Ethan 

Eu não deveria estar tão interessado.

Era só uma entrevista. Só mais uma candidata. Era o que dizia a mim mesmo enquanto girava um copo de uísque entre os dedos, olhando a cidade iluminada pela janela do meu escritório.

Mas aí tinha ela.

Melo. A mulher com um QI de gênio, frases cortantes e um olhar que não vacilou nem quando eu pressionei. E isso… não acontece com frequência.

A maioria das pessoas aqui dentro se esforça para me agradar. Tentam sorrir, bajular, tropeçam nas próprias palavras só porque sou o CEO reconhecido e minha empresa ganha milhoes com os projetos. 

Ela não. Ela ergueu um escudo tão sólido quanto o prédio que estamos prestes a construir juntos.

Gosto de quem não se dobra. Mais ainda de quem me provoca sem perceber.

Enquanto os outros candidatos saíram da entrevista tentando lembrar se sorriram o bastante, ela saiu com o mesmo ar de indiferença que entrou. Mas não totalmente ilesa — eu vi o leve vacilo quando me viu pela primeira vez. Não passou despercebido.

E isso me fez querer testar ainda mais seus limites.

Terminei de revisar os últimos e-mails do dia e abri, quase sem querer, o arquivo com os dados dos candidatos. Só por curiosidade. Um CEO informado é um CEO eficiente.

Quando vi o endereço de Melo, precisei reler.

Prédio Lúmina. Andar 19.

A mesma vista, o mesmo elevador… o destino caprichou.

— Ora, ora… que coincidência deliciosa — murmurei para mim mesmo, sorrindo.

Como é que ela ainda não sabe disso? Ou sabe… e não demonstrou?

Não importa. Isso só torna tudo mais interessante.

Eu podia esperar até segunda-feira para vê-la de novo, mas onde estaria a graça nisso?

Peguei o celular e disquei o número. Sabia que ela não esperava uma ligação minha tão cedo. Justamente por isso seria perfeito.

Enquanto o telefone chamava, imaginei a cena: ela em casa, talvez já revisando a entrevista, ou com uma xícara de chá nas mãos. Sempre controlada.

Atendeu.

— Melo falando.

A voz veio firme, exata, sem hesitação. Exatamente como imaginei.

— Espero não estar interrompendo seu chá de camomila.

Pausa. Ah, como eu gosto desses segundos de silêncio.

— Presumo que o senhor tenha acesso às informações pessoais dos candidatos.

Pontual. Fria. Profissional.

— Presume corretamente. Mas fique tranquila, não estou ligando para invadir seu espaço.

A não ser mentalmente… e emocionalmente, se ela deixar.

— Então qual é, exatamente, a sua intenção, Sr. Gonzales?

Direta. Gosto disso.

— Quero contratá-la.

Outra pausa. Um leve vacilo. Aposto que ela não esperava ouvir isso tão rápido.

Mas era isso que eu queria: tirá-la do script.

Conversamos mais um pouco. Faço questão de dizer que ela trabalhará diretamente comigo. Quero ver se ela mantém o tom neutro. E mantém — quase impecável.

Mas aceitou. Claro que aceitou.

Ela é como eu: adora um desafio, mesmo que não admita.

Antes de desligar, jogo mais uma isca:

— Nos vemos segunda-feira. Prepare-se. Será desafiador.

E a ligação cai.

Guardo o celular e sorrio sozinho.

Segunda-feira vai ser… interessante.

Mas por que esperar até segunda?

O fato de morarmos no mesmo andar abre um leque inteiro de possibilidades.

Será que ela costuma sair cedo? Gosta de café da manhã no hall? Prefere escadas ou elevador?

Essas são perguntas que pretendo responder pessoalmente.

Levanto, pego meu casaco. Enquanto caminho pelo corredor vazio da UpperConstruction, sinto aquele velho conhecido frio na barriga. Não pelo projeto — isso eu sei que vou entregar.

Mas por ela. Pelo jogo que está só começando.

Quando você é o CEO de uma empresa como esta, pouca coisa te surpreende. Mas raramente encontro alguém que me faça querer sair do roteiro.

E Melo já conseguiu isso sem perceber.

Agora, tudo que me resta é esperar.

Ou, quem sabe, encontrar um motivo para cruzar com ela antes da hora.

Afinal, a vida é feita de encontros inesperados.

E se depender de mim, ela nunca mais vai esquecer o próximo.