Naquela noite em Sant'Elisa, sufocante e carregada de eletricidade no ar, Gabriel e Valentina estavam frente a frente, o vento balançando as árvores ao redor do convento, como se até a natureza testemunhasse o que estava prestes a acontecer. Os olhos dele estavam fixos nos dela, cheios de frustração, desejo e algo que Valentina se recusava a nomear. — Você tem noção do que está fazendo comigo, Valentina? — A voz de Gabriel saiu rouca, carregada de sentimentos que ela fingia não perceber. O coração dela martelava tão forte que parecia querer escapar do peito. Tentou desviar o olhar, mas ele não permitiu. — Não sei do que está falando… — murmurou, mas sua voz falhou, e ela odiou como soou hesitante. Gabriel deu um passo à frente, diminuindo a distância entre os dois. O cheiro amadeirado dele a envolveu, e Valentina se odiou por reagir, por querer se perder na presença dele quando deveria se afastar. — Não sabe? — Ele ergueu uma sobrancelha, descrente. Com um toque delicado, segurou o queixo dela entre os dedos, forçando-a a encará-lo. — Você sente isso tanto quanto eu. Ela engoliu em seco. Claro que sentia. Era um fogo que a consumia lentamente, um desejo crescendo como algo inevitável, como um pecado já escrito muito antes de ela tentar evitá-lo. — Eu… — tentou falar, mas as palavras morreram quando Gabriel se inclinou um pouco mais. A respiração dele se misturou à dela, quente, intensa. Valentina fechou os olhos por um segundo, tentando encontrar forças para recuar. Mas então sentiu o toque hesitante dos lábios dele sobre os seus, como se desse a ela a chance de fugir. Ela não fugiu.
Ler maisValentina acordou sentindo o calor do corpo de Gabriel contra o seu. Ele dormia profundamente, o rosto relaxado, uma expressão que poucas vezes ela via quando ele estava acordado.Ela passou os dedos suavemente pelos traços dele, memorizando cada detalhe. Mas, no fundo, sabia que esse momento era apenas uma ilusão passageira.Levantou-se com cuidado, vestindo a roupa rapidamente. Precisava sair antes que o mundo real a encontrasse.Mas não teve tempo.— Fugindo de novo? — A voz de Gabriel era rouca, ainda sonolenta.Valentina fechou os olhos por um segundo antes de se virar para encará-lo.— Preciso ir.Ele se sentou, apoiando os braços sobre os joelhos, os olhos escuros fixos nela.— Você sempre precisa. Mas continua voltando.Ela sentiu um nó na garganta. Ele estava certo.— Eu não posso...— Você não pode ou não quer?O silêncio foi sua única resposta.•••
Valentina passou a noite em claro. Após deixar Gabriel, retornou ao convento como uma sombra na escuridão. Cada passo pesava, como se estivesse carregando o próprio pecado nos ombros. Ela tentou rezar. Tentou buscar consolo nas palavras sagradas, nas promessas feitas a Deus. Mas, sempre que fechava os olhos, era Gabriel que via. O toque dele ainda queimava em sua pele. O gosto dele ainda estava em seus lábios. E agora? Ela não era mais pura. Valentina puxou o lençol sobre o corpo, tentando esconder a vergonha que a consumia. As lágrimas escorreram silenciosas, mas não era apenas culpa que sentia. Era desejo. Era saudade. Era uma fome insaciável que a aterrorizava. — Perdão, meu Deus… Mas nem a própria oração soava verdadeira. ••• Na manhã seguinte, a madre superiora a chamou novamente.<
A noite caía sobre Sant’Elisa, e Valentina sentia seu mundo se despedaçando. O convento já não lhe parecia um refúgio, e Gabriel… Gabriel despertava nela algo que ia além do desejo — um abismo perigoso e viciante.Mas ela não era a única a sentir o cheiro de sua hesitação.Leonardo sabia.E ele estava pronto para agir.•••Valentina caminhava pelas ruas silenciosas, os pensamentos um turbilhão. Quando ouviu passos atrás de si, instintivamente acelerou, mas era tarde demais.— Irmã Valentina.A voz a fez estremecer.Leonardo estava ali, encostado contra um poste, com um sorriso que nunca chegava aos olhos.— O que você quer? — perguntou, mantendo-se firme.— Apenas conversar.Ele se aproximou, e Valentina sentiu um arrepio de alerta percorrer seu corpo.— Você parece… diferente. Um pouco menos santa do que antes.O tom zombeteiro fez seu sangue ferver.— Vá di
A consciência de Valentina pesava como uma cruz invisível em seus ombros. Ela acordou com os primeiros raios de sol atravessando as cortinas do quarto de Gabriel. Seu corpo estava quente sob os lençóis, e a lembrança da noite passada ardia em sua mente. O gosto do pecado ainda estava em seus lábios. Ela abriu os olhos e viu Gabriel ao seu lado, ainda adormecido. O lençol cobria apenas parte de seu corpo, revelando a pele marcada por cicatrizes e histórias que ela ainda não conhecia. Ele parecia vulnerável, quase inocente. Mas Valentina sabia a verdade. Nada em Gabriel e era inocente. Ela prendeu a respiração, sentindo um nó apertar sua garganta. O que havia feito? Seu coração martelava no peito enquanto memórias invadiam sua mente — os beijos, os toques, o desejo proibido que queimava entre eles. Ela era uma freira. Ou, pelo menos, dev
A chuva caía como um véu sobre Sant’Elisa, ocultando segredos e silenciando pecados. Valentina sentia o gosto amargo da tempestade em seus lábios, ainda trêmulos do beijo que compartilhara com Gabriel. Ela recuou um passo, mas ele permaneceu ali, imóvel, os olhos negros cravados nos dela. — Você precisa decidir — repetiu ele, a voz grave, carregada de algo que Valentina não queria nomear. Medo. Desejo. Perdição. — Eu já decidi — ela sussurrou, mas suas palavras não carregavam a convicção que deveriam. Gabriel inclinou a cabeça, analisando-a. — Então por que está tremendo? Ela apertou os punhos ao lado do corpo, como se isso pudesse conter a avalanche dentro de si. — Porque você me confunde. Porque me faz questionar tudo que eu sempre acreditei. Ele sorriu de um jeito sombrio, quase predador. — Então pare de lutar contra isso.
