 Mundo de ficçãoIniciar sessão
Mundo de ficçãoIniciar sessãoA água quente deslizava pelo corpo de Helena, como se pudesse lavar a dor que teimava em se agarrar a sua pele. Ela fechou os olhos, deixando que a água se misturasse com as lágrimas silenciosas que desciam. Lembranças vinham de forma dolorosa: às vezes em que ele a acusava, sem piedade.
“Você destruiu a minha vida” ele disse uma vez, a voz embriagada de ódio. “Você me separou do único amor que eu tive!”
Helena apertou os olhos com força, tentando apagar a voz que ecoava dentro dela. Não sabia o que doía mais: a raiva pela injustiça ou a pena que sentia de si, por ter aceitado tão pouco em troca de tanto amor que sentia por ele e de toda dedicação.
Depois de longos minutos sob o chuveiro, seus músculos pesados e a mente exausta, ela desligou a água, se enxugou e vestiu o roupão. Mas, ao dar poucos passos, sentiu a náusea subir novamente. Ela correu para o banheiro e vomitou outra vez, o corpo todo tremendo.
"Deve ser o estresse…", pensou, tentando se convencer. "O que vi naquele celular... só pode ser isso."
Mas a lembrança do deboche de Isabelle, do sorriso cruel que viu em seus lábios quando ela mandou a foto, fez seu estômago revirar mais uma vez. Helena se sentia perdida. Raiva, Tristeza, um vazio tão grande que se misturavam e parecia capaz de engoli-la.
Sem forças para mais nada, Helena se sentou na poltrona, deixando seu corpo repousar ali. Ela iria esperar Alexander voltar, precisava de uma explicação. O cansaço a venceu e Helena adormeceu na poltrona do quarto, ainda envolta no roupão, esperando por ele... mas a noite passou, e ele não voltou.
A luz da manhã cortou seu descanso inquieto. Ela acordou com o corpo moído de dores, a cabeça latejando e o enjoo persistente que parecia piorar. Sem ânimo para sequer encarar o café da manhã, ela decidiu ir ao hospital.
O avô de Alexander ainda não havia levantado e ela até achou melhor; não queria que ele fizesse perguntas que nem mesmo ela sabia as respostas. O motorista a levou para o hospital e Helena entrou sozinha. Na recepção, enquanto preenchia a ficha, ouviu duas funcionárias conversando:
— Você viu o novo médico? — cochichou uma delas, olhos brilhando de curiosidade.
— Quem não viu? — riu a outra. — Bonito daquele jeito, mas... parece feito de gelo. Dizem que veio do exterior, e ele é um dos novos donos do hospital. Mesmo tendo toda essa grana, ainda continua atendendo.
— Isso que chamo de devoção — resmungou uma delas — Queria um homem como esse, que tivesse toda essa devoção por mim.
Helena ouviu com desinteresse. Beleza ou frieza... nada disso a interessava naquele momento. Assim que preencheu seus dados, se sentou em uma das cadeiras, perdida em pensamentos, aguardando ser chamada. Não demorou muito e logo chamaram seu nome.
Ao entrar na sala de atendimento, deu de cara com ele. O médico tinha cabelos escuros e olhos intensos, mas frios como inverno. Seus traços eram marcantes, a presença quase intimidadora. Talvez fosse um pouco mais velho que ela, mas o que mais chamou atenção foi o olhar: carregava uma dor que ele parecia tentar esconder.
— Bom dia, senhora... Helena, correto? — disse ele, a voz baixa e contida.
— Sim — respondeu, tentando controlar a náusea que insistia em voltar.
— Sou Adrian Sinclair — ele continuou, estendendo a mão num gesto profissional. — Vou cuidar do seu atendimento hoje.
Helena apertou a mão dele brevemente. O toque dele era firme, mas impessoal. Durante o exame, Adrian fez perguntas rápidas e diretas, anotando tudo no prontuário.
— Vou pedir alguns exames, incluindo um de sangue — informou ele, sem muitos rodeios. — Precisamos investigar as causas desses sintomas. Alguma possibilidade de estar gravida?
— Não. — Helena respondeu sem hesitar.
No primeiro ano de casamento, era o que mais desejava, mas à medida que viu seu marido se recusando a tocá-la, perdeu as esperanças.
— Entregue isso para a enfermeira, ela vai te explicar como vai fazer os exames. — Entregou o pedido a ela, sem olhar muito em sua direção.
Helena apenas assentiu. Algo naquele olhar frio lhe lembrava seu marido... mas era diferente. Não havia desprezo, apenas distância. E talvez... um pouco de cansaço.
Após sair do consultório, Helena seguiu para a recepção e como estava em jejum, seguiu para fazer o exame. A atendente sorriu gentilmente ao entregar a ficha.
— O resultado sai amanhã, senhora Helena.
Helena agradeceu e saiu do hospital. De volta à casa vazia, apenas o avô do marido veio recebê-la.
— Minha querida, como está se sentindo? — perguntou ele, preocupando-se ao ver seu semblante abatido.
— Estou cansada — respondeu ela, a voz fraca.
— Ele... — o velho hesitou. — Seu marido apareceu em casa, mas já saiu outra vez. Vou falar com ele. Exigir que ele tenha responsabilidade.
Helena forçou um sorriso triste.
— Não sei quanto tempo mais posso aguentar…
O avô segurou sua mão com delicadeza.
— Não perca a esperança, filha. Tudo muda no tempo certo.
— Só não sei se quando chegar esse tempo, ainda faça algum sentido.
Ela sorriu fracamente, sem coragem para discutir. Subiu para o quarto e se deixou cair na cama. O quarto, seu pequeno refúgio, agora parecia um cárcere. Contra toda a lógica, ela abriu a foto mais uma vez no celular.
Aquela imagem cravava em seu peito como uma lâmina. Ela bloqueou a tela bruscamente e fechou os olhos. Veio à mente a última vez em que ele a tocou... bêbado, cheio de rancor.
— Você tem que pagar pelo que me fez — ele disse, as mãos pesadas, o olhar vazio.
Helena se encolheu, as lágrimas molhando o travesseiro. Arrependia-se de nunca ter contado a ele a verdade. De ter se perdido em um amor cego. O dia passou arrastado. Ela não desceu para as refeições. Nem sequer respondeu quando bateram à porta.
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Na manhã seguinte, Helena voltou ao hospital. Edward, persistente, ligava insistentemente para o neto, que por fim atendeu. Após uma bronca pesada, informou que Helena estava no hospital.
Na sala de espera, cada segundo parecia mais sufocante. Finalmente, chamaram seu nome. Ela entrou no consultório com as mãos suando frio. Adrian Sinclair a esperava, tão sério quanto da primeira vez.
O ambiente parecia menor, como se as paredes estivessem fechando em torno dela. Sem uma palavra, ele lhe entregou um papel. Os olhos de Helena percorreram as linhas. Sua pele empalideceu. O chão pareceu sumir.
— Não... não pode ser... — sussurrou, antes que as forças a abandonassem.









