Gisele é uma mulher acostumada a ter tudo o que quer. É linda, inteligente e está prestes a se casar com um perfeito príncipe encantado. Ao menos era o que ela pensava... Rodrigo é rude, selvagem, mas extremamente protetor e intenso - uma combinação perigosa e muito atraente. Irmão de seu noivo, ele se torna a única salvação de Gisele em uma situação de perigo. Levados a uma convivência forçada, esses dois mundos completamente distintos colidem, fazendo surgir uma paixão explosiva e inesperada, que poderá guiá-los até a ruina... ou ao verdadeiro amor.
Ler maisOs saltos do sapato Loubotin batiam no piso de porcelanato do restaurante conforme ela andava. O som, ao qual ela sequer prestaria atenção em qualquer outro momento, parecia tão irritante quanto o zumbido de uma abelha instalada bem dentro do ouvido.
Não que isso fizesse diferença, afinal, ela já estava irritada o suficiente.
Tinha acabado de saltar de seu carro e naquele exato instante caminhava em direção a mesma mesa de sempre: a redonda, para seis lugares, na varanda do estabelecimento. Não que precisassem de espaço, mas Célia Loureiro queria ter controle sobre tudo e gostava de ter mais coisas do que realmente necessitava. Até mesmo cadeiras em uma mesa estúpida de um restaurante.
A cada passo que dava, sentia o coração bater mais apressado. Isso fazia com que acreditasse que era uma idiota, afinal, tratava-se apenas de sua mãe. Mas, para Gisele, isso significava muito mais do que uma simples reunião de família, especialmente porque o assunto que estaria em pauta em sua conversa daria um grande motivo para que ela se intrometesse em sua vida. Seu passatempo preferido.
Agarrando a alça da bolsa, como se isso fosse defendê-la de alguma coisa, ela finalmente chegou à mesa e deparou-se com sua mãe avaliando-a de cima a baixo, como sempre fazia.
Ela mal sentou-se e o primeiro comentário já veio:
― Acordou atrasada novamente?
― Não entendi a pergunta...
― Foi o que deduzi, ou seja, é a única explicação para a forma desleixada como está vestida.
Inconscientemente, Gisele baixou os olhos e checou suas próprias roupas. Naquele momento, usava uma calça jeans de uma marca bem cara, uma blusa de seda, de mangas longas, cor de pêssego, e um sapato meia pata preto. Não parecia haver nada de errado, se não levasse em consideração o fato de que Célia Loureiro vivia coberta por Chanel dos pés à cabeça.
― Eu vim tomar café da manhã com você e depois vou trabalhar. Não posso ir para a loja vestida como se estivesse indo receber o Oscar.
A resposta não foi das piores, mas a verdade é que todas as vezes que aquele tipo de conversa acontecia, Gisele se perguntava por que tinha que dar tantas explicações, por que sempre deixava que ela a diminuísse daquela forma, que fizesse com que se sentisse tão mal.
― Você é a futura esposa do dono da loja. Não só daquela onde trabalha, mas de toda a marca. Deveria se comportar como tal. Ou melhor, já deveria ter parado de trabalhar.
E tudo sempre se resumia a dinheiro e posição social. Gisele adorava dinheiro, sabia que não saberia viver sem alguns dos luxos com os quais estava acostumada desde que Célia se casara com seu padastro ― um homem santo, aliás ―, mas sua mãe excedia os limites. Era ostentadora e gostava de manter as aparências, mesmo que o mundo estivesse praticamente caindo sobre sua cabeça.
O que não era o caso de Gisele. A vida andava sorrindo para ela nos últimos tempos.
Pensando nisso, tentando deixar de lado a irritação que sua mãe sempre lhe provocava, ela tocou o pingente azul, preso à correntinha de ouro. A mesma com a qual fora presenteada anos atrás, a mesma pedrinha mágica da sorte.
― Não sei por que ainda guarda essa pedra estúpida. Quando era criança eu até entendia, mas agora, que é uma mulher adulta, não pode acreditar que é mesmo mágica ― Célia afirmou com desdém.
― E como não acreditaria? Se eu tinha qualquer dúvida, ela desapareceu seis meses atrás. Um dia depois de eu recuperar esta pedra, conheci Rodolfo.
