Capítulo 07

Os ventos do norte cortavam como lâminas finas contra o rosto, e mesmo assim eu os preferia ao calor sufocante que se tornara Thunderwoof nos últimos dias.

Estávamos em marcha havia três dias rumo à Matilha de Durnwarth.

Kaelen cavalgava ao meu lado, conversando sobre rotas comerciais, estratégias de escambo, oportunidades de expansão. Sua voz era firme e seu foco, absoluto.

Ele não fazia ideia.

Nenhum deles fazia.

Resolvi fugir, e me odiava por isso, eu não fugia dos problemas, eu os enfrentava, mas estava sendo covarde por não encarar esse problema.

— Quando cruzarmos os vales gelados, é provável que encontremos neve. A trilha das Montanhas Sombrias se estreita e não há margem para erro, Alfa. Kaelen disse me trazendo ao agora.

Assenti em silêncio. A cabeça baixa, os olhos fixos nas árvores que nos cercavam.

Não era o clima o que me preocupava.

Era o que deixei para trás.

Ou melhor… quem.

O cheiro que havia me perseguido nos últimos dias — aquele aroma que invadia meus sentidos com a suavidade de flores silvestres recém-despertas ao orvalho da manhã — não estava mais presente. Mas a ausência só tornava tudo pior.

Minha mente a recriava.

Meu lobo a clamava.

E eu... lutava.

Grendor estava inquieto, rosnando dentro de mim como se estivesse preso em uma cela com grades de prata. Não ousava me transformar em meu lobo, tinha medo dele tomar o controle e ir até ela.

*** Você está fugindo como covarde. Ela está lá, tão perto, e você a deixa para trás.

*** Não temos certeza de nada. Talvez ela nem saiba da ligação. Talvez seja só um eco do seu desejo ou uma coincidência...

*** Não minta para mim humano. Nem para si mesmo. Sentimos. Sabemos a verdade.

Cerrei os dentes e puxei as rédeas do cavalo, fazendo-o parar por um segundo.

Kaelen olhou para mim com o cenho franzido.

— Tudo certo?

— Sim. Só um pressentimento.

— Da estrada?

Assenti. Ele não precisava saber.

Ninguém podia saber.

Thunderwoof acreditava na força do elo.

Na verdade absoluta de que a companheira é um dom divino.

E que negá-la… seria uma profanação.

Mas eu vi o que o amor fez com meu pai.

Vi aquele homem quebrado diante do corpo da minha mãe, morta por defender um filhote de ômega que nem era dela.

Vi ele gritar, urrar, implorar aos céus, perder a razão...

E nunca mais ser o mesmo.

O peso de ser Alfa recaiu sobre mim cedo demais.

Não posso me dar o luxo de fraquejar.

A estrada era ingrime e estreita, não podíamos errar ou cairemos no desfiladeiro gelado, cada cavalo descia a uma distância do outro e descemos com cuidado e atenção, era chato ir até outras matilhas, visitas não era meu forte, odiava interação social com outros Alfas, cada ser era mais arrogante que o outro, mostrando poder, egos enormes, mas tínhamos que ir e ir até Durnwarth estava nos planos que eu adiava ao máximo, somente aproveitei o momento para espairecer e colocar as ideias em ordem.

Chegamos a Durnwarth ao fim do quarto dia, com as patas exaustas dos cavalos afundando na lama escura das trilhas montanhosas. A recepção foi fria, como esperado. Os lobos do norte não têm o calor sulista — são brutos, diretos, forjados na neve e na batalha.

O Alfa Thorne nos recebeu em seu salão com uma expressão que era metade respeito, metade desafio.

— Alfa Ares Onderwood de Thunderwoof.

— Alfa Thorne, o velho urso de gelo. — devolvi o cumprimento, seco, mas respeitoso.

Kaelen iniciou os protocolos de negociação com naturalidade.

Os termos da troca estavam sobre a mesa: nós ofereceríamos peles tratadas, trigo estocado e treinamento para jovens guerreiros. Em troca, receberíamos acesso aos minérios do norte e às rotas secretas de caça de cervos.

