CAPÍTULO 8 – O FILHO DO MEIO

– As Cinzas do Que Foi Esquecido)

ISTAMBUL – MOSTEIRO DAS RUÍNAS VERMELHAS – 03h03

O silêncio era sepulcral. As velas tremeluziam entre os vitrais quebrados, lançando sombras tortas nas paredes pintadas com sangue antigo. Ali, onde um dia se celebraram pactos de guerra e nascimento de impérios, agora repousava um único homem ajoelhado.

Ele vestia preto dos pés à cabeça. O rosto parcialmente coberto por uma máscara de tecido cinza. As mãos repousavam sobre os joelhos — firmes, calejadas. O nome gravado no altar à sua frente era familiar… e proibido.

DOMENICO.

Ao seu lado, um diário com capa de couro negro. E dentro dele, o juramento que jamais foi lido em voz alta.

“Se um dia a guerra nascer dos meus filhos…

Que aquele que for o meio,

Traga o fim.”

A voz do Cardeal ecoava em sua mente. A profecia esquecida. A verdade que ninguém quis escutar.

Domenico abriu os olhos.

— Leonardo jogou o fogo. Rael atiçou o caos. Agora… sou eu quem escolhe quem vai queimar.

Ele se levantou. A vela se apagou sozinha.

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FLASHBACK – MILÃO – 15 ANOS ATRÁS – HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DESATIVADO

O jovem tinha 7 anos. O nome dele? Nenhum. Chamavam-no apenas de Príncipe. O menino com olhos cor de sangue. Nascido de um ventre apagado, fruto de uma noite que nunca foi registrada.

Uma mulher o visitava toda semana. Pele pálida, cabelo vermelho, sotaque argentino. Nunca dizia seu nome. Apenas lhe entregava cartas escritas por alguém chamado Dominick. Ele lia com dificuldade.

"Você é meu segredo mais perigoso, Domenico.

E por isso, te escondi de todos.

Mas um dia… eles vão precisar de você.

E você terá que decidir se é Santorini…

Ou Vasquez.

Ou algo pior."

Aos 10 anos, Domenico sumiu.

E ninguém nunca mais falou dele.

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GENEBRA – MANSÃO SANTORINI – 09h17

Leonardo revia os arquivos do vírus, as perdas, os erros. Estava cada vez mais cercado, cada vez mais sozinho. Ravena dormia no sofá ao lado, arma no colo. Mikhail fazia curativos no braço.

Alys entrou, pálida.

— Temos um problema.

— Outro?

— Recebi uma mensagem dos arquivos secretos de Dominick.

— E?

Ela mostrou o papel. Era o selo de Dominick com três letras em vermelho: D.O.M.

— “Se as trevas se dividirem em dois, o terceiro as acenderá.” — leu Leonardo. — Isso é uma citação do diário dele.

— E tem mais — disse Alys. — Essa citação aparece em documentos antigos… sobre um filho renegado.

Leonardo levantou os olhos.

— Impossível. Dominick teve apenas um filho: meu pai. E ele me teve.

Alys engoliu seco.

— Você não conhece toda a história.

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MOSCOU – BASE SOMBRA – 10h40

Rael derrubava tudo em seu laboratório. O caos do vírus, a perda dos protótipos, o erro de cálculo. Nada importava agora. Mas algo gelou sua espinha quando Ilona o chamou:

— Senhor… alguém acessou os arquivos do Nascimento Zero.

Rael congelou.

— Isso é impossível. Só Giuliano tinha aquela chave.

Ela virou a tela.

— Mas foi usada. Há 42 minutos. Em Istambul.

Rael leu a mensagem codificada.

“Dom, estou aqui. E sei o que você fez com ela.”

Ele estremeceu.

— Não…

— Quem é “Dom”?

Rael cerrou os dentes.

— Domenico. O verdadeiro herdeiro do meio.

Ilona arregalou os olhos.

— Ele não estava morto?

Rael olhou para o horizonte.

— Pior. Ele estava esperando.

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ISTAMBUL – RUA DAS QUARENTA LÂMPADAS – 14h03

Aos olhos comuns, ele era apenas mais um estrangeiro no mercado. Mas os mais atentos notavam: ele não tinha pressa, nem sombra. Passava despercebido até quando encarava.