― Está vendo, Gisele? É por isso que sua vida está sempre um caos. Se acreditasse menos em fantasia e focasse no que realmente é importante, já estaria com a bendita aliança na mão esquerda.
Ela quase gargalhou com a colocação da mãe. Estava namorando há apenas seis meses e já tinha sido pedida em casamento. Não que pudesse ser considerado um recorde, afinal, a própria Célia tinha levado o atual marido para o altar em poucas semanas.
― Esta pedrinha é a única lembrança que tenho do papai.
Pronto. Lá estava a confissão que não queria fazer. Odiava mostrar-se frágil na frente da mãe, mas sentira-se na obrigação de mencionar o pai. Por mais que ele não estivesse mais entre elas, era Gisele quem sempre se preocupava em manter suas memórias sempre vivas. A perda ainda lhe doía no coração, e ela acreditava que o sofrimento não desapareceria, como uma cicatriz eterna e feia, marcando-a para sempre.
Além disso, aquele era, talvez, o único assunto que fazia com que Célia perdesse um pouco daquele ar superior e intocável. No exato instante em que Gisele o mencionou, percebeu que ela respirou fundo, como se tivesse lhe faltado o ar. Seus olhos se fecharam instantaneamente, e Gisele sabia que ela fazia isso, porque temia que eles denunciassem seus sentimentos. Ainda havia amor dentro daquela mulher, mas ele fora enterrado junto com o marido. Embora, é claro, ela nunca o tivesse demonstrado, nem mesmo para ele.
Alguns minutos se passaram, onde um silêncio embaraçoso se colocou entre elas. Na verdade, sempre havia algo entre elas, mas nunca se tratava de um sentimento positivo, algo que pudesse assemelhar-se mais a um relacionamento entre mãe e filha.
Foi então que Célia mudou de assunto. Claro, até mesmo as conversas corriam da forma como ela queria. Estava sempre no comando.
― Mas não foi para construir um muro das lamentações que viemos até aqui. Vamos falar logo desse casamento; não tenho tempo a perder...
Ah, claro! Provavelmente ela não tinha mesmo tempo a perder. Com certeza tinha alguma hora marcada no salão de beleza.
Obedecendo-a, como sempre fazia, Gisele pegou sua bolsa Louis Vitton e retirou de lá, com todo o cuidado uma agendinha. Colocou-a sobre a mesa e começou a folheá-la até encontrar os dias que precisava checar.
― Aqui estão as indicações de fornecedores da Vânia, aquela amiga do Rodolfo que casou recentemente. A fotógrafa fez as fotos do casamento de várias celebridades.
― Celebridades? Você não é uma celebridade. É a futura esposa de um renomado empresário. Não pode se comparar a esse povo que sobe na vida usando o corpo... ― o desdém impregnado em sua voz era sempre irritante.
― Mas eu adorei as fotos. São de muito bom gosto... Olha... ― na mesma hora Gisele pegou seu iPhone e abriu o site da fotógrafa, como se necessitasse desesperadamente da aprovação dela.
Colocando seus óculos de grau da marca Cartier, Célia pegou o aparelho nas mãos e avaliou algumas fotos. A sobrancelha levantada era, sem dúvida, um sinal de seu desprezo pelo que via.
― Achei razoável. Fotos de casamento são para a vida inteira, você não vai querer que elas sejam razoáveis.
As malditas fotos eram incríveis. Cheias de emoção, bem trabalhadas e perfeitamente tiradas. Não havia nada de razoáveis nelas.
Isso era o que Gisele deveria ter dito. Mas não disse.
― Eu conheço um fotógrafo bem melhor ― Célia entregou-lhe um cartão de visitas simples, mas chique. Hesitante, Gisele o pegou e analisou. ― Diga que é minha filha e eles encontrarão um espaço na agenda. Aliás, acho melhor que eu deixe com você os nomes dos fornecedores das festas que organizo. Eles não trabalham em festas de celebridades, mas em eventos de políticos, empresários e pessoas da alta sociedade carioca. Você não vai querer envergonhar a família de Rodolfo com suas escolhas.
