Engoli a vontade de chorar, porém, não consegui esconder a dor, peguei meu filho pela mão e sai rápido, antes que a Laura a visse. Já sentindo as lágrimas teimosas escapando dos meus olhos. Quando entramos no carro, não aguentei e caí no choro. Vê-lo já era muito difícil, mas vê-lo com a Laura, confirmava as coisas que ela tinha me falado na noite da formatura, e o que era uma dúvida, agora virou certeza. Oito anos depois.
— Querida, eu não sabia que você ainda se abalaria tanto ao ver seu antigo namorado…
— Não é só por vê-lo, mãe, é por vê-lo com ela, com a cobra que acabou com a minha vida! E agora eu tenho certeza que fui traída!
— Helena, eu entendo a sua dor, mas tente ver o lado bom das coisas, se não fosse isso, hoje você não teria o Tiago, que é a luz das nossas vidas!
Olhei para o rostinho do meu filho, estava assustado vendo a mãe chorar.
— Não se preocupe, meu príncipe, é só um probleminha que a mamãe logo vai resolver. — Sorri e joguei um beijo, para tranquilizá-lo.
— Mãe, eles casaram? — perguntei, temendo a resposta.
— Sim, minha filha… — ela hesitou. — Uns dois anos depois que você se foi. O Víctor ficou alucinado quando perdeu você, se envolveu com gente que não prestava, vivia bêbado, foi preso, e então eles casaram e ele sossegou… — ela baixou a cabeça. — Foi bom para ele.
Eu ouvia tudo como se estivesse em um sonho, como se aquele corpo não fosse o meu.
O mesmo veneno do passado estava ali: a mulher que me fez partir anos atrás agora estava ao lado dele, sorrindo como se nada tivesse acontecido.
O silêncio era a melhor escolha, mesmo que fosse cheio de mágoas antigas e perguntas sem resposta .Percebi que, depois de oito anos, a vida havia mudado, mas o coração ainda lembrava de tudo.
Voltamos para casa e eu fui organizar minhas coisas no quarto, mas quando acabei, olhei ao redor e não me senti confortável, era como se eu não pertencesse mais àquele lugar. Decidi que iria procurar um canto para mim e para o Tiago assim que conseguisse um emprego.
Meu pai estava no jardim e eu conversava com ele na sacada, quando o vi passar. A caminhonete vermelha e branca, bem devagar, ele olhou diretamente para mim e acenou com a cabeça. Eu congelei, não fui capaz de mover nenhum músculo, apenas fiquei hipnotizada olhando.
— É minha filha, você vai ter que encarar os problemas que deixou para trás quando se foi… — era a voz do meu pai, me puxando de volta para a realidade.
— Não tem nada para encarar, pai, o que passou, passou.
— Se você quer pensar assim… — ele tirou o chapéu e coçou a cabeça. — Eu vou fingir que acredito!
— Pai, está tudo terminado entre nós, ele já está casado!
— Está… está casado! — Ele se apoiou na cerca. — Mas isso não o impediu de perguntar de você todas as vezes que nos encontramos, durante todos esses anos.
Senti meu coração dar um pulo. Será que ele ainda sentia algo por mim? Não era possível, se ele realmente gostasse de mim, não teria me traído com a cobra da Laura. Eu não devia me iludir.
— Pai, eles moram aqui na rua?
— Moram sim, ele construiu uma casa atrás da casa dos pais. A Laura é professora na escola do bairro.
Decidi que teria que ir embora logo, conseguir uma casa do outro lado da cidade, onde não fosse ficar cruzando com eles todos os dias, e onde a Laura não fosse dar aula para o meu filho.
— Pai, eu vou atrás de emprego, e assim que eu conseguir, vou alugar uma casa para mim e o Tiago, em outro bairro.
Ele parou o que estava fazendo e me observou calado por algum tempo.
— Não adianta fugir do seu destino, minha filha. Ele sempre vai atrás de você!
Entrei para o meu quarto e sentei na cama, pensando no que meu pai tinha dito. Será mesmo que o Víctor e eu éramos destinados a ficar juntos? E se realmente fôssemos, porque é que não tinha dado certo? Eram muitas perguntas sem resposta. Eu precisava descansar, meu cérebro estava fritando. Desci e tomei um remédio de dor de cabeça e avisei que ia dormir. Dei instruções ao Tiago sobre o horário que ele devia subir para dormir também. Em seguida fui para o quarto e deitei.
Senti o cheiro familiar de casa nas cobertas e a maciez do meu colchão e me senti abraçada, pegando no sono imediatamente.
Não foi um sono tranquilo, passei a noite sonhando com a caminhonete passando em frente à casa, em um dos sonhos, a Laura descia do carro e segurava a mão dele, em seguida me olhava com os olhos vermelhos e dava uma gargalhada. Também sonhei com cobras se enrolando em meus pés e acordei muito assustada.
Já era dia, meu filho dormia como um anjo ao meu lado, eu nem tinha visto ele deitar. Dei um beijo em sua testa e fui tomar um banho. Escolhi uma saia lápis com camisa branca e sapatos de salto. Ia até uma clínica da cidade, onde vi um aviso que estavam precisando de secretária. Eu era formada em agronomia, mas não exercia. Era difícil conseguir emprego nessa área na cidade grande, eu só teimei em me formar porque Víctor e eu tínhamos prometido que faríamos juntos, foi uma forma de honrar minha palavra, mas não consegui trabalho, e então fiz um curso de secretariado e havia trabalhado como secretária por dois anos, até abrir minha própria empresa de marketing, junto com o Leonardo.
No final, descobri que ele colocou tudo no nome da mãe dele e saí do casamento sem nada, apenas com meu velho Ford, que já tinha antes de casar.
Suspirei e sacudi a cabeça. Não era hora de pensar nessas coisas. Eu tinha que me concentrar no agora. No futuro do meu filho.
Desci para tomar café e meus pais já estavam na cozinha. Troquei algumas palavras com eles e peguei as chaves para sair.
— Filha, lá na empresa do Seu Eduardo eles precisam de um agrônomo, caso você tenha interesse, posso falar com ele. — Meu pai falou antes de sair.
— Mas pai, eu nunca exerci, não sei se ainda lembro…
— Você aprende rápido, garota, eu confio no seu potencial!
Meu pai sempre foi assim, acreditando mais em mim do que eu mesma.
— Certo, pai, mas mesmo assim eu vou até a clínica, sempre é bom ter duas opções.
Dei um beijo neles e saí, antes de entrar no meu carro, dei uma olhada para a casa do Víctor. A caminhonete estava estacionada em frente. Senti uma leve pontada no estômago e entrei rapidamente, não tinha tempo para ficar ali chorando pelo leite derramado.