Capítulo 1

Morar em uma fazenda em Minas Gerais, com certeza seria uma experiência única na minha vida, não que não estivesse habituada a uma vida pacata, afinal, morei até os meus 19 anos no interior de São Paulo.

- Carol, amor. Você está acordando muito tarde, não acha que poderia me acompanhar nos compromissos da manhã na transportadora? - Meu marido pergunta quando me junto a ele no escritório da fazenda.

- Fê, você sabe que tenho ficado em reunião até tarde da noite com os funcionários da loja. Não é fácil administrar uma empresa estando longe, sabia? - Pergunto dando-lhe um beijo carinhoso nele.

Eu havia notado que o Fernando andava muito irritado, desde que nos mudamos para cá. Eram muitos problemas na administração da fazenda e ele estava tentando colocar as coisas no lugar.

- Eu sei, meu amor, me desculpe. Não quero te encher com os problemas da fazenda. - Ele diz mal olhando para mim.

Saio do escritório e acho que o Fernando nem nota, eu sabia que ele estava cheio de trabalho. Seu irmão descobriu que o dinheiro da fazenda da família estava sendo desviado e eles resolveram assumir de perto a administração.

- A Júlia está trabalhando há tanto tempo, na transportadora, ela anda como se fosse a dona daquele lugar e a futura dona dessa fazenda. O Fernando está casado com a moça de São Paulo, mas Júlia ainda tem certeza que os dois vão se reconciliar. - ouço a voz de uma das cozinheiras.

Eu estava aqui há pouco mais de um mês e estava sempre ouvindo meu marido falar dessa Júlia, que ela era uma amiga de infância e auxiliava na administração da trasportadora, mas que eles tiveram alguma coisa, isso era novo para mim.

- Oh Ceci, cala essa boca. Não mencione isso, novamente, certo? A dona Carol te ouvir falando uma coisa dessas, você vai arrumar um problemão. - Ouço a voz da cozinheira mais velha e entro na cozinha como se não tivesse ouvido nada.

- Bom dia, meninas. Como vocês estão? - Falo sorrindo para disfarçar que ouvia a conversa delas.

A Ceci fica toda sem jeito na minha presença e logo arruma uma coisa para fazer nos fundos.

- Maria, ainda tem aquele bolo de milho maravilhoso que você faz? - Pergunto me sentando no balção da cozinha.

Tento disfarçar a angústia que se formou no meu peito e o sentimento de desconfiança. Eu havia notado que desde que nos mudamos para cá, o Fernando estava cada dia mais distante de mim, mas eu imaginei que fosse por causa do trabalho e não cheguei a atribuir isso a nada, tampouco uma paixão de infância.

- Tem sim, dona Carol. Guardei um pedaço especialmente para a senhora. - Ela diz e vejo no relógio da parede que já são quase meio dia.

De fato, eu estava acordando muito tarde, mas passava a noite desenhando e enviando os mais novos modelos para o meu ateliê em são paulo.

- Carol, vou sair para almoçar. - Fernando diz passando por mim.

- Eu vou com você. - Falo me levantando instantaneamente - Maria, pode guardar o bolo pra mais tarde. Eu como quando voltar, tudo bem? - Aviso.

Fernando me olha parecendo surpreso com minha reação. Faz algum tempo que não almoçamos juntos, já que nossos horários não estão coincidindo. Na hora que ele está saindo para almoçar, eu estou tomando café, ou ainda estava dormindo, mas a partir de hoje eu estava disposta a mudar isso

- Não vai tomar café? - Ele pergunta parecendo não ter gostado da ideia.

- Quero ficar um tempo com meu marido. - Falo sem querer conversar mais nada na frente de outras pessoas e apesar da Maria ser uma pessoa discreta, eu sabia que ela estava observando.

- Isso é realmente novo, você está se matando de trabalhar. Pensei que havia esquecido que tinha um marido. - Fernando me alfineta quando entro no carro e me sento ao seu lado.