Quando deu por si, Gisele já tinha uma pasta completa nas mãos. Lá tinha cartões e folders de vários fornecedores, desde iluminação a floriculturas e bandas de classe. Ela não teria trabalho algum. O dinheiro trabalharia por ela.
― O que seria de você sem mim, Gisele? ― com um sorriso vitorioso no rosto, Célia bebericou seu chá gelado e observou enquanto o garçom as servia com um belíssimo café da manhã com waffles, tortinhas de limão, frutas e panquecas, além de variados sabores de geleias, patês e frios.
Estava tão irritada, enquanto avaliava o material que tinha nas mãos que nem percebeu que sua mão estava indo direto no prato das tortinhas. Em qualquer ocasião, se fosse qualquer outra pessoa, Gisele poderia dizer que sua mãe estava apenas tentando ajudar. E claro que aqueles profissionais eram os melhores no ramo e proporcionariam uma festa dos sonhos para qualquer mulher. E ela queria uma festa dos sonhos... queria ser uma princesa por um dia, a princesa que seu pai sempre dizia que ela era. Mas, por mais que quisesse um casamento luxuoso, também queria poder ter o prazer de escolher cada detalhe, de fazer as coisas com amor. Afinal, não era por amor que estava casando?
Tudo que sua mãe lhe oferecia parecia tão frio quanto ela mesma. O que não era de se surpreender.
― Gisele, tem certeza que vai comer isso? É uma bomba calórica! Não vai querer parecer um bolo confeitado no seu próprio casamento, não é?
E isso foi o limite.
― Mas que merda, mãe! ― com força, ela fechou a pasta e elevou a voz, fazendo com que várias pessoas ao redor voltassem seus olhos para a mesa onde elas estavam. ― Não pode controlar tudo! É o meu casamento! É a minha droga de vida... e eu posso comer o que eu quiser. Você não manda mais em mim... Não vou deixar!
A última frase saiu como um sussurro, como se, por mais que tivesse tentado soar segura, ainda não tivesse a força necessária para enfrentar a mulher que a atormentava desde pequena.
― Já terminou? ― com a mesma calma de sempre, Célia olhou para a filha da mesma forma como tinha olhado minutos antes de Gisele ter explodido: como se ela fosse um ser inferior. ― Espero que tenha liberado todo seu estresse, que é particularmente compreensível por causa da proximidade do casamento, porque não vou tolerar outra grosseria como essa. Sabe que se tentar fazer as coisas por si mesma vai dar tudo errado. Sempre dá. Você não é muito talentosa em muitas coisas e tem que aceitar isso. Foi uma sorte ter nascido bonita.
Ela deveria encarar aquilo como um elogio, pois era o único que iria receber em muito tempo. Na verdade nem se lembrava de já ter recebido algum vindo dela em toda sua vida.
― Mãe, acho melhor eu ir embora. Estou mesmo muito nervosa por causa dos preparativos, e não vamos conseguir conversar direito. Obrigada pela ajuda e me desculpe.
Célia não disse nada, apenas meneou a cabeça em uma afirmativa e novamente levou a xícara de porcelana à boca, como se nem se importasse com qualquer ação da filha. Como se ter ou não ter sua presença ali não fizesse a menor diferença.
Conforme caminhava para fora do restaurante, novamente ouvindo o barulho chato dos saltos dos sapatos, sentia-se desapontada consigo mesma. Conseguira levantar sua voz, demonstrar sua opinião, iniciar uma batalha por seus direitos, mas novamente falhara. Queria despertar qualquer emoção naquela mulher fria e insensível; queria vê-la gritar também, abandonar aquela postura de controle e segurança e reagir como uma pessoa normal. Mas nunca acontecia.
E talvez nunca acontecesse. Só lhe restava perder as esperanças e se contentar com o que tinha.
E não tinha, exatamente, muito o que reclamar. Estava prestes a se casar com um homem que não apenas a tratava como uma princesa, mas que também tinha condições de lhe dar uma vida de realeza. No final das contas, era tudo que importava naquele momento.
***
Uma dor bastante incômoda queimava suas têmporas, como em um princípio de resfriado. Contudo, ela sabia muito bem que sua doença tinha nome: Célia Loureiro.
