Eu não vou recuar

Capítulo 5 )

Clara narrando

A conversa com Lucas foi direta.

Passei a noite pensando em cada palavra dita, no jeito que ele me olhou, na forma como tentou me colocar no meu lugar.

Mas eu não vou baixar a cabeça.

Fui eu quem cuidou da Sofia.

Fui eu quem deu amor, quem enxugou suas lágrimas, quem a fez dormir nos dias difíceis. Eu que a protejo, que a acolho.

E nada do que Lucas diga vai mudar isso.

Respiro fundo ao acordar, fazendo minha higiene matinal antes de trocar de roupa. Pego meu conjunto de babá — a farda que sempre usei, a que simboliza o papel que dizem que eu ocupo nesta casa.

Mas Sofia sabe.

E eu também.

Vou até o quarto dela e, como sempre, ela já está acordada, me esperando com um sorriso lindo.

— Bom dia, minha pequena — digo, beijando sua testa.

Ela sorri e me abraça apertado.

— Bom dia, mamãe do coração!

Fecho os olhos por um segundo, absorvendo esse carinho que ninguém pode tirar de mim.

Cuido de cada detalhe. Arrumo seu cabelo, coloco seu fardamento, ajeito sua bolsa e assino sua agenda.

Descemos juntas, e enquanto ela se senta na mesa, organizo sua lancheira e deixo tudo pronto para sua saída.

Ao me aproximar da mesa, vejo que todos já estão reunidos.

Lucas está lá.

— Bom dia — digo, mantendo a voz neutra.

— Bom dia! — Sofia repete animada, como sempre.

A ajeito na cadeira e cuido do seu café, garantindo que tenha tudo o que precisa.

Dona Marta, sempre carinhosa, me olha com doçura.

— Senta, Clara.

Mas prefiro não.

— Vou buscar a mochila da Sofia — respondo, saindo antes que insistam.

Sinto o olhar de Lucas em mim. Ele percebe que estou diferente.

Mas não é medo.

É porque agora ele sabe que eu não vou sair do caminho tão fácil

Volto para a mesa com a mochila de Sofia, mas antes que eu possa falar qualquer coisa, ela me olha com aquela carinha inocente e solta:

— Papai não gostou porque eu disse que você é minha mamãe do coração.

Meu olhar imediatamente encontra o de Lucas. Ele está sério, tentando manter o controle, mas vejo a tensão nos ombros dele.

Me abaixo na altura de Sofia e sorrio.

— Não se preocupe com isso, meu amor. O que importa é o que você sente aqui dentro — digo, tocando levemente seu peito.

Ela sorri, satisfeita com minha resposta.

Me levanto e levo Sofia até o carro, onde o motorista já a espera. Antes de ela entrar, me abaixo de novo e ajeito a gola de seu fardamento.

— Se comporta, tá bom?

— Tá bom!

— E não esquece que eu te amo.

— Eu também te amo, mamãe do coração!

Meu peito se aquece com essas palavras. Dou um beijo nela e ajeito-a na cadeirinha antes de fechar a porta.

Respiro fundo, sabendo que, ao entrar de volta, vou enfrentar Lucas e seu orgulho ferido.

E não erro.

Ele está ali, na sala, em pé, me esperando.

— Clara... Eu sei que você foi a…

Levanto a mão, interrompendo. Meu tom é firme, sem hesitação.

— Eu fui a única que ficou do lado dela quando Sabrina nunca visitou. Eu levei à escola, acompanhei cada desenvolvimento… Você sabia que fui eu quem mostrava sua foto pra ela? Que eu dizia que você era um pai amoroso?

Lucas estreita os olhos, mas não me corta.

— Que você nunca foi — continuo. — Se sua filha tem algum reflexo sobre você como pai, foi por minha causa. Se não, ela estaria chamando seu Augusto de pai ao invés de vó.

O silêncio na sala é denso, cortante.

Lucas respira fundo, parecendo absorver minhas palavras.

Mas quem quebra o silêncio é dona Marta.

— Isso é ser pai, Lucas.

Ele desvia o olhar para ela, como se esperasse que sua mãe o defendesse, mas Marta apenas o encara com firmeza.

E então, pela primeira vez, vejo Lucas hesitar.

Porque agora, ele sabe que não tem mais desculpa para fugir da verdade.

O silêncio entre nós é tão denso que quase consigo tocá-lo.

Lucas está ali, parado, me olhando como se estivesse processando cada palavra que acabei de dizer. Mas não retiro nada do que falei. Ele precisava ouvir.

Dona Marta continua de pé, olhando para o filho, esperando uma resposta que talvez nem ele tenha.

Eu suspiro, cruzo os braços e encaro Lucas de frente.

— Dói ouvir a verdade, né? — minha voz sai calma, mas carregada de algo mais profundo. — Mas ela precisa ser dita. Você pode não gostar do que Sofia sente por mim, mas não pode apagar tudo que eu fiz por ela.

Ele passa a mão no rosto, visivelmente incomodado.

— Eu nunca quis apagar nada… — ele começa, mas eu corto.

— Mas quer limitar. Quer me encaixar numa posição que já não faz mais sentido. Você pode ser o pai biológico da Sofia, Lucas, mas o amor não vem do sangue. Vem da presença, do cuidado.

Ele aperta a mandíbula, como se estivesse tentando controlar uma resposta impulsiva.

— Eu sei disso.

Solto um riso baixo, sem humor.

— Sabe? Porque parece que está mais preocupado em me afastar da Sofia do que em ser o pai que ela idealizou por todos esses anos.

Lucas avança um passo na minha direção, seus olhos escuros me prendem no lugar.

— Você não tem ideia do que está falando, Clara.

Seguro sua intensidade sem recuar.

— Tenho, sim. Sei mais do que você pensa. Sei o quanto Sofia te ama sem nem te conhecer de verdade. Sei o quanto ela acreditou em cada palavra que eu disse sobre você. E sei que, agora que você está aqui, ela espera que você seja o pai que eu descrevi.

Ele me encara, seu peito sobe e desce devagar, como se estivesse tentando conter algo dentro de si.

— Eu não vou decepcionar minha filha.

— Ótimo. Então não comece tentando tirar de mim o único papel que sempre foi meu.

O olhar dele endurece, mas há algo mais ali agora.

Um desafio.

E talvez, um medo que ele ainda não quer admitir.

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