O som da chaleira apitou. Tirei do fogo antes que queimasse, mas deixei a água ali mesmo, esquecida. Matheus estava no quarto desde que acordou, andando de um lado para o outro. A cada passo, o ranger do piso de madeira parecia traduzir o que ele não dizia: angústia, raiva, medo.
O interfone tocou. O aviso soou calmo demais para a tempestade que se aproximava.
— Dona Julia, o Sr. Alcântara está subindo.
Engoli seco.
Matheus saiu do quarto pouco depois, pálido, mas com o queixo erguido. Vestia uma camisa preta, desbotada nas pontas da gola, e os olhos tinham a expressão de quem travava uma guerra interna há dias.
— Ele tá vindo, né? — perguntou, sem me encarar.
— Sim.
— Você pode ficar?
— Claro.
Ele passou as mãos nos cabelos e respirou fundo, como se precisasse colocar uma armadura invisível.
A campainha tocou.
Abri a porta e o pai de Matheus entrou com a imponência de quem nunca aprendeu a pedir licença. O terno cinza-escuro era perfeitamente alinhado ao corpo magro. O cheiro dele er