Apesar disso, decidiu que a melhor escolha era deixar aquilo para lá, como sempre fazia. Até porque, estava chegando em casa, de volta ao seu palácio. E, afinal de contas, todo conto de fadas tinha uma bruxa malvada, não é mesmo? Por que seria diferente com ela?
Por mais que já morasse ali há um mês, Gisele sempre sentia-se um pouco abismada com a beleza e a opulência daquele lugar.
A cobertura estava localizada em um dos bairros mais caros do Rio de Janeiro: o Leblon. Tratava-se de um imóvel de mais de trezentos metros quadrados, triplex, com uma incrível vista para a Lagoa Rodrigo de Freitas. A decoração era elegante e minimalista, mas Rodolfo sabia dar valor a tudo de bom que seu dinheiro podia comprar. Os quadros de Salvador Dali originais, cada um avaliado em pouco mais de um milhão de reais, os tapetes persa, as peças de cristal... tudo ali cheirava a riqueza. E Gisele não podia reclamar nem um pouco, pois ela adorava tudo aquilo; adorava tudo que o dinheiro lhe proporcionava, afinal, sua mãe sempre lhe ensinara que ele pode lhe tornar mais bonita, mais legal e mais respeitável.
Normalmente não dava muitos créditos às coisas que Célia Loureiro dizia, principalmente porque suas habilidades como mãe não eram exatamente admiráveis, mas ela tinha razão quando se tratava de dinheiro.
Subiu, portanto, as escadas sem nenhuma pressa e chegou ao quarto que partilhava com Rodolfo. Um quarto dos sonhos, é claro. Um pouco masculino ainda, porque ela morava ali há muito pouco tempo para ter mudado qualquer coisa, mas já tinham combinado que ela teria total aval para modificar o que quisesse depois do casamento.
Casamento... precisava confessar que a palavra ainda a assustava um pouco. Nunca podia comentar tal coisa com qualquer uma de suas amigas ― muito menos com a mãe ―, porque todas afirmavam a mesma coisa: como ela poderia estar insegura com o fato de que estava prestes a se casar com um verdadeiro príncipe encantado? Rodolfo Baroli era bonito, rico, gentil e a amava. Ela sabia disso, não apenas porque ele sempre fazia questão de repetir, mas principalmente porque ele demonstrava. E havia um grande abismo entre palavras e ações. Palavras desaparecem de sua mente como um lampejo de tempestade, são efêmeras; enquanto atitudes permanecem muito mais tempo em suas lembranças. São elas que restam, no final das contas.
Pensar em tudo isso era melancólico e até um pouco mórbido; e Gisele sempre fugia de pensamentos como aquele.
Por isso, tirou a roupa e começou a encher a banheira para tomar um banho exatamente como merecia. Tinha o dia inteiro para aquilo, afinal era sábado e estava sozinha, uma vez que Rodolfo estava trabalhando. E Gisele apreciava imensamente a solidão.
Apreciava os momentos que passava consigo mesma, quando podia conversar com sua consciência e descobrir um pouco mais de si mesma. Naquele momento, por exemplo, enquanto seu corpo relaxava depois da conversa estressante com sua mãe, ela sentia-se realizada, forte, como se nada pudesse abalar suas estruturas. Mas e quando fechava os olhos e tentava, por meio de reflexões mais íntimas, enxergar o que realmente havia em sua alma? Será que se reconhecia como a mulher que tinha se tornado?
Talvez ela não soubesse exatamente a resposta, pois sempre evitava aquele tipo de pensamento. Era muito mais fácil aceitar a realidade. Mas, apesar disso, sempre insistia em questionar-se o que teria acontecido com sua vida se seu pai ainda estivesse vivo. Tinha plena certeza que seria uma pessoa diferente, teria feito escolhas diferentes. Perguntava-se principalmente se ele teria orgulho da mulher que ela tinha se tornado ou se por muitas vezes sentia vontade de retornar, de onde quer que estivesse, para lhe puxar as orelhas e colocá-la de volta no caminho certo.
Salva pelo gongo, Gisele ouviu seu celular tocando. Já sabendo que deveria ser Rodolfo, uma vez que quase ninguém lhe telefonava, apenas esticou a mão, pegou uma toalha para secá-la e depois buscou o aparelho.