A tempestade castigava Sant’Elisa, trovões ecoavam no céu enquanto a chuva batia contra as janelas do convento. Valentina não conseguia dormir. Desde que Gabriel surgira em seu quarto na noite anterior, ela sentia um nó apertado no peito.As ameaças eram reais.A presença dele era real.E o desejo que crescia entre os dois também.Ela tentou rezar, tentou encontrar alguma clareza, mas sua mente estava consumida por Gabriel. Pelos olhos dele, pelo perigo que o envolvia, pela forma como seu toque a incendiava.Então, ouviu uma batida na porta.Seu corpo gelou.Ela se aproximou devagar, hesitante, e perguntou baixinho:— Quem é?— Sou eu.A voz dele. Grave, baixa, carregada de algo que Valentina não soube definir.Ela abriu a porta.Gabriel estava encharcado da chuva, os cabelos grudados na testa, os olhos ainda mais sombrios sob a pouca luz.— O que está fazendo aqui?
A chuva castigava o telhado do convento naquela madrugada. Valentina revirava-se na cama, incapaz de encontrar paz. As palavras de Gabriel ecoavam em sua mente, a sombra de seu toque ainda queimando sua pele.Ela tentou rezar, tentou sufocar o desejo que a consumia, mas nada adiantava.Então, ouviu um ruído.Seu corpo congelou.A porta de seu quarto estava entreaberta. O vento não era forte o suficiente para tê-la empurrado daquela maneira.Levantou-se, os pés descalços no chão frio, e foi até a porta. Olhou pelo corredor vazio e, por um instante, sentiu que estava sendo observada.Seu coração acelerou.Respirando fundo, fechou a porta e voltou para a cama, mas o desconforto permaneceu.•••Na manhã seguinte, Valentina encontrou Gabriel do lado de fora do convento, perto das obras do orfanato. Ele parecia diferente — mais sério, mais sombrio.— O que houve? — ela perguntou, notando as olheiras
Valentina sentia o gosto do pecado nos lábios. Ainda conseguia sentir o calor de Gabriel, a forma como ele a segurara, como se o mundo inteiro dependesse daquele beijo. Mas agora, no silêncio de seu quarto no convento, tudo parecia errado.Ela se ajoelhou diante do crucifixo na parede, as mãos trêmulas.— O que eu fiz? — murmurou, fechando os olhos com força.O peso da culpa pressionava seu peito. Passara anos se dedicando à vida religiosa, lutando para ser uma mulher íntegra, e agora… Um único beijo tinha colocado tudo em dúvida.No entanto, mais do que a culpa, o que a assustava era outra coisa.Ela queria mais.•••Na manhã seguinte, Valentina evitou olhar para qualquer pessoa. A madre superiora notou seu silêncio, mas não questionou. Talvez pensasse que era cansaço, talvez sentisse que algo estava errado.Mas Gabriel não a deixaria fugir tão fácil.Quando Valentina saiu para inspecionar as reformas
O vento frio da noite cortava a pele de Valentina enquanto ela caminhava rapidamente pela rua de paralelepípedos. O convento estava a poucas quadras dali, mas sua mente parecia estar a quilômetros de distância. Seu coração ainda pulsava forte no peito, não pelo medo, mas pelo beijo que ainda queimava em seus lábios.Ela entrou pelos portões laterais do convento, evitando qualquer contato com as irmãs que poderiam estar acordadas. Ao chegar ao seu quarto, fechou a porta e se apoiou contra ela, tentando recuperar o fôlego.O que eu fiz?A pergunta se repetia em sua cabeça como um eco interminável. Ela levou os dedos até os lábios, sentindo ainda a presença de Gabriel. A intensidade, o calor, o desejo… tudo que deveria ser reprimido, mas que explodiu de maneira incontrolável.Valentina caminhou até a pequena escrivaninha e abriu sua Bíblia, tentando encontrar nas palavras sagradas alguma resposta para o que sentia. Mas, em vez de conforto, encontrou mais dúvidas.Ela havia escolhido esse