CAP-05

A sala estava lotada. O ar carregado. Três líderes das máfias aliadas da Espanha estavam reunidos com Paolo para selar um acordo que levaria meses de articulação — e representava um avanço no cerco contra Arturo.

— Estamos com você, Paolo. Mas não haverá volta.

— Eu nunca quis volta. Só justiça. — respondeu ele, firme, a mandíbula tensa.

Mateus se manteve calado, observando, como sempre fazia — olhos atentos a cada respiração, a cada hesitação nos rostos ali presentes.

Paolo ergueu a taça de vinho.

— Que esse pacto leve o nome de Arturo para o chão.

E então… o telefone tocou.

O som cortou o ar como uma lâmina.

Ele olhou o visor. Número desconhecido.

Atendeu.

— Ortega.

O silêncio do outro lado era como um vácuo.

Até que a voz surgiu.

Baixa.

Arrastada.

Cruel.

— O tesouro da sua vida... agora é meu.

Arturo.

Paolo congelou.

O sangue gelou por um segundo — e então ferveu.

— Filho da puta. O que você fez?

Uma risada.

— Ela está comigo. E tão bonita quanto na festa. Uma pena que você não vá vê-la de novo.

Clique.

A linha caiu.

Por um segundo, o tempo parou.

Mateus já estava de pé antes que Paolo falasse.

— Rastreie a ligação. Agora.

— Já estou no sistema.

Os líderes da máfia levantaram, alarmados.

— O que houve?

Paolo respondeu com a voz mais fria que já usara na vida.

— Arturo sequestrou minha irmã.

A taça de vinho caiu da mão de um dos aliados e se espatifou no chão, tingindo o mármore de vermelho.

Como sangue.

Como presságio.

A escuridão era sufocante.

O cheiro no ar era de ferrugem e medo.

Seus pulsos doíam, amarrados. A cabeça latejava. Havia sido pega na saída do estúdio — um carro preto, um pano com cheiro doce e sufocante.

Agora, presa.

Mas viva.

Por enquanto.

Ela respirou fundo. Tentou conter o pânico.

— Paolo vai vir. — sussurrou para si mesma. — Ele vai me achar. Vai me tirar daqui.

Mas mesmo enquanto tentava acreditar, sentia que a sombra de Arturo se aproximava.

Passos.

Lentos.

Ecoando.

A porta se abriu.

— Hora de conversar, princesa espanhola

A porta se fechou com um estalo seco.

Um som que parecia cortar o ar e arrancar dela mais um pedaço de coragem.

Ele entrou.

Arturo.

Vestido com um terno escuro impecável, como se fosse apenas mais uma noite comum para ele. Como se o inferno não estivesse acontecendo bem ali, dentro daquela sala. Dentro dela.

— Não disse que teria você? — ele sorriu. Um sorriso que não tocava os olhos. Que gelava a alma.

Isadora recuou, mesmo com as pernas bambas e o corpo ferido.

— Você é um lixo. Um homem fraco que só consegue o que quer com ameaças. — cuspiu, mesmo com os lábios rachados.

O tapa veio rápido. Estalado. Ardente.

Mas o orgulho dela ficou em pé.

— Você fala como se ainda tivesse escolha, bella.

Ele se aproximou, puxando-a pelo queixo.

— Mas aqui, a única voz que importa… é a minha.

Ela não chorou. Não implorou.

Mas sentia tudo dentro dela quebrando. Cada palavra dele era uma corrente a mais. Cada toque forçado, uma nova cicatriz — visível ou não.

Arturo fazia questão de manter o controle: impedia o sono, deixava a luz acesa a noite inteira, a alimentava mal, e a torturava com palavras.

— Sabe o que eu gosto em você? Essa vontade de viver. Isso torna tudo mais… divertido.

— Meu irmão vai te matar. — sussurrou ela.

Ele sorriu, se agachando diante dela.

— Seu irmão não vai encontrá-la. E mesmo que encontre… verá você destruída.

Mas Arturo subestimava algo:

a força da esperança.

Mesmo presa, ferida, com o corpo exausto e o espírito arranhado, Isadora se agarrava à lembrança de Paolo.

Do estúdio de dança.

Dos filmes com pipoca.

Das promessas de liberdade.

— Ele vai vir. — ela dizia pra si mesma, cada vez que as lágrimas ameaçavam desabar. — Ele vai vir.