Domenico entrou em uma loja de relíquias. Lá, uma senhora idosa o reconheceu com um tremor.

— Você voltou…

Ele sorriu, mas não havia bondade naquele gesto.

— Vim buscar o que deixaram para mim.

Ela entregou um pequeno estojo de madeira. Dentro, uma corrente. Nela, dois anéis: um com o brasão dos Santorini, outro com o dos Vasquez.

— Você é o fim da guerra, menino.

— Eu sou o que não deveria existir.

E saiu.

GENEBRA – MANSÃO SANTORINI – 20h17

A chuva batia forte nas janelas quando o alarme interno foi disparado. Ravena ergueu-se num salto, pistola em mãos. Matteo surgiu do subsolo com expressão de urgência.

— Intruso no setor leste. Sozinho. Sem armas visíveis. Entrou pelo jardim.

— Como assim entrou? — esbravejou Leonardo.

— Pela porta da biblioteca… usando o código de Dominick.

Silêncio.

Leonardo puxou sua pistola e caminhou pelos corredores. As paredes, cobertas com retratos de guerra e glória, pareciam agora sufocar o ar.

Quando a porta se abriu, ele o viu.

Domenico.

Parado entre livros e sombras. Cabelos escuros caindo sobre os olhos, corpo esguio mas imponente, vestindo um sobretudo molhado.

— Você...

— Sou o que você deveria ter conhecido antes da guerra começar — respondeu Domenico, sem sorrir.

— Quem te enviou?

— Ninguém. Eu vim porque vocês perderam o controle. Rael está jogando com cadáveres e você… com fantasmas.

Leonardo apontou a arma.

— Prove que é quem diz ser.

Domenico tirou a corrente do bolso. Jogou-a no chão. Os dois anéis tilintaram.

Leonardo os reconheceu na hora.

— Impossível…

— Dominick Santorini era meu avô. Giuliano Vasquez, meu criador. E minha mãe… bom, ela morreu antes que pudessem decidir de qual lado eu pertencia.

Leonardo hesitou. Sua mão tremia.

— Isso é algum truque.

— Não, irmão. Isso é a maldição viva de tudo o que vocês esconderam.

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SALA DE GUERRA – 21h03

Ravena e Mikhail ouviam enquanto Domenico contava tudo. Como foi criado entre clínicas, igrejas e laboratórios. Como fugiu do controle de Giuliano. Como viu Dominick visitá-lo apenas uma vez — e nunca mais.

— Ele teve medo de mim. Porque eu não chorava. Porque lia os relatórios de guerra com 6 anos. Porque... eu perguntava por que não podia morrer.

A sala estava em silêncio.

— E agora, por que voltou? — perguntou Leonardo, finalmente.

Domenico olhou para todos.

— Porque Rael usou meu DNA para estabilizar Nêmesis.

Ravena engasgou.

— O quê?

— Eu sou o modelo original. O protótipo biológico zero. Sou o único que pode destruir todos os outros. Mas também… o único que pode ativá-los de forma perfeita.

Leonardo se levantou num salto.

— Isso faz de você…

— A chave da extinção ou da dominação.

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FLASHBACK – BASE VASQUEZ – 7 ANOS ATRÁS

Giuliano Vasquez olhava para o adolescente de 13 anos preso a tubos e sensores.

— Você é a única coisa que prestei em toda a minha vida.

— Por isso me aprisiona?

— Porque o mundo não está pronto para o que você é.

— Ou você tem medo de que eu destrua tudo que construiu.

Giuliano sorriu.

— Você não será libertado por mim. Mas quando for… queime os dois tronos. E crie o seu próprio inferno.

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GENEBRA – TERRAÇO DA MANSÃO – 23h14

Leonardo e Domenico estavam frente a frente sob a chuva fina.

— Eu te odeio por existir — disse Leonardo.

— E eu te odeio por ter sido criado para vencer — respondeu Domenico.

— Somos o mesmo sangue.

— Mas não o mesmo legado.

— Então por que veio?

Domenico respirou fundo.

— Porque se você morrer, Rael vence. E se ele vencer… o mundo perde.

Leonardo passou a mão pelos cabelos, exausto.

— Você quer o trono?

— Não. Eu quero queimar o tabuleiro.

Leonardo sorriu pela primeira vez naquela noite.

— Então você realmente é um Santorini.

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