Exatamente como imaginara, era o noivo. Não que houvesse muitas outras opções. Gisele não era o que se podia chamar de uma pessoa muito popular.
― Olá, querida! ― com a voz animada, como sempre, Rodolfo a cumprimentou antes mesmo que ela dissesse qualquer coisa. ― Como foi com sua mãe?
― Precisa perguntar?
Rodolfo deu uma risadinha. Não tencionava soar sarcástico, apenas demonstrar que compreendia exatamente o porquê de ela ter respondido sua pergunta com outra indagação.
E por mais que o assunto fosse desagradável, ela não podia deixar de pensar no quanto a risada dele era sexy.
― Então vou mudar a pergunta: está ocupada?
― Estou tomando um banho... de banheira! Bem preguiçosa, molhada e nua...
Mais uma risadinha.
― Você não deveria me provocar desse jeito... Estou no intervalo de uma reunião, e vou ficar pensando nessa imagem até te encontrar novamente ― a voz de Rodolfo, já rouca e sensual naturalmente, assumiu um tom ainda mais sussurrante, que era capaz de enlouquecê-la. Daquela vez, portanto, foi ela quem riu.
― Por que perguntou se eu estou ocupada? Precisa de alguma coisa?
― Você já foi ao escritório?
― Não.
― Então quero que saia da banheira e vá lá, por favor...
Gisele não estava entendendo onde ele queria chegar, mas sabia que Rodolfo sempre era bom em surpreendê-la, então, decidiu entrar na brincadeira. Pedindo um minuto, portanto, ela colocou o celular no chão e saiu da banheira com todo cuidado, enrolando-se em uma toalha.
Já de pé e começando a caminhar, ela pegou de volta o telefone e foi na direção do escritório da bela cobertura.
Assim que chegou lá, enquanto Rodolfo esperava pacientemente e em silêncio, ela abriu a porta e logo viu uma sacola da Gucci sobre a mesa.
― Você é louco?
― Encontrou?
― Sim! ― exclamou ela, como uma criança quando ganha uma bicicleta no Natal. Imediatamente colocou o celular no viva-voz, sobre a mesa, e começou a abrir o embrulho.
Depois que terminou de abrir a surpresa, um lindo vestido preto, minimalista, de um ombro só, de cintura marcada e saia rodada, foi revelado. Os olhos de Gisele brilharam. Era um presente maravilhoso; mais um, uma vez que Rodolfo sempre a surpreendia com coisas lindas e caras.
― Rodolfo! É maravilhoso!
― Que bom que gostou... ― ele falou com falsa modéstia, uma vez que conhecia exatamente o gosto da noiva. ― Mas isso não é tudo. Abra a primeira gaveta da minha mesa.
Mais uma vez ela obedeceu. Daquela vez, portanto, ela encontrou uma caixinha de veludo que deixou pouco espaço para sua imaginação. Quando ela a abriu, deparou-se com um incrível par de brincos de diamantes, em fomato de gota, que combinavam perfeitamente com a pedrinha "mágica", presente de seu pai, que ela sempre usava consigo. Rodolfo, além de muito generoso com presentes, era sempre sensível. Exatamente por ele saber o quanto aquela pedrinha era especial para ela, Gisele sentiu o coração aquecer por ele.
― São lindos. Obrigada ― sensibilizada pelo gesto, ela mal sabia o que dizer. Havia um bolo em sua garganta e a promessa de lágrimas no canto de seus olhos.
― Quero que use, tanto o vestido quanto os brincos, hoje à noite.
― Vamos sair?
― Sim. Mário e Ângela nos convidaram para um jantar. Você bem que poderia usar o anel de noivado da família?
Quando a pediu em casamento oficialmente, Rodolfo a presenteou com um anel valiosíssimo de diamante azul, estimado em mais de quinze milhões de reais. Fora um presente do tataravô Baroni para sua esposa e foi passando de geração em geração. Foi a única riqueza que a família possuiu por muito tempo, uma vez que os avós de Rodolfo foram muito pobres — pelo que ele contou —, mas mesmo assim ninguém o vendeu. Conseguiram criar sua fazenda por méritos próprios. Sendo assim, Gisele o tinha guardado dentro de seu cofre pessoal, no apartamento, para que não o perdesse ou fosse assaltada. Usara apenas na festa de noivado e chamou demais a atenção de todos. Depois disso, decidiu que usaria apenas no casamento, optando por, no dia a dia, usar a aliança de ouro comum.
