A estrada de chão batido não facilita nossa chegada. O carro alugado geme sob o esforço que imponho ao acelerador, cortando o terreno irregular feito de pó, pedras e calor. Já cruzamos metade da manhã explorando hectares que parecem não ter fim. Amanhã partiremos rumo ao oeste - e só então começaremos a levantar os projetos.
Voltamos até o ponto onde deixei meu helicóptero. Mais tarde, alguém virá buscar o carro, como foi feito para deixá-lo aqui. Dinheiro compra praticidade.
A paisagem me captura por instantes. Mata fechada por todos os lados, lagos que refletem o céu com perfeição sombria, e, ao longe, uma queda d'água. Penso que daria uma trilha interessante... Quem sabe eu não me arrisque.
Depois que Paulina foi brutalmente assassinada, a dor se tornou meu combustível. Busquei adrenalina onde ela mais ameaçava: escaladas insanas, mergulhos suicidas, saltos em penhascos. Qualquer coisa que anestesiasse o fato de que fui eu quem causou sua morte. Amar deixou de ser opção. Meus contratos são claros - têm data para começar e acabar. As mulheres? Apenas objetos de prazer, submissas dispostas a serem moldadas à minha vontade.
- Soube da última? - Breno pergunta, fingindo surpresa. Passamos as últimas horas juntos no meio do mato, onde nem sinal de fumaça, quanto mais de 4G.
- Sabe que não - respondo seco, observando o horizonte enquanto o piloto, Ronaldo, conduz o helicóptero com precisão. Ele sempre pilota meus voos pessoais. Confio. E pago bem por isso.
- O presidente está tentando unificar a moeda com outros países - comenta com um tom calmo, porque sabe o quanto eu desprezo política. Um tropeço na língua de um desses merdas e as ações despencam.
- Enquanto eu estiver aqui, o Igor cuida de toda a merda burocrática. Estou de férias - corto o assunto, sentindo a dor de cabeça latejar graças ao sol escaldante.
Meia hora depois, pousamos na cidadezinha onde deixei Letícia. O dia foi exaustivo, e o único tipo de alívio que me interessa agora envolve o corpo suado da minha submissa.
A hospedagem é uma espelunca. Essas pessoas beijariam meus pés se soubessem quem sou - e o que posso comprar. A cidade inteira, inclusive. Mas não me importo. Em breve, eles saberão.
- Espero você às sete em ponto amanhã - aviso Breno com firmeza. Ele conhece meu desprezo por atrasos.
- Não é como se fosse sem mim - ele provoca. Breno não entende limites.
Ao entrar no quarto, encontro Letícia dormindo. Exausto, vou direto para o banheiro da pequena suíte. A água gelada percorre meu corpo, lavando a poeira... e parte da raiva. Mas não o suficiente.
Depois do banho, meu corpo exige alívio. Cruel, quase sádico, vou atrás da minha submissa. Bastam alguns toques para que ela se entregue - molhada, entregue, ansiosa.
Meus movimentos são fundos. Dolorosos. Intencionais. Gemo com prazer ao sentir cada músculo dela estremecer. Não há espaço para afeto. Após duas gozadas, Letícia apaga. É sempre assim. Nenhuma delas entende que não se trata de amor. Apenas prazer. Elas deveriam saber: está tudo nos contratos. E eu uso meu dinheiro e poder sem peso na consciência. Pisarei em quem for necessário.
Outro banho. Outro impulso. O cuzinho dela me distrai por alguns minutos, mas algo me inquieta. Decido sair.
A temperatura caiu, felizmente. Levo Letícia comigo. Caminhamos até a sorveteria da praça, quando algo chama minha atenção.
Um homem - barrento, grosseiro - tenta arrastar duas crianças magras até uma carroça velha. A cena me incomoda mais do que deveria. As palavras de Santiago, enviado do meu pai, ecoam: "Há um homem vivendo com dois meninos nas suas terras."
- Vá até a sorveteria. Te encontro lá - ordeno a Letícia. Ela tenta me beijar, como se houvesse intimidade entre nós. Bastou um olhar meu para ela recuar. Meu olhar assassino. O oposto exato do CEO que a imprensa idolatra.
Ela obedece. Boa menina.
Caminho até a cena que já atrai olhares de curiosos.
- Solta o meu irmão, seu merda! - Um dos garotos grita, olhos pretos inflamados. Magros. Frágeis. Mas há força naquela rebeldia.
Sinto. Algo está errado.
- Vejo que encontrei o homem que procurava - digo sem rodeios. Ele me encara, sorri. Sorriso sujo. Não gosto do que vejo.
- Senhor Castiel - ele diz, como se já me esperasse.
- Ótimo, poupamos apresentações - respondo. Ele estende a mão calejada. Não a aperto.
- Em que posso ajudar?
- Soube que vive há anos nas minhas terras - observo os garotos com o canto dos olhos. Eles ouvem em silêncio, atentos. Diferente do adulto, que parece desconcertado. Os meninos me encaram com... esperança?
Por que esse olhar me incomoda tanto?
- Minha esposa vivia lá com o primeiro marido... antes dele morrer.
- Entendo. Quero ver onde você mora. Sei que há rios e cachoeiras ao oeste - afirmo. Ele empalidece.
- Seria melhor ir amanhã de manhã. Sem luz elétrica, os mosquitos são infernais.
Não era meu plano ir hoje. Mas sua reação me diz muito. Com um último olhar aos meninos, dou meia-volta e caminho até a sorveteria.
O sorvete desce amargo pela garganta.
O problema é que meus instintos raramente falham. E algo me diz que a rebeldia daqueles dois moleques... tem motivo.