Ele dá partida e pela primeira vez mostra sua chateação com nossa distância.

- Fernando, você sabe que a empresa depende de mim, eu preciso trabalhar para manter o bom funcionamento das coisas. - Falo e dou uma olahada no meu celular que tem algumas mensagens das minhas funcionárias, mas decido ignorar isso por enquanto.

- Eu só acho que você poderia se desconectar um pouco, Carol. Nós estamos no mesmo lugar, mas nos vemos muito pouco. A hora que eu estou levantando é a hora que você está indo dormir, eu quero estar com você. Mas eu preciso que você também queira estar comigo. - Sua última frase me atinge em cheio.

- O que você quer dizer com isso, Fernando? - Pergunto tentando conter minha irritação.

- Que estamos distantes, Carol. Quero que passe mais tempo comigo.

Não respondo nada, pois sei que ele não está totalmente errado. De fato estamos muito distantes desde que nos mudamos para cá. Tenho me dedicado muito ao trabalho e esquecendo de onde estou. Vou tentar ser mais parceira possível do meu marido, ele tem estado estressado demais ultimamente.

Fernando estaciona o carro em uma vaga de um pequeno e pitoresco restaurante no vilarejo que fica há poucos km da fazenda. O lugar é bem bonito e exótico, as paredes de pedras parecem ter sido colocadas de forma grosseira propositalmente, o que dá um certo charme ao lugar. Há meia dúzia de mesas ocupadas do lado de fora.

Fernando me guia para dentro do restaurante e não consigo deixar de notar sua tensão, ele parece estar hesitante com algo e suponho que seja pelo pequeno atrito que tivemos no carro, mas assim que ele me apresenta para sua amiga, Júlia, sinto que ele está hesitante por nós duas termos nos conhecido.

- Carol, é muito bom poder finalmente dar um nome ao rosto. Como você é bonita. - A Júlia diz me abraçando assim que o Fernando nos apresenta.

Não deixo de notar como ela está bem arrumada, bem maquiada e com roupas super justas, talvez seja seu estilo. Quase me sinto inferior perto de toda sua presença, ela é alta, loira e muito bonita, está bem alegre e toda sorridente. Parece genuinamente feliz em me conhecer.

- É bom conhecer você também, Júlia. - Falo e nos sentamos.

O diálogo da Ceci e da Maria fica rondando pela minha cabeça e fico imaginando quantas vezes o Fernando sai para almoçar com a Júlia, já que é meio obvio que eles ficariam sozinhos caso eu não tivesse vindo junto.

- Carol, está gostando de morar aqui? Imagino que seja algo fora da sua zona de conforto. Afinal, você morava em São Paulo, devia ser uma correria. - Ela pergunta simpaticamente.

- Sim, São Paulo é uma loucura de carros e pessoas apressadas, mas eu gosto muito de lá, é a minha casa. Estou habituada.

- Realmente. a Carol ainda está um pouco presa a São Paulo, mas logo ela se adapta aqui. - Fernando diz e fico sem graça diante de sua indireta. uma garçonete vem fazer nossos pedidos.

O Fernando escolhe um prato que diz que vou adorar, para nós dois e a Júlia também faz seu pedido.

- Logo você se acostuma com o ambiente, é realmente uma loucura o quanto tudo é diferente, né? Eu já estive em São Paulo com algumas amigas, e juro por Deus, eu nunca me imaginaria morando em uma cidade tão agitada, eu gosto de estar e morar aqui. É realmente o meu lugar. - Ela diz fazendo um trocadilho com a frase que eu usei.

- Oh, imagino que sim. Júlia, há quanto tempo trabalha na fazenda? - Pergunto.

- Faz alguns anos, não é, Nando? - Não deixo de notar o apelido pelo qual ela chama o meu marido. - Assim que me formei na faculdade, o Nando sugeriu que eu fosse trabalhar lá. O que deu muito certo, afinal, estou lá até os dias de hoje. - Ela diz sorridente.

