Capítulo 4 )
Marta narrando Sou Marta, tenho 51 anos, mas dizem que pareço mais nova. Sou mãe de três filhos que me enchem de orgulho. Lucas, meu primogênito, tenente da polícia. Sempre tão fechado, tão sério, mas com um coração que eu sei que é bom. Luana, minha filha do meio, médica dedicada, determinada e generosa. E Luan, meu caçula, estudante de direito, que ainda tem tanto para aprender sobre a vida, mas que já carrega a responsabilidade no olhar. Sou casada com o melhor homem que poderia ter ao meu lado, Augusto. E tenho minha neta maravilhosa, Sofia, a menina que ilumina essa casa. E então, tem Clara. A jovem que entrou em nossas vidas há cinco anos e que se tornou parte da nossa família. Linda, não apenas no rosto, mas na alma. Com sua pureza, sua delicadeza, seu jeito de amar Sofia como se fosse dela. Amo Clara como uma filha. E por isso, noto quando algo está errado. Na mesa do café da manhã, espero que ela se sente, como faz todos os dias. Mas, em vez disso, apenas coloca o café de Sofia e permanece de pé, ao lado. — Senta, Clara — digo, chamando-a com um tom suave. Ela sorri pequeno, mas não se move. — Estou bem, dona Marta. Vou pegar a mochila de Sofia. Com licença. Observo atentamente enquanto ela sai do cômodo. E não sou a única. Meu olhar se cruza com o de Lucas, que segue Clara com os olhos, sua expressão fechada, pensativa. Ele percebeu. Algo mudou. E, de alguma forma, sei que isso tem a ver com a conversa que tiveram ontem. Lucas pode ser meu filho, mas eu o conheço bem demais para não enxergar o que está acontecendo. E ele ainda não percebeu… Mas Clara já não é só a babá da Sofia. E talvez nunca tenha sido. O silêncio toma conta da mesa depois que Clara sai. Lucas continua olhando para a porta por onde ela passou, como se ainda tentasse processar algo. Sei que meu filho tem suas convicções, mas essa situação com Clara está mexendo com ele de um jeito que nem ele entende. E então, Sofia, com sua inocência pura, quebra o silêncio. — Vou pra escola, papai! Amo estudar. Clara me ensinou a fazer meu nome, sabia? Lucas desvia a atenção para a filha e sorri, embora sua expressão ainda pareça pensativa. — Ela é muito importante pra você, minha filha? — ele pergunta, com a voz mais suave. Sofia nem pensa antes de responder. — Sim, papai! Clara é minha mamãe do coração! O choque passa pelo rosto de Lucas em um instante. Ele endurece, como se aquelas palavras tivessem um peso que ele não esperava carregar. Eu apenas observo. Sofia não disse isso para provocar, nem para contrariar. Ela falou porque sente. E Lucas precisa entender isso. — Mamãe do coração? — ele repete, tentando manter a calma. Sofia assente, sorrindo. — Sim! Ela me cuida, me abraça quando tenho pesadelo, penteia meu cabelo antes de dormir… Igual as mamães fazem. Lucas passa a mão no rosto, claramente afetado. — Mas você sabe que sua mãe de verdade é a Sabrina, não sabe? O rostinho de Sofia perde um pouco do brilho. — Sei… Mas Clara tá comigo, papai. O silêncio volta, mas dessa vez é diferente. Lucas não tem uma resposta para isso. E eu, como mãe, só posso torcer para que ele entenda, antes que seja tarde demais. O silêncio ainda pesa na mesa quando Clara retorna. Ela caminha até Sofia com seu jeito doce de sempre e sorri para a menina. — Terminou de comer, meu amor? — pergunta, afagando de leve o cabelo da pequena. Sofia assente, mas logo franze a testa. — Sim… Mas papai não gostou quando eu disse que você é minha mamãe do coração. Meus olhos vão direto para Lucas, que aperta o maxilar e se levanta da mesa no mesmo instante. Clara percebe, e eu vejo quando seu corpo enrijece. — Eu não disse que não gostei, filha — Lucas começa, tentando controlar a voz. — Apenas disse que você tem uma mãe. Sofia cruza os bracinhos e faz um biquinho. — Uma mãe que não liga pra mim… Minha mãe é a Clara! Eu amo ela! A sinceridade na voz da minha neta é cortante, e antes que Lucas possa responder, Clara o interrompe. — Não se altera perto dela — sua voz sai firme, sem espaço para discussão. Seus olhos, normalmente tão calmos, agora estão carregados de algo mais profundo. Proteção. — Se tem algo contra mim, não desconta na minha Sofia. Lucas encara Clara como se quisesse rebater, mas parece sem palavras. — Vamos, pequena — Clara continua, pegando a mochila de Sofia. — O motorista já está pronto para levar a minha pequena pra escola. Ela reforça a palavra “minha”, e dessa vez, é Lucas quem parece perder o ar. Eu conheço meu filho. Sei que ele não gosta de se sentir fora de controle. Mas o que ele ainda não entendeu é que, nesse caso, ele nunca teve controle algum. O amor de Sofia já tem dona. E agora, resta saber o que Lucas vai fazer com isso.