Natalie se aproximou de Alejandro, seu coração batendo de forma mais acelerada do que gostaria de admitir. A sala estava silenciosa, o único som sendo o suave bip do monitor cardíaco, que acompanhava os batimentos de Alejandro, sinalizando que ele estava, de fato, se recuperando. Seus olhos não saíam dele, como se a presença dele fosse magnética, algo que a puxava cada vez mais para dentro daquele mistério. Ela precisava manter o foco. Precisava ser profissional, como sempre fora.
Ela se inclinou para verificar os aparelhos que monitoravam seu estado. Seus dedos deslizaram pelas conexões, ajustando algumas configurações e conferindo os níveis vitais. Tudo parecia estável, mas ela sabia que a vigilância constante era fundamental, principalmente quando se tratava de alguém com o perfil de Alejandro. Ele parecia estar em boa saúde, mais forte do que qualquer paciente normal que ela já havia tratado, mas isso não a impedia de se preocupar. — Como está se sentindo? — Natalie perguntou, tentando soar natural, mas a curiosidade em seus olhos entregava o que ela realmente queria saber. Ela não estava apenas perguntando sobre a dor física; queria entender se ele estava escondendo algo. Alejandro a observou em silêncio. Seus olhos negros estavam fixos nela, como se estivesse avaliando cada movimento seu. Por um momento, Natalie sentiu-se desconfortável, como se estivesse sendo analisada por alguém que sabia mais sobre ela do que ela sobre ele. — Dor? — A voz dele era suave, mas carregada de uma ironia sutil. Ele parecia tão tranquilo, tão imperturbável, que quase parecia irreais as circunstâncias em que ele estava. — Eu sou acostumado com a dor, doutora. Não é algo que me afete. Natalie franziu a testa, seus dedos parando brevemente ao ajustar o monitor. Ela levantou os olhos para ele, percebendo como ele não parecia nem um pouco abalado, apesar de ter sido atacado. Havia algo desconcertante na maneira como ele falava, como se a dor fosse algo que ele já tivesse dominado, algo que fizesse parte de sua vida cotidiana. — Isso não responde à minha pergunta — ela respondeu, mantendo o tom suave, mas firme. — Eu perguntei se está sentindo alguma dor agora, nesse momento. Alejandro a observou por um tempo. Seu olhar estava fixo nela, mas havia algo mais nos seus olhos, algo que ela não conseguia decifrar. Ele parecia estar, de alguma forma, avaliando-a também, estudando-a com uma intensidade desconcertante. — Dor... — Ele repetiu a palavra lentamente, como se estivesse considerando seu significado. — Às vezes, a dor não é física, doutora. Não é algo que se sinta com o corpo, mas com a alma. Natalie engoliu em seco, a resposta dele a pegando desprevenida. Ele falava como se tivesse vivido uma vida marcada por feridas mais profundas do que qualquer cicatriz visível. Algo nele não correspondia à sua aparência tranquila, e isso a intrigava cada vez mais. Ela voltou a olhar para os aparelhos, tentando manter a compostura, mas não conseguiu ignorar a sensação de que havia algo mais acontecendo ali. Algo que ele não queria que ela soubesse. — Se você sentir alguma dor ou desconforto, me avise — ela disse, tentando voltar à sua posição de cuidadora, mesmo que a tensão na sala fosse palpável. Ela queria ajudá-lo, mas não sabia se ele queria ser ajudado. Não sabia o que ele realmente queria. Alejandro não respondeu de imediato. Ele apenas a observou por mais alguns segundos, o silêncio entre eles crescendo mais denso a cada segundo. Finalmente, ele quebrou o silêncio com uma leve risada, quase inaudível. — Você está se preocupando demais, doutora. Eu não sou o tipo de paciente que você está acostumada a tratar. O comentário dele a fez parar por um momento. Havia algo mais nessas palavras, algo que a fazia questionar as intenções dele. Mas, como sempre, ela manteve a calma. — Meu trabalho é cuidar de todos os meus pacientes, não importa quem sejam. — Ela respondeu, seu olhar firme sobre ele. Alejandro permaneceu em silêncio, mas seus olhos nunca deixaram os dela. Havia um jogo ali, um jogo de poder, e de alguma forma, ela sabia que estava entrando mais fundo nisso. Como se ele estivesse medindo suas palavras, avaliando suas reações, como se fosse uma forma de teste. Natalie sentiu o peso de seu olhar, mas se forçou a não desviar. Era estranho como ele conseguia deixá-la desconcertada, como se soubesse exatamente o que fazer para desestabilizá-la. Ela não podia se deixar abalar. Não agora. Ela finalmente deu um passo atrás, voltando a observar os monitores e fazendo um ajuste final nas configurações. Quando ela se afastou, Alejandro a observou com a mesma intensidade, mas agora havia algo mais nos seus olhos, como se estivesse esperando o próximo movimento dela. Como se soubesse que ela não podia mais se afastar desse