— Mário e Ângela? — ela tentou disfarçar uma careta.
Aquela não era uma notícia animadora para Gisele. Primeiro porque não estava muito animada com a ideia de sair e ficar acordada até tarde. Tinha planos de passar a noite apenas com Rodolfo, conversando sobre os preparativos para o casamento, tomando uma boa taça de vinho e fazendo amor preguiçosamente. Porém, não era apenas isso... O maior problema era que o casal mencionado não era o seu favorito. Ângela era uma mulher muito fútil e burra. Não que Gisele não tivesse seus momentos de futilidade, mas ao menos sabia conversar de assuntos que não fossem roupas, acessórios e maquiagens. Já Mário, era um fanfarrão pedante que gostava de diminuir pessoas e fazer piadinhas sem graça.
Apesar disso, e apesar de não terem nada a ver com eles, Rodolfo os adorava e sempre que podia marcava aqueles encontros que eram torturantes para ela. Por isso, precisava ser complacente e aceitar.
― Tudo bem, amor. Que horas devo estar pronta?
― Vou m****r um carro buscá-la às nove. Pode ser?
― Claro.
― Ótimo! Estou ansioso para vê-la nesse vestido. Até mais.
E desligou.
Imediatamente, Gisele pegou seus presentes e levou-os para a suite presidencial, onde iria experimentar tudo que tinha ganhado. Se precisasse trocar o vestido, ainda teria tempo.
Contudo, conforme ela já esperava, a roupa caiu perfeitamente em seu corpo, melhor até do que se ela tivesse comprado.
Rodolfo nunca fazia nada errado... nunca cometia um deslize, nem mesmo errar o manequim da futura esposa.
Ainda usando o belo vestido, Gisele deitou-se na cama de barriga para cima, fitando o teto do quarto. Sentia-se estranha, nostálgica e melancólica, e esperava que fosse por causa da aproximação do casamento, que aconteceria em mais ou menos três meses. Não tinha nenhuma amiga próxima com quem pudesse conversar, mas acreditava ― ou queria acreditar ― que a insegurança que sentia era normal para uma noiva.
Sabia que amava Rodolfo, que era o homem dos sonhos dela e de qualquer outra mulher. Sabia que ele seria um marido exemplar, carinhoso, generoso e leal.
Quer dizer... será que sabia mesmo?
Conhecia-o há muito pouco tempo para poder afirmar com convicção todas aquelas coisas. E havia outras que ela nem saberia especular pela breve convivência. Não saberia dizer se Rodolfo a apoiaria em um momento difícil, se ele se orgulharia dela em uma vitória, se ainda a chamaria de linda quando a visse doente, passando mal com uma virose ou uma gripe... Não poderia afirmar se ele a amaria incondicionalmente, se a escolheria mesmo quando descobrisse todos os seus defeitos. Como amante, ele era incrível, mas seria também um bom amigo ao longo da convivência?
Se estivesse ao lado de sua mãe, desabafando daquela forma ― coisa que ela nunca faria, em hipótese alguma ―, ela lhe diria que estava sendo idiota e infantil, que um homem perfeito como Rodolfo Baroni não batia na porta de uma mulher todos os dias e que deveria ser crime pensar em tais coisas depois de ter recebido dois presentes tão incríveis.
Bem, e era nisso que Gisele tinha que focar. Havia sentimento, havia paixão e haveria vestidos e brincos como aquele. Tinha que levantar as mãos para o céu e deixar de ser tola. Tinha tudo nas mãos, só restava fechar os dedos e agarrar a sorte, antes que ela lhe escapasse...
