A noite em volta da rodoviária era um organismo diferente. Se a Lapa era um poço estagnado de desespero, a rodoviária era um rio de ansiedade. Um fluxo constante de chegadas e partidas, de abraços de despedida e olhares de reencontro. Para cada pessoa que chegava em busca de um sonho, outras cinco partiam com ele estilhaçado na bagagem. Era um lugar de transição, um purgatório de concreto onde o destino de muitos era selado com a compra de uma passagem de ônibus.
Gabriel chegou a pé, movendo-se pelas bordas da multidão. Ele era uma pedra no rio, imóvel enquanto a correnteza de vidas passava por ele. O cheiro aqui era de diesel queimado e café requentado. As luzes brancas e frias da estação davam a todos uma aparência pálida, fantasmagórica.
Ele sabia que o tipo de "atravessador" que o barman mencionou não ficaria dentro da estação, sob o olhar das câmeras e dos policiais. Ele operaria nas sombras, nos pequenos bares e lanchonetes 24 horas que orbitavam a rodoviária como luas decadente