enigma. Natalie não sabia o que ele estava pensando, mas sabia que ela não conseguia simplesmente deixá-lo ir. Não sem entender completamente o que estava acontecendo. A cada palavra dele, a cada olhar, ela estava sendo puxada para algo maior, algo que a fazia sentir que seu destino estava, de alguma forma, ligado a ele. E o mais perturbador era que ela não sabia se isso era uma benção ou uma maldição. Natalie se aproximou da cama com passos cautelosos, tentando manter a compostura enquanto se preparava para examinar os aparelhos novamente. Cada movimento que fazia parecia ser observado atentamente por Alejandro, que, mesmo deitado, mantinha os olhos fixos nela. Havia algo estranho no modo como ele a olhava — uma mistura de curiosidade e desafio. Ela começou a ajustar o monitor cardíaco, evitando o olhar penetrante dele por alguns segundos, até que sua voz baixa cortou o silêncio na sala. — Você está se sentindo bem? Alguma dor? — Perguntou, tentando ser profissional, mas sentindo a pressão de sua presença. Alejandro permaneceu em silêncio por um momento. Ele a observava com os olhos levemente estreitados, como se estivesse pesando cada palavra que ela dizia. — Você realmente acha que eu vou te contar, doutora? — Ele respondeu com um tom suave, mas com um toque de sarcasmo. — Se eu estivesse sentindo dor, você saberia. Natalie parou por um instante, encarando-o. Ele estava calmo demais, mais do que qualquer paciente que ela já havia tratado. Mas, ao mesmo tempo, havia algo de desconcertante em sua presença, algo que fazia com que ela se sentisse inquieta. — Não estou aqui para jogar jogos, Senhor Rojas — ela disse, tentando manter a firmeza. — Estou tentando ajudá-lo. Se você está com dor, eu preciso saber. Ele sorriu, mas não era um sorriso de alívio ou de gratidão. Era um sorriso enigmático, como se ele soubesse algo que ela ainda não conseguia entender. — A dor... — Ele murmurou, quase para si mesmo. — Ela é relativa, doutora. Você, talvez, veja a dor como algo a ser curado, mas, para mim, é apenas parte do ciclo. Uma constante. Natalie franziu o cenho, tentando entender o que ele queria dizer com aquilo. Mas antes que pudesse perguntar mais, ele continuou. — Você é boa no que faz. Isso é claro. Mas, no fim das contas, você está se perguntando por que está aqui, não é? Por que alguém como eu foi trazido a um lugar como esse. Ela não respondeu de imediato, apenas o observou. Era impossível não perceber que ele estava tentando manipulá-la, mas ela não sabia para que fim. O que ele queria dela? — Eu não estou aqui para fazer perguntas, Alejandro. Estou aqui para garantir que você fique bem, ou que pelo menos não se machuque mais. Isso é tudo. — Ah, claro... Você cuida de todos assim? — A voz dele era quase zombeteira, mas com um fundo de interesse genuíno. — Você tem uma maneira de cuidar dos outros, doutora. Mas você mesma... já se perguntou se alguém vai cuidar de você um dia? Ou se você sempre estará sozinha, tentando consertar os outros enquanto se esquece de si mesma? Natalie sentiu uma leve pontada no peito. Ele estava tocando algo que ela não queria admitir, algo que ela não queria refletir. Não era a primeira vez que alguém lhe dizia isso, mas de Alejandro soou diferente, quase como um aviso. Ela o encarou por um longo momento antes de falar. — Eu cuido de mim mesma, Alejandro. Não é você quem vai me ensinar isso. Ele riu baixinho, uma risada curta e quase desdenhosa. — Isso é bom, doutora. Afinal, todos precisam de algo em que se apoiar, não é? Ela não respondeu de imediato, a conversa deixando uma sensação estranha em seu estômago. Algo sobre ele fazia com que ela sentisse que, de alguma forma, ela estava sendo puxada para algo mais profundo do que imaginava. Enquanto ela se afastava novamente para revisar os aparelhos, a sensação de desconforto continuava a crescer. Era como se ele estivesse brincando com ela, mas de uma maneira que ela ainda não compreendia completamente. — Eu não sou seu paciente comum, Natalie. — Ele disse, com um olhar fixo nela. — E você não é uma médica comum. Ela sentiu o coração acelerar, um calafrio subindo pela espinha. Ele a havia chamado pelo nome, algo que ninguém até ali tinha feito, mas a forma como ele pronunciou o nome dela parecia carregada de algo mais. — Não importa quem você seja, Alejandro. — Ela respondeu, tentando não deixar transparecer sua própria insegurança. — Eu sou a médica aqui, e você vai me ouvir. Ele apenas sorriu, a expressão dele ainda enigmática. — Vamos ver até onde você vai, doutora. Ela deu as costas, sentindo o peso das palavras dele. Algo estava muito errado com aquela situação. E, de algum modo, ela sabia que ele não era apenas um paciente. Ele era parte de algo muito maior, e ela havia acabado de se envolver sem nem perceber.