Tudo parecia caminhar bem.

Tudo... exceto eu.

Porque mesmo ali, cercado por lobos estranhos, cheiros densos, fumaça e cinza...

o aroma dela me perseguia.

Era como se estivesse marcado na minha pele.

Como se meu lobo se recusasse a esquecer.

*** Você a deixou. Ela era sua. E você partiu.

*** Eu precisava Grendor, chega de falar.

Bradei irritado com tudo isso, maldito instinto primal que quer uma fêmea a todo custo, inferno.

*** Eu a quero Ares e não vou deixar você a rejeitar.

Engoli em seco. Meu lobo não fazia ameças que não cumprisse.

Após mais duas horas de conversa, Thorne nos conduziu ao grande salão, onde um banquete havia sido preparado. As mesas de pedra estavam cobertas por carnes assadas, ensopados escuros, pães grossos, queijos envelhecidos e vinho do sul — raro por aqui.

— Comam. Bebam. Amanhã falaremos mais de acordos. Hoje, somos irmãos de sangue e terra.

Sentamos à mesa central, rodeados por lobos da elite de Durnwarth. Kaelen logo se engajou em conversa com um dos comandantes locais sobre rotas que cortavam pelas florestas mortas. Eu apenas observava.

Até que Thorne se virou para mim com um sorriso malicioso.

— Thunderwoof tem crescido rápido. Muitos dizem que é o Alfa, e não a terra, que alimenta o povo.

— E muitos estão certos. — respondi, firme.

— A juventude é perigosa, Alfa Ares. Pode conquistar reinos, mas também destruí-los, se não for contida.

— A juventude não me impede de ver o que é necessário. Nem de proteger o que é meu.

Thorne ergueu uma taça.

— Então brindo à sua visão.

— E eu à sua hospitalidade. — retribuí, bebendo o vinho forte, que descia como fogo.

Foi então que ele se moveu de leve para o lado e estalou os dedos.

Uma jovem loba se aproximou com passos graciosos. Cabelos longos como a noite, olhos dourados e pele clara. Vestia um manto de seda azul que expunha os ombros e parte das pernas.

Ela era linda. E ela sabia disso.

— Esta é minha filha, Lira. — Thorne falou, como se apresentasse um objeto raro. — A flor mais bela de Durnwarth. Forte como a mãe, sagaz como o pai. E desimpedida.

Ela fez uma reverência delicada, mantendo os olhos em mim por tempo demais.

— Alfa Ares.

— Lira. — respondi com um leve aceno de cabeça.

— Estive pensando, — continuou Thorne — que talvez Thunderwoof precise de mais do que peles e ferro. Precisa de alianças duradouras. E o sangue é o elo mais forte entre matilhas. Ele disse e sabia o que ele queria dizer, companheiras escolhidas não era exceção no meu mundo, havia aqueles que tomava por poder, mas virava uma história louca quando a destinada aparecia, então o rei declarou que somente destinadas não aparecendo até os trinta anos podemos escolher a que quiséssemos, mas ainda assim, havia quem escolhia pela ganância e muitas das vezes rejeitava suas destinadas as deixando morrer lentamente, ou se fossem bonzinhos, a deusa lhes dava uma segunda chance. Era assim a forma como vivíamos.

— Agradeço a generosidade, Alfa Thorne. Sua filha é... notável. Mas alianças duradouras devem nascer de propósitos, não de aparências.

— Propósitos podem crescer. Especialmente quando regados com poder e beleza. — retrucou ele, com um riso rouco.

então me inclinei um pouco para frente, os olhos firmes como pedra.

— Minha matilha cresceu sob minha liderança. Sem casamentos. Sem alianças forçadas. O respeito que conquistei... não foi herdado, foi cravado com as garras.

Um silêncio se fez por alguns segundos. A filha desviou o olhar, constrangida.

Alfa Thorne apenas riu, um pouco mais seco.

— Você tem mais da sua mãe do que imaginava.

— E mais do meu pai do que gostaria. — murmurei.

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