Você está dizendo que não sente mais nada? Nem um resquício…? Meus olhos se estreitaram. Meu tom não vacilou. — Eu sinto. Ele pareceu acender por um instante. — Raiva. Frustração. Pena. Nathan fechou os olhos como se tivesse levado um soco no estômago. — E se eu disser que te amo? Inclinei levemente a cabeça. — Então guarde esse amor. Porque aqui, na presidência da Bennet Crown, não temos espaço para declarações tardias. E então voltei para minha mesa, abri a pasta de reuniões do dia e disse, sem sequer olhar pra ele: — A porta está logo atrás de você. Pode usá-la antes que eu chame a segurança pessoal. Ele hesitou por um segundo. Depois virou-se em silêncio. O som dos passos dele ecoando na sala me lembrou de tudo que já fui. E de tudo que nunca mais seria. Assim que a porta se fechou atrás de Nathaniel Walker, o ar na sala pareceu mudar. Mais leve, mais silencioso… mas também mais denso. Como se algo antigo tivesse sido exorcizado, e ao mesmo tempo, deixado marcas profundas no chão de mármore polido. Apoiei as mãos na beirada da mesa. Ainda sentia o perfume dele no ar, como um fantasma insolente tentando me lembrar do que fomos ou do que fingimos ser. “Eu te amo”, ele disse. Como se amor fosse suficiente para apagar dois anos de abandono. Como se amor justificasse frieza, silêncio e olhares que atravessavam meu corpo como se eu fosse invisível. Fechei os olhos por um breve momento, permitindo que a dor antiga viesse como um tremor leve, controlado. Não era mais um terremoto. Era apenas memória. Uma cicatriz que já não sangrava. Peguei a revista novamente e a joguei no lixo com a precisão de quem descarta um acessório fora de moda. A coleção Redenção dele. Que ironia. Redenção exige sacrifício. Exige coragem. Exige amor verdadeiro e Nathan só conhecia o amor quando sentia que o estava perdendo. Voltei à minha cadeira de couro, imponente como um trono. Peguei a caneta, abri a pasta da próxima campanha da Bennet Crown e me forcei a voltar ao presente. Minha imagem estampava as capas mais influentes do mundo da moda e dos negócios. Eu era o novo rosto de uma geração que comandavam legados. E, desta vez, eu não estava apenas à frente de uma empresa. Eu era a Bennet. A herdeira. A CEO. A mulher que sobreviveu ao abandono, e retornou mais valiosa do que qualquer diamante na vitrine de Nathaniel Walker. Meu interfone tocou. — Senhora Bennet? A reunião com os investidores internacionais começa em dez minutos. — Ótimo, estou descendo. Me levantei, ajeitei o blazer claro sobre os ombros e encarei meu reflexo no espelho lateral. Estava impecável. Não havia mais vestígios da mulher que um dia esperou jantar com o marido até as 23h, num apartamento silencioso demais para o amor. Agora, o mundo inteiro me escutava. E quem quisesse me alcançar… teria que brilhar mais do que eu.