O segredo de Lorenzo

O tempo avançava com rapidez. Isabela estava no sexto mês de gestação e a barriguinha agora era evidente sob os vestidos largos que ela usava na padaria. O bebê chutava com frequência e ela já começava a montar, com carinho e ansiedade, o enxoval da primeira filha.

Mas havia uma sombra pairando no coração de Lorenzo.

Todas as noites, ele observava a mulher que amava dormir, uma mão repousando sobre a barriga, um sorriso sereno nos lábios. E, por dentro, ele se sentia dividido. Por mais que tentasse viver uma vida comum ao lado dela, Lorenzo sabia: o mundo do qual ele vinha não era comum. E não era seguro.

Durante o dia, ele era o funcionário exemplar da padaria. À noite, ainda era respeitado – e temido – entre os círculos da máfia italiana de Londres. Já não fazia trabalhos violentos. Mas ainda tinha poder, contatos... e dinheiro. Muito dinheiro. E agora, com a chegada da filha, ele decidiu que não podia mais adiar: usaria esse poder a favor da família.

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— O quê? — Isabela arregalou os olhos assim que Lorenzo estacionou o carro.

Era uma rua tranquila no sul de Londres, com árvores floridas, vizinhança silenciosa, e uma charmosa casa de dois andares de tijolos vermelhos.

— É pra nós — ele disse, entregando a chave a ela. — A partir de hoje, essa é nossa casa.

Ela ficou sem reação por alguns segundos.

— Como assim nossa casa? Você alugou?

— Comprei.

Ela o encarou, atordoada.

— Como assim comprou? Você surtou, Lorenzo? Com que dinheiro? A gente mal cobre as despesas da padaria! E o financiamento? Documentos?

Ele respirou fundo. Era hora.

— Eu preciso te contar uma coisa, Bela. Algo que escondi desde o começo.

Ela gelou.

— Que coisa?

Ele abaixou o olhar por um instante, depois a olhou com firmeza.

— Eu fui – e de certa forma ainda sou – parte da máfia italiana em Londres.

Silêncio.

Isabela piscou, como se tivesse ouvido errado.

— Como é?

— Antes de te conhecer, minha vida era outra. Lavagem de dinheiro, proteção, acertos de dívida, transporte de armas… Eu cresci nesse meio. Meu pai era envolvido. Era o caminho mais fácil pra mim.

Ela deu um passo para trás, assustada.

— Lorenzo… você matou alguém?

— Não. — Ele foi rápido. — Eu nunca tirei uma vida. Fiz muita coisa errada, sim. Ameaças, negócios sujos. Mas nunca toquei em ninguém inocente. E desde que te conheci, estou fora das operações violentas. Tenho apenas controle de algumas partes do sistema: segurança, dinheiro, favores.

Ela ainda estava pálida.

— E esse dinheiro da casa?

— É limpo agora. Eu passei tudo por investimentos legais. Lojas, imóveis, ações. Tudo registrado. Ninguém pode tocar.

— Você me enganou. Durante todo esse tempo.

— Eu te protegi. Eu nunca quis que você vivesse com medo. Eu quis que você me amasse pelo que eu sou com você… não pelo que eu fui no passado.

— E se alguém bater aqui querendo cobrar algo? E se sua filha nascer em meio a tiroteios?

— Isso não vai acontecer. Eu garanto. Eu cortei todos os laços diretos. E se alguém ousar chegar perto de vocês, não vive pra contar.

Ela sentiu um arrepio. Parte de si estava revoltada. Outra parte… entendia. Sabia, no fundo, que Lorenzo sempre teve um lado sombrio. Mas também sabia que ele era capaz de tudo por ela.

— E os móveis? — ela perguntou, a voz trêmula. — Você comprou também?

— Estão sendo entregues hoje. Quarto completo. Banheira, roupas, berço… tudo do bom e do melhor. Eu quero que minha filha tenha o que eu nunca tive. E que você não precise se preocupar com nada.

Isabela sentou-se no degrau da varanda, passando as mãos no rosto.

— Eu não sei o que sentir, Lorenzo. Parte de mim tá aliviada por termos um lar. Mas a outra parte tá com medo. Medo de que esse passado volte.

Ele se ajoelhou diante dela, pegando sua mão com carinho.

— Eu entendo. E não te culpo. Mas te juro… eu sou outro homem desde que te conheci. A máfia foi o que me moldou. Você é o que me transformou.

Ela o olhou nos olhos. Viu arrependimento. Viu amor. Viu medo.

— Promete que vai fazer tudo certo daqui pra frente?

— Eu prometo. Por você. Pela nossa filha.

— Então me ajuda a pendurar as cortinas e montar o berço, senhor mafioso.

Ele sorriu, aliviado.

— Com prazer, senhora da minha vida.

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Naquela noite, Isabela percorreu os cômodos da nova casa com os olhos brilhando. Tocou as paredes, imaginando quadros. Sentiu o perfume de tinta fresca misturado com madeira nova. Sorriu ao ver o berço ainda desmontado e as caixas de fraldas empilhadas no canto do quarto.

Não era a vida que ela imaginou. Era cheia de segredos, riscos e contradições.

Mas era a vida dela. Com Lorenzo.

E, naquele momento, mesmo com o coração acelerado e o medo pairando, ela sabia: ali nascia um lar.

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