Amara
O avanço dos homens foi como um golpe certeiro. Com Rebeca ao meu lado, fomos arremessadas para o fundo do quarto.
De repente, nossos corpos ficaram suspensos no ar, como se mãos invisíveis apertassem nossos pescoços. Mal conseguíamos respirar.Meus olhos se fixaram no homem de olhos azuis estranhos, que nos encarava com um sorriso cruel.
— Admiro a coragem de vocês duas… mas são apenas meras humanas insignificantes. Acham que podem lutar contra nós? — disse, com desdém.
Assim que terminou de falar, os dois homens grandes começaram a se transformar em criaturas horrendas.
Precisei reunir toda a minha força de vontade para não acreditar que aquilo era um pesadelo.Em poucos instantes, o corpo de um deles estava coberto de pelos; seu rosto, metade humano e metade animal, lembrava um lobo — mas com garras e presas muito maiores.
O outro apenas riu, revelando presas afiadas… não eram como as de um vampiro comum, eram mais longas e ameaçadoras.O choque tomou conta de mim, mas eu continuava suspensa no ar, sufocando. O aperto no meu pescoço e no de Rebeca vinha dele…
Olhei novamente para o homem de olhos azuis brilhantes. Seus braços estavam estendidos — ele era quem fazia aquilo.Não… não podia acreditar que tudo o que Rebeca havia contado era verdade. Eles… não eram humanos?
Com muita dificuldade, consegui falar:
— Quem são vocês? E o que querem de nós? — perguntei, mesmo já sabendo a resposta.
Ele soltou uma risada sombria.
— Tuco é um lobisomem. Gaspar, um vampiro. Não são tão fortes e velhos quanto outros da nossa espécie, mas para vocês, meras humanas, já são poderosos o suficiente. — Caminhou pelo quarto com passos lentos e calculados.Então, ele nos soltou. Caímos no chão, ofegantes, tentando recuperar o ar.
— Eu me chamo Sebastian. Sou o dono deste lugar… metade lobisomem, metade feiticeiro. — Ajustou o terno impecável e continuou: — Quanto a vocês, são apenas mercadorias para meus clientes. Mas se tentarem fugir ou nos atacar novamente… esmagarei seus pescoços com apenas um dedo.
As palavras dele eram duras e fizeram todas nós tremermos de medo. Mas, apesar do pavor, meus instintos gritavam que eu não podia desistir.
Antes que eu pudesse reagir, os homens se retiraram, deixando para trás duas bandejas com algo que não parecia comida. A porta foi trancada. Silêncio.
— Eu disse que eles eram monstros. Agora acreditam em mim? — Rebeca tossiu ao falar.
— Desculpe ter duvidado de você… mas é difícil acreditar em algo assim — respondi, massageando meu pescoço dolorido pela magia que ele havia usado.
Olhei para a cama: Jaqueline estava encolhida, em choque; Marcela, com os olhos arregalados.
Pela primeira vez, comecei a duvidar… será que eu ainda estava viva? Ou já estava no inferno?Coloquei as mãos na cabeça, frustrada, tentando parecer forte diante das meninas, embora o medo fosse visível em nossos rostos.
— Eles são monstros… fortes e rápidos. Mas dá pra matar sim — disse Rebeca, sentando-se ao meu lado.
— Como assim matar? — perguntei, tentando encontrar uma saída.
— Eu conheci caçadores. Também não acreditava em monstros sobrenaturais… até que minha irmã foi levada. No começo, achei que eram apenas homens ruins. Mas descobri que existiam coisas piores. Caçadores treinam a vida inteira para eliminar essas criaturas.
— Então me diga… como matamos eles? — insisti.
— Lobisomens são sensíveis à planta mata-lobo ou ao acônito… e não suportam prata. Vampiros só morrem se cortarmos a cabeça. Feiticeiros… esses morrem como nós, basta enfiar um punhal no peito ou cortar a garganta. — Ela falou com o olhar distante.
— E onde vamos encontrar tudo isso se estamos presas? — retrucou Marcela, fria.
— Talvez não tenhamos nada aqui, mas só o fato de saber que eles não são invencíveis já nos dá esperança — respondi, tentando me convencer também.
— Eu estou com medo, Amara — Jaqueline falou, quase chorando.
Segurei suas mãos.
— Eu também… mas vamos sair dessas juntas.Ajoelhei-me ao lado de Jaqueline, tentando acalmar seu choro, enquanto Rebeca olhava para a porta, como se esperasse que alguém entrasse a qualquer momento. O silêncio era pesado, interrompido apenas pela respiração irregular das meninas. O medo se misturava ao cansaço, e a esperança parecia frágil, prestes a se despedaçar ao menor ruído vindo do corredor.
Por instantes, nos unimos no silêncio, sabendo que o que nos mantinha vivas era a promessa de não desistir. Rebeca pegou minha mão e apertou forte, sinal de que, mesmo diante do desconhecido, ainda éramos capazes de apoiar umas às outras.
Apesar do coração apertado, não tinha ideia de como escapar, muito menos de como enfrentar aqueles monstros. Mas eu precisava manter as meninas esperançosas.
Pegamos o que eles deixaram. A única coisa boa eram as quatro garrafas de água. O resto… uma massa pastosa com cheiro de lavagem para porcos.
Não ousei provar. Apenas bebi a água. Aquilo parecia feito para nos enfraquecer.Jaqueline tentou comer e fez uma careta horrível. Rebeca nem tocou. Marcela, faminta, comeu mesmo reclamando.
Sentei-me na cama, fechei os olhos e tentei imaginar uma brecha, qualquer saída daquele quarto. Mas sabia… só haveria chance quando eles nos levassem para fora dali.
O tempo passou devagar, cada minuto parecendo uma eternidade. À medida que a fome apertava e o cansaço pesava nos olhos, começamos a murmurar planos, mesmo que frágeis, entre goles de água e suspiros incertos. A luz que entrava pela fresta da porta desenhava sombras estranhas nas paredes, e todas imaginavam o que poderia estar à espreita do outro lado.
— Eles querem que fiquemos fracas — sussurrei, observando a massa no prato. — É melhor tentarmos conservar energia.
Rebeca olhou para mim, seu olhar lúcido e determinado, apesar do medo. — Se formos tentar alguma coisa, precisamos esperar o momento certo. Talvez quando trouxerem mais comida, ou se ouvirmos eles conversando.
Marcela, ainda mastigando, balançou a cabeça. — Não sei se aguento muito tempo aqui. Mas não vou morrer sem lutar.
Jaqueline, enxugando as lágrimas, conseguiu sorrir de leve. — Se sobrevivermos a isso, nada mais vai nos assustar.
O pensamento me fortaleceu. Peguei uma das garrafas de água e dividi o resto do líquido entre todas, tentando distribuir esperança em cada gesto. O terror do desconhecido continuava rondando, mas ali, naquele instante, éramos apenas quatro meninas tentando relembrar que ainda éramos humanas. E, acima de tudo, que juntas podíamos desafiar até o medo.