E Arturo, no fundo, sabia.

Por isso, intensificava tudo.

Porque um homem fraco tem pavor de perder o controle.

E Isadora… mesmo acorrentada, não era dele.

Não sabia se era o terceiro ou o quarto dia.

Lá dentro, o tempo não fazia sentido.

O cativeiro era um cômodo sem janelas, com paredes de concreto, uma luz fria e constante que nunca se apagava. Arturo vinha sempre em horários imprevisíveis. Às vezes só para observá-la, outras para humilhá-la, gritar, bater.

E quando não estava, seus capangas entravam, trazendo comida podre, ou arrastando-a para o banho forçado como se ela fosse um animal.

Mas Isadora…

Isadora encontrava espaços invisíveis para continuar viva.

Quando estava sozinha, criava rotinas mentais.

Contava até mil. Imaginava danças completas em sua cabeça, passos de balé que seu corpo não podia mais fazer.

Repetia o nome do irmão baixinho, como um mantra:

— Paolo… Paolo… Paolo…

Ela recitava as músicas que conhecia de cor, às vezes sussurrando trechos de poesia que aprendeu na escola.

E, certa noite, quando a dor era tanta que quase perdeu a consciência, ela se agarrou à lembrança de uma coisa simples:

o cheiro da chuva na varanda da mansão deles.

Isso a manteve acordada.

Isso a manteve aqui.

Mesmo quando Arturo entrou e chutou a tigela de comida que ela nem havia tocado.

Mesmo quando a chamou de inútil.

Mesmo quando a agarrou pelos cabelos e ameaçou mais uma vez:

— Ninguém vai te encontrar. Eu sou o mundo agora. Você só me tem a mim.

Ela o olhou com os olhos vermelhos, machucados, e pela primeira vez sorriu.

— Você nunca será o meu mundo. Nem no inferno.

Ele a deixou sangrando.

Mas não venceu.

Sozinha, outra vez, ela rastejou até o canto mais escuro e ali se encolheu.

Não chorava mais.

Só pensava.

Lembrava-se das palavras do irmão. Das risadas que compartilhavam. Do olhar protetor dele quando a fazia dançar com os pés sobre os sapatos dele, ainda criança.

E prometeu a si mesma:

“Quando sair daqui, eu nunca mais vou me calar. Nunca mais vou ser refém de ninguém.”

As coordenadas estavam certas.

Ou era o que pensavam.

Mateus entrou na mansão apressado, o rosto fechado como uma tempestade.

— Localizamos um galpão no interior de Milão. Atividade suspeita. Movimento noturno. — jogou os papéis sobre a mesa. — Tem sinais. Marcas da Ortega. Ela esteve lá, Paolo.

O coração do Dom disparou — e a frieza que tanto cultivara nos negócios desabou. Ele não dormia há dias. Não comia. Só respirava o nome da irmã.

Isadora.

Reuniu os homens. Mais de vinte. Entraram armados até os dentes, silenciosos, prontos para a guerra.

Quando invadiram…

o galpão estava vazio.

Uma cadeira virada. Sangue seco no chão. Um lenço com o perfume dela.

Tarde demais.

Paolo ficou ali, parado. Os punhos cerrados. Os olhos ardendo.

Mateus chutou um tambor de ferro, gritando.

— Maldição! Ele tá brincando com a gente!

Paolo pegou o lenço e apertou contra o rosto.

— Ele quer que eu veja. Ele quer me quebrar.

E naquele instante, o Dom morreu.

Sobrando apenas o irmão. O monstro. O vingador.

— Chega. — disse, a voz baixa como trovão abafado. — Se Arturo quer guerra, vai ter guerra.

Três dias depois.

Três sedes da família de Arturo foram destruídas.

Cinco dos seus aliados mais leais foram encontrados mortos com moedas da Ortega nos olhos — o símbolo da sentença final.

Um por um.

Os primos. Os tios. Os antigos aliados.

Todos enterrados.

Mateus foi pessoalmente até a casa da irmã mais velha de Arturo.

— Foi um aviso. Agora é um massacre. — disse antes de atirar sem hesitar.

Ao fim da semana, a linhagem da família de Arturo era apenas um nome em extinção.

E Paolo, com sangue nas mãos e lágrimas no peito, soltou a frase que ecoaria como lenda no submundo:

— Só vai sobrar ele. Pra assistir tudo ruir. E depois, vai ser a vez dele.

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