Naquela noite, o sono da Elena, ah, foi bem mais fundo do que qualquer um já viu. O calor da fogueira, o cheiro da terra da caverna, e o silêncio profundo da floresta formaram um casulo, onde o tempo parecia parado, sabe. E quando os olhos, finalmente, se fecharam, ela foi parar em um lugar… nem de sonho, nem de verdade.
Ela se viu numa floresta parecida com Valedouro, mas muito mais selvagem, mais vibrante, sabe? As árvores eram gigantes, as folhas prateadas tremeluziam sob a luz da lua cheia, aquela coisa intensa, quase viva. Um círculo de mulheres, no meio da clareira, todas com olhos claros e cabelos longos, enroladas em mantos que voavam como névoa. E cada uma, entoava cantos numa língua que a Elena não entendia, mas que ecoava em seu peito, como se já soubesse.
No centro, uma mulher especial, ah, diferente, se destacava, sabe? Alta, imponente, com uma marca na testa, brilhante, o mesmo símbolo em espiral que a Elena tinha encontrado. Ao olhar nos olhos dela, a Elena sentiu algo forte, sabe? Um reconhecimento… enorme. Era como olhar pra si mesma, mas separadas por séculos, de história.
— Filha da Luz murmurou a mulher, seus lábios não se mexiam, sua voz ressoando diretamente na mente de Elena. O ciclo se repeti, e o véu entre os mundos enfraquecia. Sangue antigo corre em tuas veias, e a Lua te chama, pra cumprir o pacto esquecido.
— Que pacto? Elena quis gritar, mas a voz faltô. O que você quer de mim, hem?
A resposta veio em flashes: batalhas sob luas avermelhadas, homens virando feras, aldeias em cinzas, e um altar todo manchado de sangue e luz. Depôs, o rosto de Lucas jovem, mais selvagem, todo cercado de sombras. E logo, o símbolo espiralado pegando fogo em seu peito.
Ela acordou num pulo, o corpo todo suando, as mãos tremendo um bocado. O fogo ainda crepitava baixo, e Lucas a observava, todo atento. Estava sentado na mesma posição, como se nem tivesse piscado o olho.
— Você viu, né? — ele disse, como se fosse óbvio.
Elena confirmou, ofegante, sabe. As imagens ainda ardiam em sua mente, vivas como se ela as tivesse vivenciado.
— Uma mulher… uma sacerdotisa. Ela me chamou de Filha da Luz.
Ela proferiu, o véu entre os reinos está cedendo.
Lucas piscou, fechando os olhos rapidinho.
— A Primeira Guardiã. Aquela que trancou as passagens entre humanos e os malditos. Sussurram que o espírito dela orienta as herdeiras do talento. Se ela falou com você... — Ele hesitou, voz cheia de medo e respeito misturados. — A Lua te elegeu mesmo, de verdade.
Elena, meio tonta, se pôs em pé devagarinho. Andou até a entrada da caverna e mirou o céu. A lua brilhava – não minguante mais, crescendo de novo. Clara, mas com um contorno avermelhado que antes, nuca tinha reparado.
— O véu tá abrindo — ela resmungou. — E os vestígios do passado tão me alcançando.
Lucas chegou perto, ficando ao seu lado. A distância entre eles tinha diminuído, não só no espaço, mas na alma. Dividiam mais que um refúgio: dividiam um destino.
— Então, precisamos fugir — ele decretou. — Antes que os ecos virem gritos… e seja tarde de mais.
E sob aquela lua em ascensão, a jornada se mostrava. Uma jornada onde passado, presente e futuro se chocariam.
E onde Elena, a última Guardiã, precisaria se lembrar do qe nunca experimentou — para salvar tudo aquilo que ela conhece.