A mesa estava posta com o cuidado habitual de Gertrudes. Ana servia os netos com um sorriso discreto, e José ajudava Nina a cortar um pedaço de carne. Clara, visivelmente incomodada, mantinha o olhar baixo, enquanto Augusto tentava puxar conversa sobre a próxima visita dos Marcondes. João, em silêncio, mexia o arroz no prato.Amanda chegou por último. Usava um vestido escuro, os cabelos presos e o olhar firme. Sentou-se, agradeceu o jantar com educação, mas o silêncio que pairava era pesado demais para não ser percebido.— O que houve? — perguntou Ana, tentando quebrar a tensão.Ninguém respondeu de imediato, até que Clara soltou, sem olhar para ninguém:— Às vezes, a verdade escapa por entre as frestas. E quando escapa... fere.Amanda virou o rosto para Clara e, com uma calma que deixava no ar a força de suas palavras, falou:— Se você está se referindo a mim e ao João, Clara... então escute bem.Todos pararam. Nina observava, curiosa, mas José logo se apressou em distraí-la.— Não s

As xícaras tilintavam suavemente sobre os pires, e o leve farfalhar das folhas do jornal sendo viradas por José era o único som na sala até que os passos se aproximaram pelo corredor.Amanda e João entraram juntos.Ela usava uma blusa creme de gola alta e calça escura, o cabelo preso de forma prática. João, de blazer casual, camisa com o colarinho ligeiramente desalinhado, exibia um semblante calmo — mas os olhos denunciavam o que haviam vivido na madrugada.Sofia lançou um olhar breve para Clara, que fingiu não notar.José se ajeitou na cadeira, abrindo espaço para os dois.— Dormiram bem? — perguntou ele, com um sorriso contido.Amanda respondeu antes que João dissesse qualquer coisa:— Dormi como não dormia há tempos. Paz tem outro gosto.João a olhou de lado, e sorriu discretamente.Clara mexeu o café com um pouco mais de força do que o necessário.Amanda e João sentaram-se lado a lado, como se aquele gesto simples já dissesse mais do que poderiam verbalizar. Ana apenas observava

Sala de Reuniões Principal, manhã – Amanda, João, Bruno, Valéria, Isabela, JoséA mesa de reuniões da Duarte Corp. refletia o brilho da manhã que atravessava os vidros altos do prédio. Amanda chegou primeiro, pastas em mãos, cabelos presos com elegância e um leve batom vermelho. João entrou logo depois, com um discreto aceno de cabeça.Bruno sentou-se ao lado dela, trocando rápidas anotações. José se encostava na parede, mais observador do que atuante — ele conhecia todos os rostos ali, mas o que lhe interessava era o jogo por trás da mesa.A porta se abriu com leve estrondo. Valéria entrou com um salto firme, o blazer acentuando sua silhueta e o sorriso controlado.— Bom dia a todos — disse com um olhar direto para Amanda.— Bom dia, Valéria — respondeu Amanda, com um tom sereno e gelado.— Espero que o material que preparei tenha atendido às expectativas — continuou Valéria, entregando uma cópia de um relatório diretamente a João, ignorando Amanda propositalmente.Amanda nem piscou.

Após o baque das palavras de Amanda, o silêncio se alongou como uma sombra sobre a mesa. Ana bebeu mais um gole de vinho, sem disfarçar o orgulho que agora tinha no olhar voltado à filha. José permanecia quieto, observador.Afonso, que até então se mantinha neutro, limpou os cantos da boca com o guardanapo e tentou aliviar o clima:— Não vamos transformar uma boa mesa em campo de batalha. Augusto, diga-me, como vai o Carlos? Soube que voltou da Alemanha.Augusto soltou um suspiro, parecendo agradecer a tentativa do irmão.— Está bem. Voltou com aquela mania de controlar tudo por planilhas... E o Emílio continua escondido na Itália, “escrevendo livros”.Ivo então forçou uma entrada mais agressiva, puxando o centro da conversa de volta para seu jogo:— Mas e o major Erick? Um homem de fibra. Um exemplo de disciplina e patriotismo. Sem falar de você, Afonso, que sempre foi o equilíbrio da família Duarte na empresa. Uma pena estar aposentado. Augusto, você devia ouvir mais seus irmãos. To

Ivo então perguntou, direto:— E onde estão Augusto e Afonso?Ana, ainda com a voz tranquila, respondeu:— Estão no escritório, resolvendo alguns documentos. Gertrudes, querida, leve o senhor Ivo até lá.Gertrudes, sempre discreta, assentiu com um aceno e indicou o caminho. Ivo partiu sem resistências.Valéria, com um olhar rápido e análise contida, acomodou-se à mesa. E, como era de se esperar, escolheu o lugar ao lado de João. Ele não se moveu. Nem demonstrou desconforto. Mas Amanda, que observava tudo em silêncio, apertou levemente a xícara nas mãos. Não de ciúmes, mas de vigilância.Valéria pegou uma garfada de bolo, provou e sorriu para Ana.— É mesmo como papai disse... a senhora cozinha com alma.Ana inclinou a cabeça com modéstia.— Cozinhar, minha filha, é como cuidar dos filhos. É preciso conhecer as ausências para saber a medida do açúcar.Valéria sorriu com os lábios apenas. Sua atenção, no entanto, estava em João.— Não achei que te encontraria por aqui tão cedo. Imaginei