- Sim, a Júlia é essencial na administração da transportadora. Todos os funcionários respeitam seu trabalho lá. - Fernando diz e observo a maneira como ela fica alegre com esse elogio

- É realmente impressionante. - Falo ajeitando passando as mãos em meu cabelo, para disfarçar o meu incomodo.

- Carol, talvez possa aparecer mais vezes na transportadora, para conhecer, entender como funciona. Nossa dinâmica lá, é muito interessante.

- Com certeza estarei mais perto de tudo de agora em diante. - Sou firme.

Vejo um vislumbre passar no rosto da Júlia, mas logo esboça um sorriso.

Nossos pratos chegam e comemos enquanto ouço a Júlia contar da sua infância com o Fernando, o quanto eram melhores amigos, mas nenhum dos dois toca no assunto de que já tiveram um relacionamento na adolescência. Talvez nem tenha acontecido verdadeiramente.

Depois que comemos, a Júlia sai dizendo que tem alguns assuntos pessoais para resolver e o Fernando me leva para conhecer a cidade em que cresceu.

- Eu adorava vir pra cidade encontrar meus amigos, quando criança. - Fernando diz enquanto caminhamos de mãos dadas.

Noto o quanto as pessoas da cidaden são agradaveis e como ele é bastante conhecido na região, pois praticamente todas as pessoas, param para nos cumprimentar.

- Deve ter sido incrivel crescer nesse lugar, não é? As pessoas aqui são tão agradaveis.

- Foi sim... quero que nossos filhos cresçam aqui. - ele diz.

Nós não falamos muito sobre filhos, mas era um assunto que uma hora ou outra sempre surgia em nossos dialogos, eu não queria ter filhos agora, mas tenho certeza que se dependesse do Fernando, já teriamos pelo menos dois.

- Nando, como é bom te ver, cara. - um homem que aparenta ter a idade do Fernando chega e cumprimenta-o, com um aperto de mão.

- Ronaldo, quanto tempo, meu amigo. Como estão as coisas? - Fernando.

- Está tudo bem por aqui. Abri um escritório do outro lado da cidade, quem sabe você possa ir lá visitar depois, hein? - Ele fala e seu amigo me vê ao lado do Fernando.

- Essa é a minha esposa, a Carol. Carol, o Ronaldo é um grande amigo meu. - ele nos apresenta e cumprimento seu amigo.

- Não sabia que estava casado, hein? O que andou aprontando em São Paulo? - seu amigo pergunta e fico desconfortável.

- Encontrando o amor da minha vida. - Fernando responde me abraça.

- Você dizia o mesmo, pra Júlia, hein? - Ronaldo diz e sai dizendo que precisa ir ao seu escritório.

É como se eu tivesse tomado um balde de água fria, pois não gosto nadinha da insinuação que seu amigo acabou de fazer.

- Podemos ir embora? Estou cansada. - Falo e ele apenas assente.

Fernando também parece não ter gostado nadinha da revelação que acabou de ser feita, e eu, muito menos. Mas apenas fico quieta.

- Quando pretendia me contar que teve um relacionamento com a Júlia? - Pergunto assim que entramos no carro.

- Não era algo que merecia ser mencionado, Carol. Não teve importância. - Ele diz.

- Como não, Fernando? Se eu não tivesse ido almoçar com você, vocês almoçariam sozinhos, sabe-se lá quantas vezes não estão ficando juntos e sozinhos, quantas vezes não tem almoçado juntos, tomado café juntos...

- Nem ouse tentar insinuar nada, Carolina. A Júlia trabalha para mim, há anos. Nunca mencionei o relacionamento que tivemos pois foi algo de crianças, jovens. Acabou, passou. Você é minha esposa, eu respeito você, o nosso relacionamento. Não preciso ficar falando sobre coisas que aconteceram antes de nos conhecermos.

- Eu só acho que eu deveria saber, Fernando. - Falo com raiva.

- Se você faz tanta questão, pode perguntar o que quiser.

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