Alguns meses depois…
— Que tal esse? — pergunto para Ava quando saio do provador de uma loja e imediatamente seus olhos vagam de cima a baixo pelo meu corpo, apreciando o lindo vestido de alcinhas, com decote profundo que realça os meus seios.
— O vermelho combina perfeitamente com a senhora — diz, abrindo um sorriso largo.
— Ok. Eu vou experimentar mais um e vamos embora. A reunião do Vittorio já deve estar terminando, e ele odeia esperar.
— Certo, senhora. Eu vou rapidinho ao banheiro e já volto — Ava avisa, saindo apressada.
E o fato de a garota sair correndo, deixando-me sozinha no salão de uma boutique, faz os meus ouvidos zunirem. No mesmo instante, meus olhos correm para a saída da loja. O meu coração b**e tão forte e tão rápido que é quase difícil respirar. Minha garganta seca imediatamente quando penso na possibilidade de fugir para bem longe daqui.
Mas que tolice, Abby! Minha consciência reprova. Vittorio a encontraria em um piscar de olhos e com certeza ele a puniria severamente por isso.
— Pronto, senhora — Ava fala, adentrando o salão outra vez. Agitada, meus olhos se desviam das portas largas de vidro para encará-la. Meus ombros caem em frustração. — A senhora está bem? — Ela procura saber.
Balbucio.
— Eu… estou bem.
— E o vestido? — Olho para a peça na minha mão.
— Ah… eu vou ficar com os três, Ava — falo, juntando as peças para entregar-lhe. E, quando ela se afasta para ir até o balcão, solto o ar com força pela boca.
Logo que retornamos para a mansão, percebo o movimento dos empregados pelo jardim, onde algumas mesas redondas estão dispostas com toalhas brancas de linho e arranjos florais da mesma cor. Hoje é um dia especial para a família Leone: Nádia está grávida do terceiro filho de Vittorio e isso é motivo para celebração. Contudo, algumas pessoas importantes estarão presentes e julgo que haverá uma pausa para os negócios ilícitos em algum momento.
— Ora, se não é a boneca de porcelana do senhor Leone? — Nádia resmunga com desdém, abrindo o seu habitual sorriso debochado quando alcanço o primeiro batente da escadaria da mansão. Resolvo ignorá-la e começo a subir os degraus. — Como pode ver, você não é a única que ele come nessa casa.
Paro na metade do caminho. Meus dedos apertam sobremaneira o corrimão e respiro fundo.
— A diferença é que eu reproduzo, querida. Já você… o que tem feito pelo poderoso Vittorio Leone?
Infelizmente, sou a sua preferida. Tenho vontade de rebater.
— Meus parabéns pelo novo bebê, Nádia! — digo, sem olhar para trás.
— Será outro menino. Eu sinto isso. — Regozija. — E ele vai tirar você desse pedestal em que foi colocada, apenas para me pôr no seu lugar.
Deus te ouça! Resmungo mentalmente.
— Como eu disse, meus parabéns, Nádia! — retruco com desdém e sigo subindo os degraus.
— Invejosa! — Ela grunhe.
Reviro os olhos.
À noite, observo a alta sociedade se espalhar pela grama, brindando e saboreando drinques, enquanto sorriem e conversam amenidades. Do outro lado, Vittorio fala com um grupo de homens de negócios. No entanto, decido me afastar da agitação da festa e procuro um lugar calmo perto de um lago de águas tranquilas, ladeado por arbustos decorativos. Com uma respiração profunda, esvazio minha taça de champanhe e miro a lua cheia. Ela está linda e brilhante, destacando-se em um céu escuro.
— Linda, não é? — Uma voz imponente ecoa atrás de mim, fazendo-me virar imediatamente. Fito um homem estranho dentro de um smoking negro. Seu olhar escuro revela certa agressividade e frieza. No entanto, ele não me desperta medo. Tão pouco insegurança. No entanto, decido desviar meus olhos dos dele e voltar a fitar a lua.
— Muito — respondo, quase sem perceber.
— Notei que você não gosta muito de aglomerações. — Ele comenta, aproximando-se devagar, mantendo suas mãos para trás do seu corpo, até parar bem do meu lado.
— Andou me observando? — retruco desdenhosa.
— Um pouco. — O encaro. E ele me encara de volta.
— Meu marido não vai gostar de saber que um homem andou me observando a noite inteira. Ele o mataria somente por essa aproximação indevida.
— E quem não? Uma mulher como você não deveria estar sozinha no meio de tanta gente.
Mais um obsessivo no meu caminho, não dá para suportar.
Grunho em silêncio.
— Eu me lembro de você de… algum lugar — digo com voz neutra, desviando os meus olhos novamente. — Ah… claro. Na danceteria.
Ele apenas meneia a cabeça.
— Devo dizer que você estava linda naquela noite e que era impossível não a olhar. — Sua voz se torna estranhamente áspera.
— Ah… eu preciso voltar para a festa. — Tento passar por ele. Contudo, sinto seus dedos no meu braço e nossos olhos voltam a se cruzar. Dessa vez, percebo algo diferente em suas retinas. Algo que não consigo decifrar, mas que, de alguma forma, me causa certo medo. — Me solte! — ranjo entre dentes, livrando-me do seu agarre.
— Senhora Leone? — A voz de Ava me alcança no meio da escadaria e me faz estremecer. Nervosa, olho para trás, mas o estranho não está mais no terraço e inevitavelmente, começo a procurá-lo.
— Por Deus, por que se afastou de mim assim?! — A garota retruca um pouco irritada. — Por favor, não faça mais isso! O senhor Leone arrancaria a minha cabeça do corpo se soubesse que a perdi de vista. — Ela enlaça o meu braço e me arrasta de volta à festa.
***
Semanas depois…
O calor do corpo dele junto ao meu me desperta no meio da madrugada, e uma ânsia de vômito me faz sair às pressas da cama para correr para o banheiro. Logo, um suor frio encharca a minha pele, e é como se minhas forças quisessem me abandonar. Fraca, e com a visão um pouco desfocada, me arrasto para debaixo do chuveiro e fico lá por algum tempo, até que o meu corpo se recompõe.
— O que há de errado com você, Abby? — murmuro, quando a mesma ânsia retorna pela manhã. Ao sentar-me à mesa, o cheiro da comida me provoca enjoos fortíssimos.
— Você está bem, Coelhinha? — Vittorio pergunta, ao perceber a minha angústia.
Forço um sorriso para ele.
— Eu estou bem. — Tento convencê-lo.
— Tem certeza? Você está pálida.
— Deve ser só um mal-estar.
Seu olhar me avalia por alguns instantes.
— É melhor que seja apenas um mal-estar. Não queremos novidades entre os nossos lençóis, certo, querida?
Seu tom ameaçador me diz que estarei em apuros se uma gravidez indesejada surgir. E, meu Deus, eu realmente espero que não seja uma gravidez.