“Às vezes o parto é só a forma como arrancam alguém de você.” — (Anotação de R.)
[... continuando flashbacks de Renata e narrativas de Guilherme, no presente]
Tem coisas que eu não lembro porque não podia lembrar.
Tem coisas que eu lembro com o corpo, mesmo que a cabeça ainda tente negar.
E tem o resto, que foi o Alexandre — Guilherme — quem me contou, com a voz cansada de quem também nunca mais saiu inteiro daquela sala.
O que ficou é um mosaico torto disso tudo.
A sala
Da minha parte, o que eu tenho na memória é primeiro o cheiro.
Nem jasmim, nem mofo. Álcool. Muito álcool. E aquele desinfetante adocicado de hospital que se enfia no fundo da garganta.
Luz demais. Não como na ala da Casa, com abajur de sedução e sombra calculada.
Luz branca, fria, agressiva. Teto quadrado, placas de gesso. Ar-condicionado tão gelado que a pele arrepiava, embaixo da camisola fina.
Eu estava deitada numa maca, barriga pesada sob um lençol azul que cobria tudo da cintura pra baixo. Havia um campo cirúr