Rodrigo podia jurar que iria furar o chão de tanto que andava de um lado para o outro na sala de espera do hospital. Queria notícias, mas apenas Célia e o marido puderam subir para o andar da Unidade de Terapia Intensiva. Ele tivera que ficar no andar da recepção, em companhia de Rodolfo, o que era um pouco constrangedor. Este, na verdade, estava um pouco mais calmo, embora também parecesse preocupado, mantendo a mão na cabeça, com uma expressão sofrida no rosto. Um médico surgiu, e Rodrigo praticamente pulou em cima dele, mas não se tratava do mesmo que estava operando Gisele. Ainda não havia nenhuma novidade. — Rodrigo, por favor, se controle. Isso não vai ajudar Gisele em nada.&
Um gosto amargo na boca, uma dor lancinante na nuca e uma estranha sensação de não conseguir se mexer. Gisele sentia as pálpebras pesadas, o corpo dolorido deitado sobre algo concreto e duro que — definitivamente — não era a sua cama. Estava confusa também. Não fazia ideia do que tinha acontecido ou onde estava, só sabia que temia abrir os olhos. As memórias começaram a retornar à sua mente de forma perigosa. Não pareciam dispostas a lhe dar trégua ou suavizar as notícias. Antes mesmo de precisar olhar ao seu redor, já sabia que tinha sido sequestrada. Estava com tornozelos atados e com os punhos presos às costas. O gosto amargo na língua provinha de um pano que a amordaçava e que não parecia dos mais limpos.&nbs
Ainda um pouco desorientado, Rodrigo começou a abrir os olhos. A dor lancinante em sua nuca manifestou-se como uma punhalada, deixando-o zonzo por mais alguns segundos. Tanto que precisou se deitar novamente no chão, incapaz de se levantar. Não conseguiu se lembrar de muita coisa nos primeiros minutos depois de recuperar a consciência, mas aos poucos sua memória começou a retornar. Flashes de pessoas mascaradas partindo para cima dele invadiam sua mente, e ele logo compreendeu o que tinha acontecido. Então, um único pensamento sobrepujou todos os outros: Gisele. Ainda não se sentia completamente estável para se levantar, mas o fez, mesmo cambaleante, e subiu as escadas de dois em dois degraus. Abr
Rodrigo dirigia em silêncio, com os dedos firmemente presos ao volante. Segurava-o com tanta força que os nós de seus dedos chegavam a ficar brancos. Gisele, ao seu lado, também estava calada, preocupada. Era como se aquela estrada à frente fosse um corredor da morte, a julgar pela morbidez de suas expressões. A cada quilômetro que avançavam, Rodrigo dava uma olhada nela, quase com a esperança de que mudasse de ideia e pedisse, assustada, que ele desse meia volta e retornasse para Valença, para a fazenda onde ele sabia que poderia mantê-la segura. A partir do momento que cruzassem a entrada para o Rio de Janeiro, não poderia prometer mais nada. O tempo, inclusive, combinava com seus humores. O dia estava cinzento, cheio de nuve
Protegida nos braços do homem por quem — agora sabia — estava perdidamente apaixonada, Gisele refletia. Tentava buscar em sua mente algum resquício de arrependimento pelo que tinha acabado de acontecer, mas estava tão em êxtase, que mal conseguia esconder. E não queria. Fazia tempo demais que não sorria daquela forma tão plena, que se sentia uma boba, uma adolescente. Tanto que começou a gargalhar sem nenhum motivo. Rodrigo, que estivera com os olhos fechados até então, abriu-os e estreitou os braços ao redor dela, também sorrindo e sendo contagiada. — Do que está rindo? — ele indagou curioso.&nbs
Gisele sentia como se estivesse flutuando em um mar turvo. Afogava-se, mas nem sequer tentava lutar para se salvar, apenas aceitava seu destino. A consciência ia e vinha, em um ritmo vertiginoso, mas ela permanecia inerte, presa à escuridão. Ouvia vozes ao redor a chamá-la. Sabia que tentavam reanimá-la, que deveria estar deixando todos muito preocupados, mas só queria ser um pouco egoísta e permanecer fora de si por mais um tempo. Se acordasse e se deparasse novamente com a vida real, acabaria se lembrando das imagens que vira pouco antes de perder os sentidos. E não queria lembrar. Não queria pensar que estava rolando na grama e beijando outro homem enquanto Rodolfo era torturado e passava por maus lençóis. Já tinha decidido que não o amava tanto quanto pensara, mas o correto seria conversar e tentar encontrar a melhor
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